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Superlotação e falta de água e de alimentos: moradores da periferia de Porto Alegre relatam dificuldades

Bairros são abastecidos por caminhões-pipa, e supermercados estão vazios

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Ariane Costa Gomes
São Paulo | Espaço do Povo

O Morro da Cruz, na zona leste de Porto Alegre, não foi atingido pelas enchentes, mas o cotidiano de cerca de 35 mil pessoas mudou bastante desde as inundações. Moradores relatam superlotação nas casas e dificuldades no acesso a água potável e alimentos.

Morando com a esposa, dois filhos, a sogra e o cunhado numa casa de quatro cômodos, o pastor Sandro Pedroso, 38, diz conviver com o sentimento de incerteza sobre o futuro e torce para as águas baixarem para poder retomar a vida. No início do mês, ele e a família saíram do bairro Mathias Velho, em Canoas, na região metropolitana, após alerta de alagamento, e foram de carro até a casa da sogra no Morro da Cruz.

Líder comunitário e membro do G10 Favelas, Michel Couto, 38, resume o novo cotidiano de moradores nesses bairros.

"Tu tem um lar em que moravam cinco e da noite para o dia ficam 15 pessoas morando sob o mesmo teto. As famílias que recebem essas pessoas de fora têm bastante dificuldade de alimento e também falta água."

Vila Vicentina, na região metropolitana de Porto Alegre - Pedro Ladeira - 21.mai.2024/Folhapress

Além de falar sobre a necessidade de investimentos em infraestrutura, ele ressalta a importância de ações direcionadas à saúde mental dos moradores das periferias. "É preciso uma rede de acolhimento psicológico profissional. É algo que impacta diretamente a saúde emocional de quem está recebendo pessoas que vêm com relatos da enchente", diz.

O pastor Sandro e uma equipe de 30 voluntários realizam atendimento, todos os dias, na sede da Comunidade Nova Canaã.

"Algumas pessoas não precisam só da ajuda física, que é o alimento, a roupa. Mas de um abraço, um aperto de mão, uma oração. Pessoas que tinham um pouco a mais perderam tudo. Quem já não tinha, ficou sem nada. É algo muito difícil de lidar", afirma.

O racionamento de água potável também dificulta ações rotineiras. "A água vinha e depois ficava dois, três dias sem. Tinha de manhã e depois faltava o dia inteiro. Nos mercados conseguimos encontrar alimentos, mas não água potável para beber", lembra a profissional de marketing, Ananda Santos, 24.

O Dmae (Departamento Municipal de Água e Esgoto) afirma que o sistema está com intermitência, mas que todas as zonas periféricas foram abastecidas com caminhões-pipa.

Envolvidos na arrecadação e distribuição das doações, Michel e Sandro contam que o apoio está sendo direcionado às pessoas desabrigadas e aos moradores.

"Na sexta [17] não abrimos [a igreja] pela manhã porque não tinha mais alimento. Todos os kits tinham sido entregues", diz Sandro.

"Atendemos uma família de Canoas que chegou na igreja em busca de itens de higiene pessoal, roupas, alimento. Fornecemos o que conseguimos. Fui até a casa deles e me deparei com 29 pessoas em uma casa de dois cômodos dependendo exclusivamente de doações", conta.

Muitos voluntários trabalham de forma autônoma e estão sem condições de voltar à atividade. "O problema social se agravou e essas pessoas também precisam ser assistidas", afirma Michel.

A Prefeitura de Porto Alegre anunciou na terça-feira (21) novas medidas em prol das famílias atingidas pela enchente, entre elas reajuste no valor do Estadia Solidária e flexibilização nas normas de acesso ao bônus-moradia.

Em nota, a Secretaria Nacional de Periferias do Ministério das Cidades disse que iniciativas cruciais para prevenir desastres e preservar vidas foram descontinuadas entre 2019 e 2022 e que o governo anterior não realizou seleções para novas obras de contenção de encostas e drenagem, nem para novos projetos do Minha Casa, Minha Vida voltado a famílias com renda mensal de até R$ 2.640, que costumam ser "as mais atingidas quando há catástrofes provocadas por desastres naturais".

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