Descrição de chapéu violência

Moradores de rua se queixam de falta de banheiros públicos no centro de São Paulo

Subprefeito da Sé diz que empresas que não querem associar seus nomes a esse tipo de estrutura

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

João Ribeiro, 74, foi sargento da Marinha e diz ter trabalhado até em submarino. Nascido em Portugal, há quatro anos vive nas ruas de São Paulo. Próximo da entrada do Poupatempo Sé, sentado no muro do posto policial ali em frente, ele diz que um dos principais problemas que enfrenta é a falta de banheiro.

"Não tem banheiro público por aqui, não tem um lugar para ir à noite", afirma Ribeiro, revoltado. "É uma calamidade, o que temos é a rua."

Depois que a estrutura de emergência criada durante a pandemia de Covid-19 foi desmontada, não existem hoje banheiros públicos que funcionem 24 horas no centro, a não ser os de Centros de Atenção Psicossocial (Caps), das Unidades de Pronto Atendimento (UPA) e de alguns centros de acolhida.

Entrada do banheiro público da estação parque Dom Pedro 2º, muito usado por muitos moradores de rua no Centro de São Paulo
Banheiro público da estação parque Dom Pedro 2º, muito usado por muitos moradores de rua no Centro de São Paulo - Zanone Fraissat/Folhapress

Quem não encontra vagas ou não se adapta aos albergues dispõe de um único banheiro na região da Sé na madrugada. É o do terminal Parque Dom Pedro 2º, exatamente o que João Ribeiro costuma usar.

Há também um pequeno banheiro provisório que deveria servir aos skatistas, mas frequentemente fica interditado, no vale do Anhangabaú, atualmente sob concessão do consórcio Viva o Vale.

O problema se agravou depois que o Metrô fechou o banheiro localizado antes das catracas na estação Sé, em fevereiro de 2020. Na ocasião, a empresa afirmou que o lugar era alvo frequente de vandalismo e da ação de traficantes.

Desde 2022, percebe-se que o fechamento dessa instalação levou a população de rua à buscar logo pela manhã o banheiro do Poupatempo, que abre às 7h. Hoje, é o preferido de moradores de rua para cuidarem da higiene nas primeiras horas do dia.

A partir das 9h, outro banheiro público começa a funcionar, o da Biblioteca Mario de Andrade, que ficava aberto 24 horas entre 2015 e 2017. Há mais um banheiro estratégico na região, que é o do Ministério da Economia, na avenida Prestes Maia.

Nas suas andanças pelo centro, o ex-comerciário Eduardo Gonçalves, 56, é um usuário do banheiro do Poupatempo, que costuma estar limpo. "A falta de banheiro é um problema sério para a gente, eu não durmo na rua, alugo um quartinho, mas passo por dificuldades quando estou no centro", afirma ele, que estava em uma fila para receber doação de alimentos na rua do Carmo. "O prefeito acha que a gente é menos do que barata."

Para o padre Julio Lancellotti, da paróquia de São Miguel Arcanjo, na Mooca, o problema da higiene dos moradores de rua se estende muito além do uso do banheiro e da falta dessas instalações públicas. Banhos e lavagem de roupas são necessidades constantes, assim como água potável. Mesmo em albergues, onde as pessoas têm acesso à água, segundo ele, frequentemente faltam sabonetes, que estão entre os itens distribuídos na sua paróquia.

"Toda questão ligada à higiene é inacessível ao povo das ruas, o que inclui corte de cabelo, lâmina de barbear, absorventes, água potável, possibilidade de lavar roupas e até cuidado com os pés", afirma. "Não há uma resposta do poder público, que ignora as necessidades dessa população."

Pela lei 15.918/2013, a prefeitura tem a obrigação de instalar banheiros públicos na cidade. O subprefeito da Sé, coronel Alvaro Camilo, diz que o tema está sendo estudado.

"O que acontece com banheiro público é vandalismo, uso inadequado e consumo e tráfico de drogas. É muito difícil. As pessoas não têm sentimento de pertencimento e não cuidam do espaço adequadamente", afirma. "O que sabemos é que a solução passa por um banheiro modular, com pouca possibilidade de destruição."

Nenhum projeto de banheiro público na cidade tem saído do papel nos últimos anos. Em 2018, o então prefeito João Doria pretendia instalar 600 cabines metálicas diretamente ligadas à rede de esgoto espalhadas pela cidade. Uma delas, em fase de teste, chegou a funcionar na praça Dom José Gaspar, mas a iniciativa acabou suspensa pela Justiça.

Mais recentemente, em abril de 2022, uma licitação para instalação de equipamentos foi cancelada por falta de interessados. "A gente fez um concurso com proposta de pagamento com patrocínio, com publicidade, mas foi considerado deserto", diz o subprefeito. "Aqui no Brasil as pessoas não querem associar o nome de sua empresa a banheiros públicos, não há interesse do mercado."

Diante disso, Camilo diz que a prefeitura pode partir para uma solução solo, sem a iniciativa privada.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.