Falha nas linhas 8 e 9 de trens pode causar mortes, diz Ministério Público

Problemas em equipamento já provocaram descarrilamentos e podem levar a colisões, disse maquinista em depoimento

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São Paulo

Uma das falhas que levaram ao descarrilamento de trens das linhas 8-diamante e 9-esmeralda, concedidas à ViaMobilidade no ano passado, poderia levar a colisões entre vagões e acidentes com mortes, segundo apuração do Ministério Público de São Paulo (MPSP).

No mês passado, com base no depoimento de um maquinista que operou trens a serviço da concessionária e relatou falhas, a Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social pediu à Secretaria Estadual de Transportes Metropolitanos e a uma comissão da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) medidas para verificar a ocorrência de problemas e monitorar o risco de acidentes.

O promotor Silvio Marques, responsável pelo inquérito que apura as falhas nas linhas da ViaMobilidade, também enviou um ofício à Polícia Civil pedindo, com urgência, a abertura de uma investigação sobre a possibilidade de a concessionária ter praticado crime contra a segurança dos passageiros, com base na "possibilidade de descarrilamento e mortes de pessoas".

A estação Amador Bueno, da linha 8-diamante, que foi concedida à ViaMobilidade; falhas aumentaram - Rivaldo Gomes - 2.mar.2022/Folhapress

A falha mais grave relatada pelo maquinista ocorre em um equipamento chamado chave de transposição (ou AMV, sigla para aparelho de mudança de via). O AMV é responsável por direcionar os trens ao trilho correto, mudando de posição conforme o acionamento de operadores do sistema ferroviário. O desalinhamento ou posicionamento incorreto pode provocar um descarrilamento ou direcionar uma composição para um trilho na contramão, por exemplo.

O maquinista, cuja identidade foi protegida pelo Ministério Público, operou trens pela ViaMobilidade de janeiro a outubro do ano passado na linha 8-diamante. Ele relatou que, em ao menos oito ocasiões, foi necessário transportar passageiros de um trem para outro por causa de falhas nos próprios trens ou em um AMV.

"Hipoteticamente, se a chave AMV oscilar indevidamente e um trem descarrilar em velocidade normal de 70km/h e outro trem vier em sentido contrário, pode haver colisão com resultados gravíssimos", diz um trecho do depoimento do maquinista.

Esse teria sido o caso, segundo o funcionário, de um descarrilamento na estação Júlio Prestes no dia 7 de dezembro. A operação só foi normalizada depois de sete horas, após o trem descarrilado ser enviado ao pátio de manutenção.

O maquinista disse ao Ministério Público que uma falha no AMV fez com que o aparelho ficasse oscilando, abrindo e fechando sem interferência humana e sem responder aos comandos do Centro de Controle Operacional. Afirmou, ainda, que esses problemas se tornaram frequentes por falta de manutenção.

"Em síntese, os serviços de manutenção não eram e não são realizados continuamente, com regularidade, mas quando ocorriam e ocorrem os problemas. Portanto, havia apenas manutenção corretiva, e não preventiva", disse. "O próprio declarante e outros maquinistas eram obrigados a auxiliar o pessoal da ViaMobilidade no reparo de trens, quando ocorria alguma quebra ou falha."

No depoimento, ele afirma que a falta de vigilância nas ferrovias também provoca acidentes. Em agosto, ele conta, um homem teria colocado uma barra de ferro em um AMV próximo à estação General Miguel Costa, em Osasco. Os seguranças não se deram conta do problema, e o vagão de um trem que seguia em direção à Júlio Prestes descarrilou.

Tanto o maquinista quanto um passageiro frequente da linha 8-diamante, que também prestou depoimento ao MP, relataram uma série de outros problemas na operação da linha. Eles citam falhas na rede aérea de abastecimento de energia dos trens, equipamentos de ar-condicionado quebrados, falta de limpeza e sanfonas entre os vagões furadas —o que faz com que a água da chuva entre nas composições, provocando problemas de energia.

"Há medidas em andamento, e espero que até o final do mês a gente tenha uma resposta técnica sobre essas falhas", disse o promotor Silvio Marques.

Segundo Marques, já há elementos suficientes para pedir a caducidade do contrato com a ViaMobilidade. No mês passado, a Secretaria de Transportes Metropolitanos informou o MPSP que abriu um processo administrativo para analisar o pedido de rescisão contratual. Um comitê jurídico deve ser montado pela secretaria para fazer uma apuração preliminar do caso e sugerir providências jurídicas.

A instauração do processo é o primeiro passo para um eventual rompimento do contrato. A empresa, em novembro, afirmou que não assinaria um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) sobre a questão.

Questionada sobre os relatos de falhas nos AMV, a ViaMobilidade afirmou, em nota, que não teve acesso ao processo e, por isso, não poderia comentar o depoimento.

"A concessionária ViaMobilidade informa que não lhe tem sido permitido acesso aos autos do procedimento e, por isso, não tem condições de se manifestar sobre tais documentos", disse a empresa. "De todo modo, esclarece que segue envidando todos os esforços na recuperação da infraestrutura e no aprimoramento operacional das linhas 8 e 9, e tais melhorias já podem ser percebidas pelos usuários."

O inquérito que investiga as falhas da concessionária é público.

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