“Canção do Amor Demais”, o LP com canções de Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes interpretadas por Elizeth Cardoso, está fazendo 60 anos. Foi gravado em fins de fevereiro de 1958 e lançado por esses dias de abril daquele ano. É inacreditável —ao escutá-lo, ninguém que desconheça essa informação lhe atribuirá idade tão avançada. Era o que podia haver de moderno em 1958. Hoje, é apenas eterno.

A modernidade estava nas harmonias de Jobim, nas letras de Vinicius e na participação, em algumas faixas —a principal era “Chega de Saudade”—, do jovem violonista João Gilberto, 26, acompanhando Elizeth e dando ao ritmo do samba uma “bossa” desesperadoramente nova. Uma batida de violão que, não por acaso, logo seria classificada como uma “bossa nova” e crismaria um novo ritmo —a bossa nova. A eternidade era garantida, claro, pela interpretação de Elizeth Cardoso.

O curioso é que, durante boa parte da produção, antes que seus autores partissem para o estúdio, a cantora não seria Elizeth, mas Dolores Duran, preferida por Jobim e pelo produtor Irineu Garcia, dono do dinheiro. Você perguntará: por que uma compositora como Dolores e não uma cantora como Elizeth?

Hoje, quando pensamos em Dolores, vêm-nos à mente “A Noite do Meu Bem”, “Fim de Caso”, “Solidão”, “Ideias Erradas”, “Ternura Antiga” e outros fabulosos sambas-canção que ela compôs. Mas, em fevereiro de 1958, Dolores —que morreria em outubro de 1959— ainda não tinha feito nada daquilo. Nem era muito conhecida como compositora. Como cantora, sim, e de todos os gêneros.

Mas a mosca da composição a havia picado. Já não estava tão interessada em emprestar sua voz a letras alheias. Pediu alto a Irineu, que não podia pagar. Eles então chamaram Elizeth, que, desde o começo, era a preferida de Vinicius.