Vera Iaconelli

Diretora do Instituto Gerar de Psicanálise, autora de “O Mal-estar na Maternidade” e "Criar Filhos no Século XXI". É doutora em psicologia pela USP.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Vera Iaconelli

O jovem e a pornografia

Abandoná-los à própria sorte diante das mídias é abrir mão da nossa função

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

O casal nu bate à porta da casa para avisar cordialmente a uma mãe que seu filho adolescente —fã dos vídeos pornográficos que eles estrelam— talvez esteja precisando de uma conversinha sobre sexo. O vídeo leve e engraçado acerta em cheio ao alertar adultos sobre um tema que insiste em ser ignorado ou mal administrado. Ele faz parte da campanha “Keep It Real Online”, lançada pelo governo da Nova Zelândia, que busca ajudar pais e educadores a protegerem crianças de crimes e exploração, mantendo-as seguras no ambiente online —um dos maiores desafios da nossa época. O tema da pornografia é só um dos assuntos tratados no site.

Roubar revista pornográfica dos mais velhos foi uma prática corriqueira das crianças nascidas antes do mundo virtual. Com a internet, a velha curiosidade recebeu novas respostas, mais rápidas, acessíveis e, digamos, tridimensionais e sonoras.

É conhecida a crítica de conservadores à prostituição e à pornografia, embora ninguém acredite que eles mesmos não sejam consumidores de ambas. Diferentes correntes feministas também polemizam sobre o tema, ainda que por razões distintas —uns consideram exploração e desprezo à mulheres, outros um direito.

De minha parte, havendo consentimento e condições de escolha, o sexo entre adultos é uma possibilidade, remunerado ou não. Existe uma indústria pornográfica forte e bem gerida, com astros e estrelas, mas também existe um submundo de exploração e violência. Importante diferenciá-los.

O assunto muda de figura quando se trata de pensar o acesso que crianças e adolescentes têm a esse material. Abandoná-los à própria sorte diante das mídias é abrir mão da nossa função de proteger e educar.

Jovens inexperientes e curiosos têm acesso a imagens de corpos idealizados —fruto de muito anabolizante, treino, plásticas— com desempenhos atléticos, mecânicos e artificiais, relações impessoais que, muitas vezes, simulam atos violentos ou não consentidos, linguagem vulgar, mímica sexual estilizada. Em seguida, ele/a se olha no espelho, vê suas reais proporções —seios, pênis, músculos, altura— e encara uma pessoa comum, em fase de crescimento, que pouco controle e conhecimento tem sobre o próprio corpo e, menos ainda, sobre o corpo do parceiro/a. Deduz do que vê que o sexo não serve para pessoas como ele/ela, melhor nem tentar, ou ainda que para agradar parceiros/as deverá ser capaz de reproduzir aquela performance, e a medida dessa façanha serão os sons, caras e bocas que viu nos filmes.

Campanha da Nova Zelândia alerta pais sobre segurança de crianças na internet
Campanha da Nova Zelândia alerta pais sobre segurança de crianças na internet - Reprodução/YouTube

Um dos efeitos é uma geração desinteressada no encontro sexual presencial candidata a distúrbios sexuais, desviando sua libido para o mundo virtual onde tudo parece possível, mas nada é exequível.
Não podemos errar duas vezes: à falta de controle eficiente sobre o material a que terão acesso —erro garantido—, não podemos somar nossa omissão. Precisamos conversar sobre o assunto com nossos filhos, buscando transmitir algo menos moralista, mas realista.

Quando começamos a falar com filhos sobre sexo? Existem os momentos nos quais você tem “A” conversa, mas eles só funcionam —e aqui vai a dica— se você estiver realmente disposto a ouvir a molecada. Ouça, mostre seu ponto, ouça mais. Mas para além desses momentos “oficiais”, o fato é que o tema sexo é onipresente entre pais e filhos. Eles nos observam e percebem nossas opiniões e expressões de carinho, agressividade, invasão ou pudor. Enfim, já passou da hora de conversarmos sobre isso.

LINK PRESENTE: Gostou desta coluna? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.