Sandro Macedo

Formado em jornalismo, começou a escrever na Folha em 2001. Passou por diversas editorias no jornal e atualmente assina o blog Copo Cheio, sobre o cenário cervejeiro, e uma coluna em Esporte

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Sandro Macedo
Descrição de chapéu Olimpíadas 2024

Síndrome olímpica de Mutley

Tudo o que queremos é 'medalha, medalha, medalha'; e de ouro

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Desde 1984, em Los Angeles, o Brasil leva mais de 150 atletas a cada edição das Olimpíadas. Desde Atlanta-1996, mais de 200.

Em Paris, são 276. O problema não são as 15, 20, 25 medalhas. A questão é que, em 18 dias, para ver 20 medalhas, temos que conviver constantemente com a derrota. E não gostamos de derrota, mal gostamos de esporte. Gostamos de medalha.

Temos a síndrome de Mutley, o cachorro ajudante de Dick Vigarista. Tudo o que queremos é "medalha, medalha, medalha"; e de ouro.

Delegação do Brasil desfila na cerimônia de abertura das Olimpíadas
Delegação do Brasil desfila na cerimônia de abertura das Olimpíadas - Clive Brunskill - 26.jul.2024/Reuters

É sempre assim, é só um Arthur Zanetti levar ouro na argola e, de repente, todo mundo se acha perito em cristo invertido. Twist carpado, então, chegou a ser uma febre em padarias e elevadores.

Nos anos 1980 era diferente, este escriba lembra como era difícil ganhar uma única medalhinha de ouro, quem ganhava era celebrado como campeão de Copa do Mundo, aquela de futebol.

Por isso, em Sydney-2000, ficou um gostinho azedo após os Jogos. A delegação ganhava uma prata, depois outra, depois um bronze, e outra prata, e outro bronze, todos celebrados. Mas o ouro não chegava.

Começou uma comoção. Todo dia se buscava na Vila Olímpica o coitado que teria a obrigação do ouro.

E todas as derrotas, esperadas e inesperadas, caíram em cima do alazão Baloubet du Rouet, que não aguentou o peso e refugou no prova de saltos, montado por Rodrigo Pessoa. Se Baloubet du Rouet tivesse perfil no Twitter, seria cancelado.

Em Olimpíadas mais recentes, a corrida ao ouro mudou. O acesso a recursos em esportes aumentou, mas nem sempre é bem usado.

Daí que, hoje em dia, um ouro não fecha mais a conta. Todos querem mais. É quase uma bola de neve.

Dirigentes prometem mais recursos, que devem levar a mais conquistas; atletas sem desempenho em mundiais dizem que vão brigar pelo pódio; e, na TV, quase colocam a medalha no pescoço do moço antes do início da prova.

"Vamos torcer juntos pela medalha. Quem sabe vem até um ouro?", disse, mais ou menos, um narrador antes da final da canoagem C2 500 m, na qual o Brasil terminou em oitavo lugar, entre oito competidores —mas não pode chamar de último.

E se ele tivesse dito antes da prova que chegar à final já era uma conquista? Que era muito difícil chegar ao pódio, que seis concorrentes tinham tempos melhores? É o ufanismo olímpico que nos mata. Pelo menos, na Copa, perdemos uma vez só.

Este escriba, que tem o hábito de ver o copo meio cheio no momento olímpico, acreditava antes dos Jogos no recorde de medalhas, no recorde de ouros e no recorde de modalidades com pódio. Ingênuo.

Precisamos reduzir a nossa expectativa e eleger alguns rivais similares olimpicamente. A Argentina pode ser boa para puxar uma briga no futebol, mas, nas Olimpíadas, não dá nem para o começo.

Este escriba sugere a Nova Zelândia, país de clima quente, muito mar, uma área mais ou menos do tamanho de Tocantins e boa diversidade nas modalidades olímpicas.

Em Tóquio, com 213 atletas, a Nova Zelândia levou 7 medalhas de ouro, 6 de prata e 7 de bronze —ganhamos por um bronze. Uhu. Antes, no Rio, foram 19 medalhas, com 7 ouros, para o Brasil. Eles ficaram com 18 no total, 4 ouros. Uhu.

Em Paris, os danados já conquistaram 13, com 5 ouros. Temos 15 (até a conclusão desta coluna), mas só 2 ouros. Dificilmente vamos ultrapassá-los. Ponto para os neozelandeses.

Mas vamos nos encontrar de novo em Los Angeles, em 2028. O negócio é focar nesse duelo. Já imagino Galvão, em algum streaming, dizendo que ganhar é bom, mas ganhar da Nova Zelândia é muito melhor.

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