Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Revolta contra impostos é problema para novo teto de gastos de Lula

Plano do governo precisa de receita; revolta do shopping muamba revela que vai ser difícil

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O governo Lula se embananou com essa tentativa de diminuir o contrabando por meio de comércio eletrônico externo. É uma providência razoável: conter a concorrência desleal com o varejo brasileiro e arrecadar uns dinheiros a mais.

A espuma dessa minicrise pode se dissipar em dias. Não era assunto maior, embora tenha nublado a divulgação do plano de arrumar as contas públicas, enviado nesta terça-feira ao Congresso —mais sobre isso mais adiante neste texto.

Mais importante é que trata-se apenas de uma tentativa miúda de arrecadar mais impostos. Muitas e maiores virão. No entanto, até agora o governo não apresentou um plano claro, uma proposta de acordo político e social, a fim de arrecadar mais.

Logo da Shein; roupas são o principal produto da plataforma, que funciona também como marketplace, intermediando vendas para outras pessoas e empresas - Chen Lin-18.out.22/Reuters

Para piorar, diz que não quer aumentar a "carga tributária". Quer e precisa aumentar a carga. Cria ainda mais confusão e ilusão ao dizer que vai diminuir o IR da Pessoa Física.

Sem aumento de carga, a "Nova Regra Fiscal", o "arcabouço fiscal", o teto de Lula ou "calabouço fiscal" (no dizer da esquerda), não para em pé. Se o governo se enrola com uma mera tentativa de conter sonegação e de arrecadar R$ 8 bilhões, quanto problema terá para aumentar a receita em R$ 150 bilhões?

Favor prestar atenção: até 2026, o governo precisa arrumar uns R$ 150 bilhões além do aumento regular da arrecadação, derivado de crescimento econômico ou de alguma bonança. De outro modo, não vai fazer superávit suficiente (receita menos despesa, desconsiderados gastos com juros). Se não houver superávit, a dívida pública continuará a crescer, com efeitos sobre taxas de juros e câmbio ("preço do dólar") e, pois, sobre o crescimento da economia.

Não interessa se a tentativa de conter a sonegação causou revolta porque foi mal compreendida ou por ter sido muito bem entendida. O fato é que o governo passou duas semanas escorregando em casca banana e acabou engolindo a banana com casca e tudo, tendo de voltar atrás em uma das providências. Já era difícil recolher o dinheiro da sonegação; agora, mesmo que uma nova regulação funcione, deve arrecadar menos.

Em suma, ficou claro que aumento ou cobrança devida de impostos causa revolta. Ainda neste ano, o governo quer voltar a cobrar R$ 88 bilhões de isenção de impostos federais provocada por um tipo de isenção tributária estadual (via ICMS). Isso vai dar problema. Parte do varejo já está em revolta, agora ainda mais irritado porque o governo talvez não consiga conter o shopping muamba virtual.

Mais adiante, provavelmente no final do ano ou começo do que vem, Lula ou a Fazenda, pelo menos, tentarão derrubar outras isenções de impostos. Se não houver clareza de rumo, discussão nacional, acordo social e político organizado, vai ser muito difícil fazer esse remédio descer pela goela do país.

Quanto ao texto do "novo arcabouço fiscal", o teto de Lula, era o sabido. De mais importante, até agora incerto, foi a definição do que é receita, o que influencia, claro, a definição de quanto a despesa pode aumentar.

Não vão entrar na receita os dinheiros de dividendos de estatais, entre outras restrições mais óbvias (como recursos de concessões, venda de patrimônio e ganhos com commodities, grosso modo e na prática).

Qual a vantagem? Não se pode tratar como permanente a receita derivada de uma alta grande de preços de petróleo ou pagamentos grandes de dividendos de estatais. São receitas muito variáveis. Como o crescimento da despesa equivale ao 70% do aumento da receita, poderia haver alta de despesa baseada em dinheiro que logo poderia secar. É receita extraordinária e, pois, deve ser utilizada para se pagar dívida. Foi o que não se fez no Brasil do começo da década passada. Foi o que ajudou a quebrar o país.

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