Corrida por teste e bolhas de isolamentos em grupo marcam fim de ano

Paulistas contam como se prepararam para poder passar Natal e Réveillon em período de alta nas mortes por Covid

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São Paulo

A empresária Regina Marques, 61, alugou um sítio em Amparo, interior paulista, para passar Natal e Réveillon junto com a irmã, o cunhado, sobrinhos e um casal de amigos. Também com a mãe, que, com 90 anos, tem sido preocupação constante da família por estar no grupo de risco da Covid-19.

O professor de português, Henrique dos Santos Pessoa, 38, no mar de Praia Grande - Eduardo Knapp/Folhapress

Desde o início da quarentena, em março, a matriarca não vê a família reunida. Por essa razão, todos que vão participar da confraternização fizeram teste para saber se haviam tido contato com vírus.

Mas a medida não foi suficiente para que se sentissem seguros. Os testes sorológicos, que detectam se a pessoa teve Covid no passado, foram feitos com quase um mês de antecedência e deram negativo.

Como garantir que até o dia das festas ninguém se contaminaria, porém? “Alugamos o sítio no interior de São Paulo, fizemos todo esse rolê em setembro, quando o bicho estava acalmado. Quando fechamos a viagem, a coisa não tava desse jeito. Agora estamos todos com medo de ir”, conta Marques, atribuindo sua preocupação a nova alta nos casos de contaminação de mortes por Covid-19.

À beira do Natal, o país se aproxima do número de 190 mil mortes por causa da pandemia, com aumento de 20% no número de mortes pela doença em comparação com as medições feitas no início do mês.

“Vai com a gente um casal de amigos médicos. Eles pediram para que todos fizessem teste sorológico para saber quem já tinha tido contato com o vírus”, conta. “Só que a maioria negativou. Esse exame não serviu para muita coisa. E não adianta fazer PCR, porque as pessoas vão sair do trabalho e vão viajar. A gente vai ter que ficar de máscara, longe um do outro e ao ar livre.”

Outras medidas fizeram parte do pacote. “Planejamos nos distribuir, colocando duas pessoas por carro. Ninguém vai de ônibus. Duas semanas antes das festas, já tínhamos feito as compras. Só deixamos para comprar carnes e verduras no período, para para não precisar sair mais de casa”.

O ator Raul Figueiredo, que embarcou de São Paulo para fortaleza para ver a família - Arquivo Pessoal

Com casos similares ao da família de Marques, o laboratório CR Diagnósticos viu a demanda de testes de Covid-19 quadruplicar nas últimas semanas no posto drive-thru que montou no estacionamento do shopping Mooca Plaza, zona leste da capital paulista, para realizar exames de Covid-19.

Segundo atendentes, o local, aberto desde junho, recebia de cem a 120 pessoas interessadas em realizar o exame RT-PCR, que custa R$ 350 e pode ser feito sem pedido médico. Nas últimas semanas, com a proximidade das celebrações, passaram a ser 400.

A fim de garantir o processamento dos testes e o prazo de entrega do resultado para as 7h do dia seguinte à realização do exame, o laboratório colocou um limite de 200 atendimentos por dia.

O posto funciona de segunda a sábado das 10h às 19h, e aos domingos e feriados, das 14h às 20h. As pessoas aguardam dentro dos veículos estacionados até que possam movê-los para mais perto do local de atendimento. Enquanto esperam, profissionais do laboratório vão de carro em carro com uma ficha na qual anotam se o interessado teve sintomas da doença ou contato com alguém com Covid-19, se vai viajar e, se sim, se vai de avião.

Segundo a técnica de enfermagem Tarciany Firme de Andrade, 21, a maioria dos que procuraram o posto nos últimos dias (“95% das pessoas”, diz) é assintomática e o faz para poder viajar.

Durante o período de festas, entre 25 e 27 de dezembro e 1º a 3 de janeiro, o estado de São Paulo regride para a fase vermelha da quarentena, a mais restritiva do Plano São Paulo, e esse recuo se refletiu no cancelamento de reservas de hotéis, segundo Heitor Gonzalez, presidente do Sinhores (Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares da Baixada Santista e do Vale do Ribeira).

No Guarujá, a taxa de reservas está em 30% neste fim de ano —normalmente, esse percentual oscila entre 80% e 100% entre o Natal e Ano-Novo, diz a Aprohot (Associação dos proprietários de Meios de Hospedagem do Guarujá).

Morador de Praia Grande, o professor Henrique Pessoa, 38, não poderá retornar ao hábito de pisar na areia e pular sete ondas para celebrar a passagem de 2020 para 2021. As praias da Baixada Santista estarão fechadas, e as festas que haviam sido programadas foram canceladas.

Pessoa também vai sentir falta da celebração junto aos amigos de roda de samba, muitos deles integrantes de agremiações. A decisão foi fazer um amigo secreto por meio de um aplicativo chamado Amigo Secreto 22. O sorteio é online e, no dia marcado para a entrega dos presentes, todos se reúnem virtualmente.

O anúncio de seus amigos secretos é um por um, diante da tela do computador. Mas os participantes só mostram qual foi o presente comprado.

“Fiquei responsável por registrar os e-mails dos amigos no app. O aplicativo faz o sorteio e manda para a caixa postal de quem está participando o nome do amigo oculto. A gente só vai mostrar o presente comprado por vídeo. A entrega de verdade será feita no período pós-pandemia, na quadra da Mocidade”, conta.

O ator Raul Figueiredo, 54, também teve de repensar a forma de passar o Réveillon junto da família, que mora em Fortaleza. Ele fez o teste de Covid-19 dez dias antes dos festejos, porém teve de pegar um voo da capital paulista, o que faz crescer o risco de contágio e sua preocupação.

No apartamento dos pais (a mãe tem 76 anos e o pai, 83), estarão reunidos sete adultos, um sobrinho de 18 anos e outros três com 10 anos.

O que ameniza a preocupação é que o apartamento dos pais “é grande e bem ventilado”. A família sempre faz a ceia do dia 24 e um almoço no dia 25. “Este ano os amigos estão desconvidados”, diz Raul. “Normalmente, mais duas famílias passariam as festas conosco”, prossegue ele.

Raul viajou para Fortaleza na última sexta (18), com atenção máxima aos protocolos para evitar contágio. “Quando entramos no saguão do aeroporto, eles medem sua temperatura. Há espaço delimitado no chão, com 1,5 m entre os passageiros. Também deixam levar álcool em gel em pouca quantidade”, conta.

“O avião estava cheio, eu viajei com duas pessoas, peguei lugar na fileira do corredor. A tripulação alerta que o avião recicla o ar o tempo inteiro. E que, se caírem as máscaras [em caso de despressurização da cabine], a gente tem que tirar a nossa máscara [contra o coronavírus] e usar a máscara de oxigênio. Durante todo o voo precisa usar a máscara, e não foram oferecido ‘snacks’ nem comida, só água”.

Raul conta que, na hora de desembarcar, os comissários liberam os passageiros de duas em duas filas. “No embarque também pedem para que as pessoas fiquem sentadas no saguão. Chamam por grupos”. Um problema é que nem todo mundo respeita as regras, diz o ator. “Você tem que olhar feio às vezes para a pessoa se afastar”, diz.

Com todas essas restrições, a Infraero estima queda de 56% da movimentação de passageiros em Congonhas. Segundo pesquisa Datafolha, em dezembro, 54% afirmam que saem de casa para trabalhar ou fazer outras atividades. Em 3 de abril, eram 24%.

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