Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu Datafolha

Números indicam uma eleição apertada e muito no escuro

Pesquisas e economia pouco ajudam a entender o voto de 22

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A maioria das pesquisas sugere que a eleição de presidente está apertada. Muito apertadas quando se levam em conta a volatilidade do eleitor (propensão a mudar de ideia na última hora) e voto "camuflado", hipótese ainda na mesa das discussões sobre o resultado dos levantamentos eleitorais.

A surpresa do número baixo de votos brancos e nulos no primeiro turno de 2022, o menor de todas as eleições da redemocratização, junta incerteza aos prognósticos. Para piorar, há os humores da abstenção. Os resultados municipais e estaduais também não permitem especular nem de modo vago sobre motivos de voto.

De resto, ainda sabemos pouco do que está acontecendo: de como mudaram o país e a conversa política-eleitoral.

Na montagem, o ex-presidente Lula (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL)
Na montagem, o ex-presidente Lula (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL) - Nelson Almeida e Evaristo Sá/AFP

Na maioria das pesquisas, Lula aparece adiante de Bolsonaro por uma diferença em torno de 7 pontos (considerados os "votos totais", aquela conta que não descarta brancos e nulos). No Datafolha, são 5 pontos.

Especular com os resultados do primeiro turno também não ajuda muito a pensar o que pode sair das urnas em 30 de outubro. Esses números ainda não servem nem mesmo para orientar estratégias mais detalhadas (ou menos desorientadas) de campanha. Precisam de mastigação demorada, universitária. Nem se mencione o fato de que a conversa eleitoral corre por subterrâneos, que apenas agora começam a ser estudados e sobre os quais não há medidas precisas, a começar pelas redes e mensagens de celular.

Uma primeira inspeção das votações municipais de Lula e Bolsonaro no primeiro turno indica que seus resultados foram parecidíssimos com os de 2018 (na comparação com a votação proporcional de Bolsonaro e de Fernando Haddad). Ao menos na votação por cidade, a correlação entre 2022 e 2018 é quase perfeita.

Não há relação entre "riqueza" (a precária medida de PIB per capita municipal) e voto em Lula e Bolsonaro. Números de IDH municipal (como os da Firjan, o mais recente de 2016) sugerem de modo vago uma votação ligeiramente maior em Bolsonaro quanto maior o IDH da cidade, e o inverso para Lula.

Especulações econômicas com os dados ora disponíveis não fazem lá muito sentido. Se o aumento do emprego formal em três anos e pouco fosse um indicador de "melhoria econômica" nas cidades, essa melhoria não teria tido nenhum efeito perceptível sobre a votação de Lula e Bolsonaro. Os números de vendas de comércio e empregos por estado, ainda mais grosseiros, também não dariam pista alguma.

Está mais difícil do que sempre verificar como as andanças da economia da vida cotidiana afetam cada tipo de eleitor. A semelhança da distribuição espacial do voto (entre 2022 e 2018) e a ausência de evidência do efeito da "economia" no voto de cidades e regiões podem sugerir que parte relevante da conversa eleitoral seja de outra espécie.

De imediato, pode-se sugerir que esta eleição é um referendo sobre Bolsonaro e sobre Lula, "pelo conjunto da obra" e algo mais. O algo mais podem bem ser as discussões pautadas por Bolsonaro: "Deus, pátria e família", "comunismo", a pregação antissistema (e, dentro disso, o antiestatismo), o elogio (de um certo aspecto) da violência, "identidades", corrupção (e uma versão pervertida) e, pelo avesso, da sobrevivência da democracia.

Consideradas as inconstâncias listadas no início deste texto e o fato de que faltam ainda 19 dias para a votação, o resultado da eleição é muito incerto. Não se pode decretar que a discussão eleitoral não possa tomar outro rumo, mas tem faltado imaginação ou novidade nas campanhas que agora recomeçam. Também ainda não apareceu uma conversa decisiva para capturar os "nem-nem" do primeiro turno.

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