Ninguém está preocupado com este flagelo, mas há cada vez mais gente que se gaba de ser humilde. Ora, gabar-se de ser humilde é o equivalente a anunciar aos gritos que se é mudo.
A humildade aconselharia alguma modéstia na hora de publicitar qualidades como a humildade. Uma pessoa verdadeiramente humilde talvez devesse, de vez em quando, comportar-se de forma ligeiramente arrogante, para humildemente camuflar o fato de ser humilde. Se alguém tem orgulho na sua humildade, em princípio ficou um pouco menos humilde. Trata-se de uma virtude traiçoeira e difícil de manter. É por isso que eu só cultivo defeitos. É mais seguro.
O lugar mais vezes escolhido para a divulgação de qualidades é o Instagram. E não há momento mais propício para a exibição das nossas virtudes do que a morte de outra pessoa. Sempre que alguém morre, há usuários do Instagram que não resistem a publicar uma humilde homenagem ao defunto que é, no fim, uma fanfarrona homenagem a si mesmos.
Normalmente, a morte de determinada figura pública causa ao usuário um sofrimento tal que não sabemos se a desgraça maior tocou ao falecido ou ao que teve o azar de ficar vivo a testemunhar o desaparecimento do outro.
São mensagens que, na verdade, dizem o seguinte: "Esta figura muito querida de todos, realmente, morreu. Mas creio que é apenas justo que alguma da comiseração que lhe dedicamos agora me seja dirigida."
Às vezes, quem vai sofrer para o Instagram conhecia o finado, e já vi lamentos deste tipo: "Recordarei para sempre a última conversa que tivemos, em que ele me disse o quanto me admirava." Ou: "Jamais olvidarei o profundo respeito com que ele se dirigia a mim." Ou ainda: "Perdi um fã."
De vez em quando, no momento da morte de uma pessoa conhecida, alguém resolve fazer uma piada e gera-se uma vasta revolta. Mas não creio que haja nada mais obsceno do que estas homenagens em que os humildes usam um cadáver como adereço para embelezar a sua reputação.
Fala-se muito em piadas de mau gosto e nada em humildades de mau gosto. Acho as segundas mais nocivas.
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