A casa está praticamente destruída. No que costumava ser o quarto e a cozinha, só há lama, entulho e objetos retorcidos. Em meio ao rastro de destruição, um pequeno altar resistiu intacto à força das águas. Pendurado na parede, ele abriga três santinhos e um copo com água benta. Alan Coelho, 40, diz dever a própria vida a uma intervenção divina.
"Eu vi a morte na minha frente. Só estou aqui por causa de Deus. O que eu vi aqui foi uma cena de terror", diz ele, lembrando que tudo a sua volta desmoronava: barrancos, encostas e, depois, a própria casa. "Só ficou inteira a parte em que eu e a neném estávamos. A parte de trás caiu e só ficou a parte da frente."
A casa foi destruída durante a chuva que arrasou Petrópolis nesta terça-feira (15). Em apenas seis horas, choveu (260 mm) o equivalente aos últimos 30 dias (272 mm). O temporal deixou 152 pessoas mortas e 154 desaparecidas.
Quando o deslizamento aconteceu, Alan estava filmando a chuva para enviar as imagens à esposa e diz não ter ficado preocupado. Não achava que corria riscos, até que a lama começou a invadir a casa onde ele estava com mais três pessoas: a irmã, a afilhada e a filha recém-nascida.
"Eu fiquei ilhado com lama por todos os lados, mas a parte em que eu estava foi preservada." No entanto, a irmã e a afilhada estavam na parte da casa que foi mais afetada pelo deslizamento e acabaram presas nos escombros.
"Consegui tirar a minha irmã, que estava com lama até a cintura. Puxei ela e subimos para a rua", conta ele, que conseguiu salvar também a filha e a afilhada. "É um milagre estar aqui relatando isso para vocês", diz ele. "Eu não pedia socorro. Eu gritava pelo nome de Deus."
No bairro Chácara Flora, também foram grandes os estragos causados pela chuva. Casas vieram abaixo e as ruas estão tomadas por escombros, carros e árvores destruídas. Envoltos em uma espessa neblina que dificulta os trabalhos, bombeiros procuram nos destroços por pessoas que foram soterradas durante as chuvas.
Sentado na calçada, um grupo espera desde terça-feira notícias de Roberta Ribeiro dos Reis, 28, jovem que foi soterrada ao lado da filha de quatro anos.
"Minha filha e minha neta estão desaparecidas. A gente está na busca. Enquanto houver um fio de esperança, a gente vai estar aqui, vamos estar na luta", diz Roberto Ribeiro, pai de Roberta.
Ele diz que a filha morava em Teresópolis, mas estava passando férias em sua casa, em Petrópolis, quando o imóvel foi destruído por um deslizamento.
"Eu não tenho mais casa. Ela foi enterrada em seis metros de terra. Quando aconteceu, eu estava no trabalho. Não deu tempo de eu tirar a minha família de casa", diz ele. "É uma dor insuportável. Não existem palavras para descrever o que eu estou sentindo nesse momento. Só Deus sabe."
Depois da destruição causada pelas chuvas, Roberto diz que não se vê mais morando na Chácara Flora, bairro onde vive há 30 anos. "Eu só quero encontrar as minhas meninas e sair deste lugar para sempre. Esse lugar me trouxe muita dor e muito sofrimento", diz ele.
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