Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu Eleições 2018

Adesões e rendições a Bolsonaro

Parlamentares conservadores e elites passam a pensar no governo do capitão

Candidatos a governador passam a apoiar Jair Bolsonaro (PSL), dando rasteiras nos presidenciáveis de suas coligações. Líderes das bancadas do boi, da Bíblia e da bala declaram apoio ao capitão da extrema direita. Os favoritos ao governo de São Paulo vão bolsonarizar de vez no segundo turno.

Não há novidade na adesão oportunista a líderes em pesquisas de voto. A diferença agora é que vai haver embarque tanto por boniteza como por precisão, tanto por gosto por pragmatismo descarado.

Caso Bolsonaro vença, um Congresso cada vez mais conservador terá um homem para chamar de seu, um presidente com modos e ideias parecidos com os da maioria parlamentar. Não é preciso muita ciência para dizer que não foi assim com FHC, Lula e Dilma Rousseff.

Sim, a fotografia é parecida com a da eleição de Fernando Collor, em 1989. O filme é um tanto diferente.

O direitismo tomou conta da maioria dos partidos relevantes. O centro desaparece. Há uma avenida para o bolsonarismo evoluir com suas fantasias de "quebrar o sistema". Por ora, não demonstra capacidade de dirigir e terá de agregar "o sistema" a fim de tomar rumo.

No entanto, há gente ainda para aderir: minorias silenciosas na elite com mais compostura, entre economistas reputados e oficiais-generais dispostos a segurar elementos "sinceros, mas radicais".

Há gente graúda com planos de evitar o descaminho, outro governo de direita desvairado. Ainda falta combinar com o bolsonarismo, mas já estão tentando.

Há mais diferenças em relação a 1989. Collor era um candidato de direita, mas não o líder de uma maré montante direitista como a de agora. A queda do muro de Berlim e liberalismos eram notícia de longe para a maioria da população, na verdade apenas desesperada, à procura de qualquer figura menos identificada ao establishment que desse cabo de quase uma década de crise e hiperinflação.

Naquele tempo, PSDB e PT eram partidos relativamente novos, em ascensão, com articulações sociais relevantes em uma democracia em construção, tomando o campo que ia do centro à esquerda. O PSDB ficou tentado a aderir a Collor, no meio do naufrágio, mas ficou apenas na vontade de alguns.

Depois desta eleição, não restará nada do PSDB de 1989. O PT ou o que restou de maior no petismo, Lula, é objeto de repulsa ativa de quase metade da população.

Se não se pode dizer que estejam em decadência e menos ainda em situação terminal, são inegáveis seu descrédito, a carência de lideranças, a desconexão social e o envelhecimento ou desaparecimento das bases desses partidos.

Caso se meça conservadorismo pela adesão simultânea de parlamentares às frentes parlamentares da Agropecuária, Evangélica e de Segurança Pública, o PSDB tem um perfil parecido com os do centrão, dos ex-aliados de Eduardo Cunha e dos aliados típicos de Bolsonaro.

Apoios de governadores nem sempre se traduzem em votos das bancadas na Câmara. Frentes parlamentares não organizam votações, embora mudem o clima geral. De resto, quem vencer a eleição terá de aprovar mudanças amargas na Previdência, aumentar a carga de impostos, talvez mesmo sobre empresas. Terá de barganhar com pencas de parlamentares pendurados na Lava Jato e coisas assim.

Na turma de Bolsonaro, por ora uma desordem, é escasso o conhecimento da tecnologia de organizar governos, para não falar de disposição de fazê-lo. Mas há muita gente disposta a ajudar, por assim dizer.

vinicius.torres@grupofolha.com.br

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