Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire

Brasileiro poupa, guarda gordura para 2021 e PIB anda menos do que se esperava

Resultado é melhor que o de outros latino-americanos e de governos que gastaram menos na crise

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O brasileiro está com receio de gastar, mesmo quem tem a boa sorte de ter algum para consumir. De qualquer modo, o brasileiro poupou, diga-se, de modo mais neutro.

As empresas seguraram o investimento mais do que o esperado. Grosso modo, o PIB “frustrou as expectativas de mercado” por causa disso. Na praça financeira, esperava-se crescimento de 9% do segundo para o terceiro trimestre. Veio 7,7%.

Foi meio decepcionante, não recupera o desastre do segundo trimestre e menos ainda o desastre do ano. Mas, sim, foi um resultado bem melhor do que o da vizinhança latino-americana. Os números confirmam também que, em país em que o governo gastou mais na calamidade, como no Brasil, os resultados do PIB foram menos ruins.

De mais notável é que:

  1. na calamidade, a renda andou na frente do consumo
  2. na média, deve haver alguma gordura para queimar no início de 2021. “Na média” ou na soma total dos rendimentos, ressalte-se, o fim dos auxílios emergenciais e similares pode não ser um baque tão grande (na média, pois muita gente vai cair na pobreza e na miséria).

Por que o consumo das famílias foi “frustrante”?

Por ora, é possível especular de modo razoável que:

  1. medo da epidemia, de sair para consumir;
  2. dificuldade de gastar (para os mais remediados ou ricos);
  3. precaução: não se sabe se a epidemia acaba, se vai ter emprego, para onde vai a economia do país, dado o desgoverno;
  4. pessoas com baixa renda, que receberam o auxílio emergencial, que foi relativamente grande, sabem que a ajuda não duraria. Guardaram algum.

De qualquer modo, dadas as previsões de crescimento para o quarto trimestre revisadas já por alguns grandes bancos, o PIB deste ano deve cair cerca de 4,5%. Para o ano que vem, a névoa adiante é espessa.

Não há nem Orçamento federal para 2021, por exemplo. É incerto o que será feito das contas do governo. No entanto, os economistas do próprio governo, da Secretaria de Política Econômica (SPE), adiantaram hoje em nota que não será necessária a prorrogação dos auxílios no ano que vem, pois a recuperação da economia deve continuar mesmo sem eles, dado o grande aumento da taxa de poupança neste 2020: “...a forte elevação da taxa de poupança no 3T20 (17,3% do PIB), que alcançou o maior valor para o terceiro trimestre desde 2013, sinaliza que a trajetória de consumo será suavizada no começo de 2021 sem a necessidade de novos auxílios governamentais”.

Mais: “A forte recuperação da atividade, do emprego formal e do crédito, aliadas ao aumento da taxa de poupança, pavimentam o caminho para que a economia brasileira continue avançando no primeiro semestre de 2021 sem a necessidade de auxílios governamentais”, diz a nota da SPE.​

Um dos problemas do consumo ficam evidentes no desempenho dos setores que o IBGE classifica como “transporte, armazenagem e correio” e “outras atividades de serviços” restaurantes ou lanchonetes, manicures, barbeiros, negócios de consertar, profissionais liberais, saúde e educação privadas, entretenimento, cultura, esportes, hotéis etc.).

Um motivo principal do mau desempenho desses setores é também evidente: chama-se epidemia, em primeiro lugar. Pessoas ainda não consomem mais serviços, que implicam mais proximidade física, por temor de infecção e porque circulam menos pelas cidades. Não viajam. Etc.

“Outras atividades de serviços” valem 16,1% do PIB. “Transportes etc.”, 4,3%. São um pedação da produção ou da renda da economia, portanto. Ainda são as atividades mais deprimidas neste ano de calamidade.
Quanto à poupança: O que quer dizer que o país “poupou” mais?

A taxa de poupança aumentou brutalmente. “Poupança” significa aqui, no PIB, rendimentos pagos e não consumidos no conjunto da economia. Não quer dizer que “o dinheiro está sobrando”, que as estatísticas do IBGE são doidas ou coisa assim.

A variação da taxa de poupança do terceiro trimestre de 2019 para 2020 o trimestre foi rara, muito anormal. Passou de 13,7% para 17,3% do PIB. Não se viu tal coisa em um quarto de século, desde quando há registros mais precisos do PIB. A taxa de poupança voltou a um nível pré-recessão.

E daí?

Pode ser que essa acumulação, por assim dizer, sustente alguma despesa mesmo depois do fim dos auxílios do governo, os emergenciais e outros menores. Quer dizer que o governo ou pelo menos seus economistas ficarão menos inclinados a aprovar novos auxílios ou “rendas básicas” no início do ano que vem.

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