Tem que saber perder, diz prefeito de Osasco sobre saída da sede da Uber de São Paulo

Ida de vereadores da capital paulista a prédio da empresa na cidade vizinha causa queixas

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São Paulo

Após diligências de vereadores de São Paulo na sede da Uber em Osasco, o prefeito Rogério Lins (Podemos) telefonou para o chefe do Executivo de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), e reclamou da operação.

Na última terça-feira (29), os vereadores da capital Adilson Amadeu (União Brasil), Luana Alves (PSOL), Marlon Luz (MDB) e Sidney Cruz (Solidariedade) fizeram uma visita, de forma surpresa, à sede da Uber, em Osasco, e a um centro de apoio para os motoristas na Barra Funda, zona oeste paulistana. Eles são integrantes da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos Aplicativos.

Viaturas da GCM (Guarda Civil Metropolitana) acompanharam as diligências, o que deixou o prefeito de Osasco ainda mais revoltado.

Em entrevista à Folha, Lins afirmou ter relatado para Nunes que a atuação dos vereadores foi desrespeitosa. "Torço para que São Paulo vá bem, não estamos em guerra com São Paulo. Se uma empresa de Osasco se mudar para lá, eu jamais vou tumultuar. O pessoal tem que saber perder também, né. Tem que respeitar", disse o prefeito, por telefone, na quinta-feira (31).

"Liguei para o prefeito Ricardo Nunes, entendo que não é decisão dele, mas a tratativa dos vereadores foi desrespeitosa", reclamou Lins. "Vir com viaturas da GCM de São Paulo na nossa cidade, além da presença de imprensa, numa empresa que gera empregos."

Nunes defendeu a atuação da comissão e criticou a Uber. "Lamentável a atitude da empresa, com isso a população de São Paulo e a de Osasco perdem, só ela ganha aumentando seus lucros. É importante o trabalho da CPI para apurar possível crime tributário."

Vereadores de São Paulo vão ao prédio da Uber em Osasco
Vereadores de São Paulo fazem visita, de forma surpresa, à sede da Uber em Osasco - Vitor Hugo Baqueta/Divulgação

A Câmara Municipal paulistana, por sua vez, disse que a "apuração trata de questões fiscais relacionadas à cidade de São Paulo e, portanto, os vereadores da capital têm total prerrogativa de atuação". Segundo a nota, casos semelhantes ocorreram em outras CPIs da casa.

"Onde existir interesses da cidade de São Paulo em jogo, haverá atuação dos vereadores paulistanos", disse o presidente da Câmara, Milton Leite (União Brasil).

Em nota, a Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria de Segurança Urbana, afirmou que a GCM atua em consonância com competências e atribuições estabelecidas em lei e que, em atendimento a Câmara Municipal, acompanhou os vereadores "a fim de cumprir a entrega de intimação em endereços de caráter sigiloso na região de Osasco".​

O objetivo da visita, de acordo com o vereador Adilson Amadeu, era investigar uma possível evasão fiscal das empresas de aplicativos que se transferiram para cidades da região metropolitana, mas continuam prestando o serviço na capital.

Em Osasco, a alíquota de ISS (Imposto Sobre Serviço) é de 2%, contra a de 5% que era paga pela empresa em São Paulo.

"Imagina se virar moda, vereadores de Osasco irem fiscalizar empresas em São Paulo. Existe um questionamento jurídico, inclusive", disse Lins. "A Uber é só mais uma delas [a mudar para cidade], assim como a 99, o Mercado Livre, o Ifood, a Rappi, a B2W Digital. Grandes empresas escolheram a nossa cidade não à toa, fazem estudos."

De acordo com dados fornecidos pela Uber à CPI em novembro do ano passado, a empresa pagou ao município de São Paulo R$ 584 milhões entre 2014 e 2020 de ISS.

Com quase 550 mil motoristas cadastrados em São Paulo, a empresa transferiu no ano passado a sua sede, batizada de Uber Campus, para Osasco e começou a pagar ISS naquela cidade.

Ao ser questionado se há uma possível vantagem tributária às empresas em Osasco, Lins afirmou que a cidade tem se preparado há, pelo menos, seis anos para receber investimentos e empreendedores.

"Osasco tem projetos para atrair empresas, e não só a Uber. Hoje, 25% das empresas unicórnios [nome dado a startups cujos valores de mercado ultrapassam US$ 1 bilhão] no Brasil escolheram Osasco como sede. Somos número um no Brasil em geração de empregos. Defendo o investidor da nossa cidade", afirmou o prefeito.

Outros pontos atraentes, segundo Lins, são a infraestrutura, a localização estratégica do município na Grande São Paulo e facilidades de acesso como rodovias, marginais e estação de trem.

A gestão Nunes não quis comentar as questões tributárias da Uber em razão de sigilo fiscal. Em um comunicado à reportagem, a Secretaria Municipal da Fazenda disse que, em novembro do ano passado, o prefeito paulistano sancionou uma lei que reduziu a alíquota de 5% para 2% cobrada das empresas de intermediação, via plataforma digital, como incentivo à permanência dessas marcas na capital.

Logo após a operação dos vereadores no prédio da Uber, a Câmara Municipal de Osasco retratou a atuação dos paulistanos como uma interferência na fiscalização de empresas no município.

Durante a sessão, o vereador Ribamar Silva (PSD), presidente da casa, manifestou repúdio à ação e falou em tomar providências legais contra os paulistanos. "Eles estão meio revoltados porque a Uber saiu de São Paulo e veio para Osasco, como a 99 e outras empresas, em função do diálogo que têm com Executivo, o Legislativo", discursou.

No dia seguinte foi a vez de Amadeu, presidente da CPI dos Aplicativos, rebater e garantir que a visita da comissão à empresa está amparada juridicamente.

Para ele, uma empresa que presta serviços na cidade de São Paulo e opta por fazer toda a sua contribuição tributária em terras vizinhas, baseada em incentivos tributários, tem de responder pelos seus atos e indícios de evasão fiscal.

"Ficamos surpresos que o prefeito Rogério Lins e demais vereadores ligaram até para o prefeito Ricardo Nunes. Disseram que fomos com um pelotão de pessoas, atrapalhando o trânsito. Nada disso aconteceu. Muito pelo contrário, tivemos acompanhamento da GCM, dos assessores dessa casa, do pessoal da secretaria da Fazenda", disse o vereador.

"Nos comportamos da maneira que deveria ser. Pedimos apenas para nos indicar onde fica a empresa, que na verdade é uma empresa fantasma em Osasco. Tem muitas cadeiras, mais de 500, mas 20 pessoas trabalhando lá."

Amadeu, que tem base eleitoral entre os taxistas, afirmou ainda que continuará "aprofundando as investigações".

Em nota, a Uber afirmou que está à disposição dos vereadores para esclarecer eventuais dúvidas da comissão.

A empresa disse, ainda, que "desde que chegou ao país, mais de R$ 68 bilhões foram repassados pela Uber aos parceiros que geram renda pela plataforma e, somente em São Paulo, mais de R$ 1 bilhão foram pagos em taxas e tributos".

A Uber também afirmou que a sede de 33 mil metros quadrados em Osasco deverá ser inaugurada até o final deste ano e acrescentou que, neste momento, opera com o modelo de trabalho híbrido e que conta, temporariamente, com um prédio alugado.

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