Descrição de chapéu violência

PMs matam ajudante de pedreiro e atiram em cachorro em Santos, relatam familiares

Parente diz que policiais não usavam câmeras e que ainda não teve acesso ao boletim de ocorrência; OUTRO LADO: Segurança diz que mortes em operação ocorreram em confronto

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Guarujá (SP) e São Paulo

O ajudante de pedreiro Layrton Fernandes da Cruz Vieira de Oliveira, 22, foi morto a tiros quando ainda estava na cama, na casa de um amigo no bairro Jabaquara, em Santos, por volta das 8h40 de terça-feira (1º). Segundo familiares, ele foi baleado por policiais do Baep (Batalhão de Ações Especiais da PM), que também mataram a tiros o cachorro da casa.

A ação ocorreu em meio a uma megaoperação em resposta à morte de um soldado da Rota. Segundo o Governo de São Paulo, 16 suspeitos morreram desde a última sexta (28) na ação, a mais violenta da PM paulista desde o massacre do Carandiru, em 1992.

Procurada, a Secretaria da Segurança Pública afirmou que "as forças de segurança atuam em absoluta observância à legislação vigente" e que todas as ocorrências com morte na operação "resultaram da ação dos criminosos que optam pelo confronto". Segundo a pasta, os casos serão investigados pela Divisão Especializada de Investigações Criminais de Santos e pela Polícia Militar.

Ajudante de pedreiro Layrton Fernandes da Cruz Vieira de Oliveira, 22, morto pela polícia em Santos - Leitor

Familiares contaram que cinco viaturas estacionaram a duas quadras de distância da casa, que fica na rua Maria dos Santos Dias, e mais de dez PMs armados seguiram em grupo pela via.

O amigo de Oliveira e sua mulher, que moram ali, assustaram-se com a aproximação da Polícia Militar e saíram correndo, segundo os relatos.

Policiais teriam entrado logo em seguida no barraco onde dormia o ajudante de pedreiro. O cachorro avançou contra um dos PMs e foi morto com um tiro na região do pescoço. Oliveira foi baleado logo em seguida.

Durante a fuga, o amigo do ajudante e dono da casa encontrou a mãe da vítima. Tiros foram ouvidos logo em seguida.

A mãe de Oliveira correu em direção à casa pouco depois, procurando pelo filho. Ela disse que foi barrada por um policial, que a chamou de louca e ordenou que saísse dali e tirasse uma criança que estava na rua, se não iria "meter bala".

O local ficou isolado, com o corpo dentro do barraco, das 8h40 até por volta das 19h, para exame da perícia. A família protestou para que pudesse ver o corpo, e policiais teriam ameaçado jogar bombas de efeito moral para dispersar os moradores.

Na manhã desta quarta (2), o barraco ainda estava com sangue por todo o chão. Ao menos três marcas de tiro marcavam as paredes.

Uma pessoa da família da vítima disse que os policiais do Baep não usavam câmeras corporais. A família ainda não teve acesso ao boletim de ocorrência.

O ajudante era amigo desde a infância do dono do barraco onde foi morto, com quem jogava futebol e videogame. Segundo um tio, ele ganhava a vida fazendo bicos carregando sacos de areia e materiais de construção em Santos.

Garçom e homem identificado como indigente estão entre os mortos

O caso do ajudante de pedreiro Layrton se soma a outros relatos de moradores que denunciam excessos na operação Escudo com a morte de inocentes nas periferias da Baixada Santista. Nesta quarta, manifestantes de Guarujá cobraram o fim da ação e a classificaram de chacina e genocídio.

Na segunda, um homem identificado como indigente em um boletim de ocorrência foi morto por policiais militares com tiros de fuzil e pistola no bairro Sítio Conceiçãozinha, em Guarujá. Na delegacia, policiais disseram que o homem teria atirado contra eles.

A reportagem enviou os detalhes do caso à SSP, que respondeu por email com o áudio de uma entrevista coletiva do governador realizada na tarde desta terça. A secretaria não se pronunciou sobre o uso do termo indigente no boletim de ocorrência. Outras mortes na região foram classificadas com os termos "desconhecido", "não identificado" e "cadáver sem identificação".

