Concessão do Palácio Rio Branco avança e cria batalha judicial em Salvador

Rede hoteleira de luxo foi a única empresa a dar lance em licitação

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Salvador

O processo de concessão do Palácio Rio Branco —erguido no mesmo lugar em que funcionou a primeira casa de governo do Brasil, no século 16— é alvo de uma batalha judicial que opõe o governo da Bahia e entidades ligadas ao patrimônio histórico em Salvador.

O palácio está fincado no mesmo local onde funcionou a sede do governo colonial, construída em 1549 a mando do primeiro governador-geral, Tomé de Souza, e de onde o Brasil foi governado por mais de 200 anos.

A licitação para a concessão do palácio por um período de 35 anos para um grupo hoteleiro aconteceu na quinta-feira (20), em Salvador, com o lance mínimo de cerca de R$ 26,5 milhões. Houve apenas uma interessada: a empresa BM Varejo Empreendimentos, controladora da Rosewood, uma das redes hoteleiras mais luxuosas do mundo.

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Palácio Rio Branco fica no centro histórico de Salvador - Raul Spinassé - 5.set.2019/Folhapress

Também na quinta, o Ministério Público do Estado da Bahia ingressou com uma representação para suspender a licitação. O pedido foi negado pela Justiça nesta sexta (21), mas a Promotoria informou que vai recorrer da decisão.

Mesmo com uma única empresa no certame, a licitação ainda não teve um desfecho. A documentação que foi entregue pela BM Varejo Empreendimentos ainda vai ser analisada.

Caso seja aprovada, o palácio Rio Branco será concedido à rede Rosewood, que planeja implementar um hotel de seis estrelas no local. Pelo contrato, a empresa vencedora do processo de licitação só terá que pagar aluguel ao estado a partir do décimo sexto ano da concessão.

O projeto também prevê que a empresa fará obras de recuperação no Memorial dos Governadores Republicanos da Bahia —que funciona no local—, mas que continuará sob controle do estado e aberto à visitação pública.

Situado na praça Tomé de Sousa, ao lado da parte alta do Elevador Lacerda, o Palácio Rio Branco tem uma vista privilegiada da baía de Todos-os-Santos.

A decisão de transformar o Palácio Rio Branco em um hotel foi tomada pelo governador da Bahia, Rui Costa (PT), que aprovou uma Proposta de Manifestação de Interesse do grupo português Vila Galé. A empresa, contudo, acabou não participando da licitação para a concessão do espaço.

Caso seja concretizada a concessão para a rede Rosewood, o grupo português será ressarcido pelos gastos com a elaboração do projeto.

Para além do próprio espaço do Palácio Rio Branco, a instalação do hotel demandará a construção de edifícios de apoio em terrenos nos fundos do prédio histórico. Em outubro do ano passado, o governo baiano desapropriou uma área entre a rua Pau da Bandeira e a Ladeira da Montanha.

Em nota, a Secretaria de Turismo do Estado da Bahia informou que a decisão de conceder o palácio Rio Branco à iniciativa privada "segue um modelo mundial de preservar o patrimônio e oferecer, numa área como o Centro Histórico, oportunidades de emprego e renda".

O secretário de Turismo da Bahia, Maurício Bacelar, não se pronunciou porque está retornando de uma viagem de trabalho à Espanha.

A previsão do governo baiano é de que, num período de 18 meses, as obras de restauração e recuperação do palácio serão concluídas para que o hotel seja aberto para ocupação.

A denúncia que levou ao processo do MP-BA foi resultado de uma representação do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB).

"Como é que você vai analisar aquele edital sem ter acesso à planilha, sem ter acesso aos instrumentos da modelagem econômico-financeira que resultou naquele valor de R$ 26 milhões? Aquilo é uma modelagem financeira que a sociedade precisa conhecer", diz Luiz Antônio de Souza, presidente do departamento da Bahia do IAB.

Por não possuir mais traços de sua arquitetura original, o palácio não é tombado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), mas especialistas atestam sua carga simbólica e sua importância histórica.

O Instituto dos Arquitetos do Brasil, seção Bahia, pleiteia o tombamento do palácio desde 2015 e defende o seu uso para abrigar órgãos públicos ou equipamentos culturais.

"A importância dessa edificação não é só para a história do Brasil, é para a história das Américas", diz Luiz Antônio de Souza. "[O governo baiano] está renunciando ao uso do bem, está renunciando e transformando o uso de algo que tem 473 anos sendo local destinado à atividade administrativa", completa.

O palácio passou por reformas e reconstruções ao longo dos séculos. Em 1837, foi sede da efêmera República Bahiense, proclamada em Salvador após a revolta da Sabinada.

Durante o período imperial (1822-1889), o palácio hospedou o imperador D. Pedro 1º, a impeatriz D. Leopoldina e a princesa D. Maria da Glória, que depois se tornou rainha de Portugal. Também foram hóspedes o imperador D. Pedro 2º e a imperatriz D. Teresa Cristina.

Em 1912, a mando do presidente Hermes da Fonseca, o palácio foi alvejado por tiros de canhão que partiram do forte de São Marcelo para destituir o governador Aurélio Viana. Sete anos depois, foi reerguido e ganhou o nome atual, em homenagem ao barão do Rio Branco.

O palácio Rio Branco foi sede do governo do estado da Bahia até 1979. Depois, abrigou a Bahiatursa, a Secretaria de Cultura do estado e, atualmente, abriga o Memorial dos Governadores Republicanos da Bahia.

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