Suzana Herculano-Houzel

Bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA).

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Suzana Herculano-Houzel

Corvos pensam. E agora?

Caçamos vida inteligente em outros planetas, mas não somos únicos na Terra

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Agora é oficial: existe vida consciente no cérebro dos corvos. E daí?

Tamanha declaração bombástica exige detalhamento. Se nós humanos apenas podemos supor que outras pessoas também pensam —que prova direta temos disso, sem poder vivenciar o que se passa na cabeça alheia, sobretudo dado o festival de ações irresponsáveis?—, determinar se há pensamento e consciência em outras espécies parece requerer magia ou muita vontade de (não) acreditar.

Ainda bem que contra isso existe a ciência e, neste caso, eletrodos. São agulhas finíssimas que atuam como microfones ultrassensíveis —só não a vibrações do ar, mas as variações minúsculas de eletricidade que neurônios sofrem constantemente.

Desde as inovações tecnológicas da Segunda Guerra Mundial, cientistas aprenderam como usar eletrodos não apenas para aplicar corrente elétrica mas também para registrar a atividade de neurônios no cérebro alheio. Assim sabemos que há neurônios que “veem”, outros que ouvem, muitos que fazem o corpo se mover. E há também neurônios que “pensam”.

Homem olha para seus dois corvos
Homem e seus dois corvos, na França - Sebastien Salom Gomis/AFP

O atalho verbal é um problema, pois nenhum neurônio sozinho faz coisa alguma, muito menos pensar: nosso comportamento é o resultado a cada instante do padrão de atividade de todos os neurônios do cérebro interferindo mutuamente uns nos outros e no corpo. Ainda assim, o fato é que muitos neurônios estão próximos o suficiente dos sentidos, de modo que sua atividade reflete o que acontece do lado de fora do cérebro.

O neurocientista alemão Andreas Nieder, da Universidade de Tübingen, há tempos vem implantando eletrodos no cérebro de corvos para estudar o que a atividade de seus neurônios é capaz de representar. Nieder começou com o mais fácil: o que é simplesmente mostrado aos animais. Os eletrodos acusam neurônios com atividade relacionada ao que veem? Positivo. Depois, quantidades. Positivo também: corvos sabem “contar”, quer dizer, distinguem não só entre poucos e muitos, mas entre quantidades específicas. Decisões por fazer isto ou aquilo? Positivo, também.

Nieder se empolgou em buscar questões maiores, e a revista Science acaba de publicar sua mais nova descoberta: no cérebro dos corvos há também neurônios cuja atividade representa não o que os animais viram, mas o que eles em seguida acusam ter visto. Ou seja: não o que eles viram, mas o que pensam ter visto.

Buscamos vida inteligente em outros planetas, mas não somos os únicos na nossa própria Terra. Não é preciso se parecer conosco para pensar como nós. Há tanto o que se aprender aqui mesmo...

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