Ruy Castro

Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

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Ruy Castro

Retrato sem retoque

Não só o velho Machado teve sua cor corrigida. Seu paletó, também

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Rio de Janeiro

Você já viu. Um russo inventou um aplicativo com um filtro chamado FaceApp, capaz de transformar um rosto, simulando como ele ficará depois de velho. O dispositivo faz também a pessoa rejuvenescer, sorrir, parecer irritada, com ou sem cabelo e barba e até se transformar no sexo oposto. Muito convincente. E, pelo visto, também muito fácil de manipular.

Por causa dessa facilidade, pode-se pensar que sempre se manipularam fotos. Mas os veteranos da fotografia sabem que não era assim. Nos anos 80, trabalhando na Playboy, eu ia xeretar o trabalho do editor de arte Carlos Grassetti, de retocar as estrias, celulites e cicatrizes das gloriosas garotas do pôster. Grassetti fazia isso a pincel, no fotolito, e era um mestre, mas a ilusão parava aí. Não havia como lhes dar formas que elas já não tivessem. 

Na recente comemoração dos 50 anos da chegada à Lua, os exóticos voltaram a acusar a Nasa de ter manipulado as fotos dos astronautas em solo lunar. Mas, desta vez, os profissionais reagiram —com as imagens capturadas ainda no velho negativo, a manipulação seria facilmente perceptível, de tão rudimentar. E as fotos, pelas circunstâncias, eram excepcionais.

Se, digamos, em 1980 e 1969, era assim, o que dizer dos idos de 1890, quando parece ter sido feita a famosa foto de Machado de Assis que, segundo alguns, foi manipulada para torná-lo branco? É uma tese, mas eu gostaria de saber como teriam feito isto. O filme fotográfico acabara de ser inventado e era de baixíssima sensibilidade. Como ainda não existia o flash, a exposição à luz tinha de ser demorada —daí não só as pessoas, mas as fotos inteiras daquele tempo saírem, como se diz, lavadas. 

Talvez por isso, no retoque que uma agência de propaganda fez na foto para tornar Machado efetivamente negro, eles tenham aproveitado para escurecer o seu paletó —que, pelo visto, também fora manipulado para parecer mais claro.

Foto da campanha Machado de Assis Real, com imagem colorizada que representa o autor como negro, e a original do lado esquerdo
Foto da campanha Machado de Assis Real, com imagem colorizada que representa o autor como negro, e a original do lado esquerdo - Fotomontagem


 

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