Tentativa de fuga em presídio deixa 22 mortos na Grande Belém

Além de superlotação, inspeção cobrava muro ao detectar facilidade do resgate

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Massacre deixa mais de 20 mortos em presídio na região metropolitana de Belém, no Pará
Massacre deixa mais de 20 mortos em presídio na região metropolitana de Belém, no Pará - Reprodução
Moisés Sarraf Guilherme Seto
São Paulo e Belém

Pelo menos 22 pessoas morreram na tarde desta terça-feira (10) durante uma tentativa de fuga em massa de um presídio superlotado do Pará classificado como vulnerável por inspeção externa.

O governo do estado chegou a informar 23 mortes no confronto durante a tarde, mas depois corrigiu a informação. 

Dos mortos, há 16 presos e 5 criminosos que pretendiam resgatá-los por meio de uma invasão ao Centro Penitenciário de Recuperação do Pará, no Complexo de Santa Izabel do Pará, na região metropolitana de Belém. Um agente prisional também morreu, e quatro ficaram feridos —um deles em estado grave.

Segundo a Susipe (Superintendência do Sistema Penitenciário do Pará), a ação foi feita de maneira coordenada.

Um grupo de detentos iniciou um motim no presídio, enquanto criminosos do lado de fora tentavam uma invasão para resgatá-los do complexo, às margens da rodovia BR-316.

Seis agentes prisionais foram feitos reféns, e houve confronto com policiais que faziam a segurança interna.

Fora da prisão, um grupo utilizou explosivos contra um dos muros do pavilhão C.

O episódio ocorreu em um início de semana marcado pela violência na Grande Belém, com 12 pessoas assassinadas num intervalo de cinco horas. O estado descartou, porém, qualquer ligação entre os casos.

O coronel André Cunha, secretário-adjunto de gestão operacional da Secretaria de Segurança do Pará, disse não ser possível apontar se alguma fuga se concretizou.

Sobre a possibilidade de alguma facção criminosa ter organizado a ação, ele disse: “Não temos como fazer conexão. É cedo. Não é a primeira tentativa de fuga nessa unidade, nem a primeira vez com ajuda externa nos últimos anos. Mas, com uso de explosivos, é a primeira vez”

MURALHA

O complexo penitenciário alvo da tentativa de fuga havia sido inspecionado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que divulgou um relatório em fevereiro deste ano dizendo que as fugas em massa eram recorrentes, apontando uma série de fragilidades e cobrando providências.

O órgão solicitava a construção urgente de uma muralha para isolamento da unidade e pedia uma solução para a “profunda superlotação”.

A muralha pedida pelo CNJ era justamente para evitar “a facilidade do resgate realizado com apoio externo”, situação classificada como “alarmante, insustentável e recorrente”, de acordo com os termos utilizados no relatório.

O conselho também dizia que objetos ilícitos, como armas, eram constantemente arremessados para dentro da prisão —situação que a muralha poderia dificultar.

A capacidade da unidade era para 432 detentos, mas ela abrigava 660, em condições definidas como “péssimas”.

Depois das inspeções presenciais, a equipe pedia reforço urgente da estrutura de segurança da área de visitação —isolada apenas com “um alambrado e concertina, situação de vulnerabilidade inaceitável para um presídio de alta segurança”.

O governo do Pará, a cargo de Simão Jatene (PSDB), foi questionado pela Folha sobre as providências pedidas pelo CNJ, mas não respondeu até a conclusão desta edição.

A identidade do agente prisional morto durante a troca de tiros não foi informada. O estado trabalhava à noite na identificação das vítimas.

MASSACRES

O país teve no início de 2017 uma matança em diferentes presídios. Na época, massacres e confrontos em série deixaram pelo menos 126 detentos mortos em prisões do Amazonas, Roraima e Rio Grande do Norte.

Um ano depois, como mostrou reportagem da Folha, as realidades nesses estados seguiam longe de resolver seus principais problemas carcerários, como sistemas penitenciários superlotados, facções criminosas, infraestrutura precária, fugas e mortes.

SUPERLOTAÇÃO

O Brasil ultrapassou a Rússia em 2015 e agora abriga a terceira maior população prisional do mundo, segundo dados divulgados no final do ano passado pelo Ministério da Justiça.

Eram 699 mil brasileiros presos naquele ano, contra 646 mil russos. Só perdemos para os Estados Unidos (2,1 milhões) e a China (1,6 milhão).

Entre os quatro países com maior população carcerária, também temos a terceira maior taxa de encarceramento por 100 mil habitantes (342) desde 2000, quando passamos os chineses (119). O índice é mais baixo que o dos americanos (698) e da Rússia (445), mas é o único que está em crescimento contínuo desde 1995.

Os dados são do Infopen (Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias), que é feito pelo Depen (Departamento Penitenciário Nacional) desde 2004 e, em 2017, contou com parceria do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A coleta foi realizada por meio de um formulário digital, preenchido pelos gestores dos estabelecimentos prisionais dos Estados.

O levantamento mais recente indica que o número de vagas no sistema prisional brasileiro diminuiu, na contramão da população carcerária, que só cresce. Foram registradas 3.152 vagas a menos (queda de 0,8%) e 28.094 presos a mais (alta de 4%) no primeiro semestre de 2016, com relação ao fim de 2015.

Com isso, a taxa de ocupação nas prisões saltou de 188% para 197% no período, ou seja, há dois presos para cada vaga em presídios no Brasil. Na prática, nove em cada dez detentos vivem em unidades superlotadas. Uma resolução do Ministério da Justiça de novembro de 2016 recomenda que o limite da ocupação seja, no máximo, de 137,5%, mas todos os Estados ultrapassam esse índice.

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