Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Rodrigo Zeidan

Você voltaria?

O vírus vai gerar crise na China, muitos vão sofrer; nada diferente do que acontece no Brasil

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Minha vida foi sempre peripatética. Por escolha. Agora, estou em autoexílio por causa do coronavírus, até minha família se sentir segura para voltar para a China (o plano, hoje, é voltar no dia 24). 

O impacto econômico da epidemia se dá nos grandes dados, como o PIB, mas também no dia a dia de quem mora no país.

Meus amigos chineses no país estão vivendo um misto de incerteza e ansiedade, mesmo aqueles com contratos de trabalho permanentes. O que poucos entendem sobre a China capitalista é que, nos últimos 30 anos, todos os empregos novos foram gerados por empresas privadas —em 1990, somente 25 milhões de chineses trabalhavam em empresas privadas; em 2000, já eram 114 milhões; hoje, são mais de 280 milhões. 

Enquanto isso, o número de funcionários de estatais caiu de 103 milhões, em 1990, para 57 milhões, hoje. A China é movida pelo dinamismo de empresas privadas num ambiente ultracompetitivo.

Um exemplo é o de um amigo, dono de um restaurante e um bar em Xangai. Ele sempre se orgulhou de ter estabelecimentos de primeira —num exemplo prosaico, abriu o primeiro restaurante com comida apimentada regional de Sichuan a não reutilizar óleo. Os próprios chefs achavam um absurdo, já que lá essa prática é comum e eles diziam que isso contribuía para o sabor único da sua culinária. No momento, os estabelecimentos estão fechados. 

“Você está preocupado?”, perguntei. “Não, já que somos bem gerenciados. Mas, se durar mais de quatro meses, teremos problemas. Ao mesmo tempo, vou poder alugar um ponto mais barato para meu próximo projeto, se a crise não durar tanto.” 

No outro extremo está outro amigo, que tem uma agência de marketing pequena. Ele já está planejando reduzir a equipe, já enxuta, para poder sobreviver. 

Professores de língua tiveram a maioria das suas aulas canceladas. Um amigo já decidiu sair da China, de vez —não tinha como sobreviver sem nenhuma renda e sem saber quando as aulas, mesmo que virtuais, voltariam.

O vírus vai gerar crise econômica, só não sabemos se temporária. Muita gente vai sofrer muito. Não diferente do que acontece hoje no Brasil, com o desemprego de dois dígitos e imensa desigualdade. Crise não é só grandes números.

Tem gente que acha que os números dos infectados com o coronavírus estão sendo manipulados por autoridades chinesas. Não estão. Se houvesse manipulação, os casos no exterior estariam aumentando mais rapidamente que os divulgados na China. Mas não é o caso. 

Além disso, há dias em que o número de casos aumenta mais de 15%. Se há manipulador de dados, ele deveria ser demitido por incompetência.

Também tem gente que acha que o coronavírus é tempestade em copo d’água. “A gripe comum mata mais gente; a taxa de letalidade desse vírus é só de 2%; não tem por que se assustar.” Infelizmente, não é bem assim.

Sabemos o que esperar no caso de uma gripe —qual a frequência de novos casos, como se transmite, qual a mortalidade esperada. No caso do coronavírus, o grau de incerteza é muito mais alto. Pode começar a se espalhar mais rápido. Ou a epidemia pode terminar repentinamente. Um novo vírus não nos permite fazer previsões com o que já sabemos de epidemias passadas. 

Ainda assim, depois de conversar com vários especialistas, a chance de epidemia no Brasil é extremamente baixa. Estamos no verão, época de difícil propagação de vírus, assim como a Austrália, onde os poucos casos estão mais que controlados.

LINK PRESENTE: Gostou desta coluna? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.