Aprender e ensinar eram mais do que o ofício da professora Alayde Montechi Valladares de Oliveira. Ela fez da sabedoria a base dos 15 anos nos quais lecionou e de quase toda uma vida dedicada à criação dos seis filhos e, mais recentemente, do convívio com os três netos.
Leitora assídua de jornais, sentiu-se afrontada quando o ocupante do cargo mais importante do país ignorou a ciência e duvidou da importância do isolamento e das vacinas para enfrentar uma crise sanitária histórica como a da Covid-19.
Com a idade avançada, os olhos perderam precisão e alcance. Precisou do auxílio de uma lupa para continuar acompanhando nas páginas da Folha o desenrolar da pandemia.
Isolada em casa, como recomendavam autoridades em saúde, achou um jeito mais leve de conversar com os filhos sobre o que estava acontecendo no país e, claro, de criticar a postura do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Tomou emprestada a melodia do antigo reclame de televisão para compor a música que passou a cantar todas as noites, ao telefone, para cada um dos filhos.
"Já é hora de dormir / Não espere mamãe mandar / Um bom sono pra você / Um alegre despertar / Não saia de casa / Não deixe o vírus entrar / Xô, Bolsonaro! / Fora!", dizia a paródia do comercial dos cobertores Parahyba.
O gosto pela música vinha de longe, dos tempos em que se apresentava nos palcos de Três Lagoas, a cidade em Mato Grosso do Sul onde nasceu em 8 de julho de 1925 e morou nos primeiros 30 anos de vida. Lá tocava tambor nas fanfarras.
Histórias da mocidade, da vida adulta e da maturidade estão bem guardadas nas mil páginas de muitos cadernos nos quais escreveu à mão.
"E escrevia muito, até mesmo como exercício mental, mesmo com dificuldade motora e visual, até o último dia da vida estava contando suas histórias", recorda o filho, o jornalista Ricardo Valladares, 57.
As memórias serão editadas e publicadas em um livro pela família, conta o filho.
Ele afirma, no entanto, que a grande obra da mãe é a família formada ao lado do marido, José Valladares de Oliveira, morto em 1992.
São os filhos Carlos, Eduardo, Lucia, Edi, Silvana e Ricardo, assim como os netos, Carol, Helena e João, os capítulos mais importantes do livro da professora Alayde.
Premiada por confiar na ciência, Alayde passou pela pandemia e pôde aproveitar quase um ano inteiro de convívio com a família.
Morreu aos 98 anos no apartamento onde morava em São Paulo, enquanto dormia, em 18 de novembro.
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