Descrição de chapéu Rio de Janeiro

Intervenção no Rio não gerou mudanças efetivas, conclui estudo

Medida de Temer não levou à modernização das polícias ou a ações de inteligência

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Rio de Janeiro

A intervenção federal não produziu mudanças significativas na segurança do Rio de Janeiro e não deve ser copiada por outros estados. Essa foi a conclusão de uma equipe de pesquisadores que acompanhou a medida diariamente nos seus mais de dez meses de duração. 

Na semana em que a ação completa um ano, o Observatório da Intervenção Federal, formado logo no seu início por membros da Universidade Cândido Mendes, lançou um relatório com os principais dados e informações que coletou no período.

"Havia uma chance de mudar o rumo da história da segurança no Rio. Havia prestígio, poder e dinheiro. Mas ao invés disso houve uma radicalização dos mesmos erros políticos de antes", diz a cientista social Silvia Ramos, que coordena o Observatório.

A intervenção durou de 16 de fevereiro a 31 de dezembro de 2018, por um decreto até então inédito do ex-presidente Michel Temer (MDB). Na prática, ele transferiu o comando das polícias, dos bombeiros e das prisões do RJ para as mãos da União —sob o comando do general Walter Braga Netto.

A medida foi uma resposta às cenas de roubo na capital fluminense que tomaram as TVs no Carnaval daquele ano. Também permitiu que o governo abandonasse a reforma da Previdência, já que a Constituição não pode ser mudada sob intervenção.

O relatório divulgado nesta quinta (14) critica principalmente a política de operações (foram contabilizadas 711), confrontos e ocupações em favelas adotada no período, em detrimento de ações de inteligência para desarticular o crime organizado e da modernização das polícias.

"Esse modelo desgastado já mostrou ser incapaz de produzir resultados efetivos. Seus efeitos, quando ocorrem, são revertidos logo após a saída das forças militares. É o que agora acontece: finda a intervenção federal, o RJ enfrenta os mesmos problemas de sempre", diz o estudo.

Os dados destacados mostram, por exemplo, que houve um aumento significativo dos disparos e tiroteios (57%), das chacinas (64%) e das mortes por policiais (34%), em comparação com o mesmo período do ano anterior (fevereiro a dezembro). As mortes violentas no geral tiveram uma leve queda de 2%. Já o número de policiais mortos em 2018 (92) foi o menor da série histórica, segundo a PM.

"Perdeu-se a oportunidade de moralizar o uso da força. Quando houve chacinas na Rocinha, Penha etc. durante a intervenção, não teve um general que disse: isso tá errado, vamos investigá-los ou afastá-los. Não temos nem notícia do que aconteceu com eles", afirma Ramos.

A pesquisadora ressalta ainda a diferença nas respostas dadas a crises no Rio e no Ceará, que sofreu uma série de ataques do crime organizado no início deste ano. 

"Ali o estado não caiu na tentação de combater a violência com violência. Não entraram em comunidades atirando, descobriram com a inteligência casas onde havia explosivos, apreenderam celulares, transferiram lideranças dos presídios e conseguiram conter o atrito."

Quando a intervenção no Rio terminou, os militares comemoraram a queda nos roubos em geral, principalmente os de carga (-17%). O relatório também cita essa diminuição, mas traz a ressalva de que os números aumentaram em algumas regiões do estado, como interior e Grande Niterói.

O então interventor Braga Netto sempre ressaltou que a intervenção se tratava de mudanças de gestão e citou como principais heranças a articulação dos órgãos, a meritocracia, a motivação dos servidores e uma cultura de planejamento na segurança.

O Observatório, por outro lado, cita uma "desproporcionalidade entre os investimentos feitos e a modéstia dos seus resultados". A equipe da intervenção recebeu R$ 1,2 bilhão para investir na segurança pública do estado e conseguiu empenhar 97% desse valor, mas até agora só 10% foram efetivamente gastos.

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