Ricardo Araújo Pereira

Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

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Ricardo Araújo Pereira
Descrição de chapéu América Latina Argentina

Milei quer que toda a propriedade seja privada

Mesmo assim ele prefere viver despojado dos bens mais banais, como um pente

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Tem sido dito que o presidente eleito da Argentina preza a liberdade, o que talvez não seja exato. Na verdade, Javier Milei nunca diz "viva la libertad", mas "viva la libertad, carajo".


Ora, uma coisa é a liberdade. Outra é a "liberdade, 'carajo'". São conceitos bem diferentes.

O "carajo" costuma transformar as coisas, torná-las mais brutas. Para perceber isso, basta fazer a experiência de dizer à nossa querida mãe "não vou querer sobremesa" ou "não vou querer sobremesa, 'carajo'" e ver o que acontece a seguir à mesa.

Em uma entrevista concedida no ano passado, Milei afirmou que um governo seu legalizaria a venda de órgãos humanos. Ele parece já ter vendido um dos seus. Aquele que habitualmente fica no crânio.
É que Milei alega conversar com o seu cão morto, através de um médium, pelo que talvez haja boas razões para desconfiar que tenha transacionado o órgão em questão.

Mas, lá está, legalizar a venda de órgãos é uma ocorrência de "liberdade, 'carajo'". Parece uma lei igual para todos, mas não é. Quem tem dinheiro nunca irá vender os seus órgãos. Poderá adquirir alguns, caso necessite, e agora saberá a quem comprá-los, mas não vai querer vendê-los.

No desenho de Luiza Pannunzio cujo o fundo é uma bandeira da Argentina, há um homem branco de bochechas rosadas e cabelos volumosos com costeletas, levantando uma motosserra nas mãos para o alto. O homem veste uma jaqueta e o vemos da cintura para cima. Ele está contente.  Na lâmina da motosserra está escrito MILEI.
Ilustração de Luiza Pannunzio para coluna de Ricardo Araujo Pereira de 25 de novembro de 2023 - Luiza Pannunzio/Folhapress

Ao que parece, além de manter conversas com o seu cachorro morto, Milei também fala diretamente com Deus. Foi, aliás, o próprio criador que o incumbiu da importante missão de comandar a Argentina em direção à prosperidade.

Sendo Milei uma pessoa tão educada e ponderada, não é difícil supor que Nosso Senhor tenha tirado algum do tempo que dedica à administração do universo para pedir ao novo presidente que tomasse conta da Argentina. O programa de governo é o que Deus, ao que tudo indica, defende: a extinção dos ministérios de Saúde, Educação, Cultura, Ciência, Obras Públicas e Transportes e a privatização de todas as empresas estatais.

Haverá os hospitais e as escolas que o setor privado bem quiser, nos locais em que derem lucro, e a preços sem controle do Estado. Se forem necessárias estradas ou pontes ao país, caberá à iniciativa privada construí-las e mantê-las, desde que sirvam os interesses de alguns, e não de todos.

Milei quer que toda —mesmo toda— a propriedade seja privada. Embora ele prefira viver despojado dos bens mais banais possíveis.

Por exemplo, um simples pente. É óbvio que Javier Milei não tem um à disposição.

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