Além dele, um morador de rua foi morto e outro está desaparecido após uma ação da PM na tarde do último domingo (30) na comunidade do Pantanal, na Vila Baiana, segundo relato de oito pessoas ouvidas pela reportagem.

Manifestantes levantam faixa que diz: Ser pobre não é crime. Parem de nos matar
Ato em Guarujá nesta quarta (2) em repúdio às mortes causadas por ação da PM durante a operação Escudo na Baixada Santista - Danilo Verpa/Folhapress

Outro relato é o da família do garçom Filipe do Nascimento, 22, que afirmou que ele foi assassinado por policiais militares após ser retirado do barraco onde morava em Morrinhos 4, favela de Guarujá.

O corpo foi entregue ao IML (Instituto Médico-Legal) sem identificação e reconhecido pela esposa na manhã desta quarta (2).

A mulher do garçom relatou ter ouvido das filhas, de 7 e 9 anos, que Nascimento estava dentro de casa por volta das 20h de segunda-feira quando um PM abriu a porta, perguntou se ele tinha "coisas erradas" guardadas em casa e se usava drogas. As filhas disseram que não e, também, que ele foi levado por policiais para fora de casa.

Moradores afirmaram à mulher de Nascimento que viram um homem negro e alto usando um casaco preto da Lacoste ser levado para um barraco de madeira por policiais. Relataram ter ouvido três tiros.

A esposa de Nascimento estava fora de casa, e a rua foi bloqueada sem que ela pudesse voltar para o barraco. A mulher afirmou que viu a própria bicicleta ser jogada no mato por um PM. Ela disse que questionou o policial, afirmando que a bicicleta era dela, e ouviu que não deveria estar na rua.

Nascimento, que nasceu em Palmares, em Pernambuco, estava casado havia um ano e dois meses. Ele trabalhava em uma barraca na praia das Astúrias. O dono da barraca, seu chefe, acompanhava a viúva.

Um boletim de ocorrência registrado na delegacia de Guarujá aponta que três policiais andavam de um lado de uma rua de Morrinhos e dois de outro. Um PM afirmou em depoimento que, próximo a uma escada da favela, um homem teria saído de um barraco e disparado quatro tiros contra os policiais.

Ele disse ter dado tiros de fuzil em direção ao agressor, que caiu. O policial afirmou, segundo o documento, que em seguida viu um homem saindo pela janela de um barraco e que os agentes o perseguiram e trocaram tiros com ele em outro local.

A esposa de Nascimento disse que foi à delegacia e deu o nome do marido, mas ouviu que ele não havia sido morto pela polícia. Ela afirmou ter ouvido também que havia um morto sem identificação na operação em Morrinhos e que deveria procurá-lo no IML de Praia Grande –o único que tem feito necrópsias em toda a Baixada Santista. Após ela ter encontrado o corpo, ele foi liberado na manhã desta quarta.

Governo vem negando abusos na operação

Diante de denúncias de possíveis abusos cometidos por agentes de segurança em comunidades de Guarujá e Santos, Tarcísio de Freitas (Republicanos) vem negando excessos e defendendo a atuação da PM. "Não existe combate ao crime organizado sem efeito colateral", disse Tarcísio na terça (1º).

Em entrevista coletiva, o governador afirmou que a gestão tem sido transparente na condução da operação e que as imagens das câmeras corporais dos agentes serão utilizadas para investigar eventuais abusos. "A gente não vai se furtar a investigar nada. Se houver excesso, se houver falha, nos vamos punir os responsáveis."

Nesta quarta, em Brasília, o secretário da Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, voltou a rechaçar a hipótese de ter havido tortura ou que pessoas tenham sido executadas na operação.

"Não passa de narrativa. Eu não estou querendo politizar ou polemizar, estou respondendo. Essas narrativas de que houve tortura, de que foram executados. Todos os exames do Instituto Médico-Legal, as necropsias não apontam nenhum sinal de violência, muito menos de tortura", afirmou Derrite.

"É um documento oficial. Então, senhores, o que existe é pela primeira vez no estado de São Paulo um governador que tem coragem de enfrentar o crime organizado", continuou o secretário em sessão da CPI do MST na Câmara dos Deputados.

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