Descrição de chapéu acidente aéreo

Calor em modelo de avião da Voepass é comum mesmo sem falha, dizem especialistas

ATR depende de motor externo, nem sempre disponível, para resfriar ar com eficiência, dizem especialistas

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São Paulo

A queda do avião que matou que provocou a morte de 62 pessoas no interior de São Paulo na última sexta-feira (9) trouxe à tona vídeos e reclamações de passageiros sobre as altas temperaturas no interior da aeronave operada pela companhia Voepass.

Apesar de desconfortável, o aquecimento da seção de passageiros enquanto aviões desse tipo estão em solo é frequente e na maioria das vezes não possui relação com falhas, dizem pilotos consultados pela Folha.

Em solo, aeronaves modelo ATR 72-500, como o que caiu na cidade de Vinhedo, dependem de uma fonte externa de eletricidade para que seu sistema de refrigeração de ar funcione plenamente. Aeroportos fora dos grandes centros urbanos do país nem sempre possuem esse tipo de esquipamento.

Avião com duas hélices nas cores branco e amarelo na pista
Avião modelo ATR operado pela Voepass - Divulgação/Voepass

Quando essa situação ocorre em uma região com clima quente e o tempo de permanência na pista é relativamente grande –superior a 1 hora, por exemplo–, o calor no interior causa incômodo, diz o piloto Rafael Bessa.

Piloto de diferentes modelos na aviação comercial, entre eles o ATR, Bessa diz que esse tipo de situação é menos comum em aviões a jato, como os modelos Airbus A320 e Boing 737.

Enquanto o turboélice da fabricante fanco-italiano ATR depende da rotação de um dos seus dois motores para gerar energia sem precisar recorrer a uma fonte externa, os modelos a jato possuem na parte traseira uma unidade auxiliar de energia. O equipamento é comumente chamado pela sigla em inglês APU (Auxiliary Power Unit).

A diferença entre os sistemas também provoca relativa demora no resfriamento do ar no interior do ATR durante a primeira hora de voo, diz Bessa. "É uma situação comum em operações em regiões quentes", diz.

Um dos vídeos que levantam esse debate foi gravado pela jornalista e escritora Daniela Arbex, que o publicou em uma rede social. A imagem mostra pessoas se abanando com a aeronave em voo. Ela conta que o avião que caiu é o mesmo em que ela havia voado. A postagem tem diversos relatos de passageiros reclamando das condições ruins do equipamento.

Existe, porém, uma relação entre o sistema de ar-condicionado e o acionamento do sistema antigelo das aeronaves mais comuns na aviação civil mundial. Ambos funcionam com ar comprimido residual, ou seja, aquele que sobra além do necessário para o funcionamento do motor.

Esse mecanismo é chamado de sangria de ar e é utilizado também para manter o avião pressurizado e para o acionamento de outros sistemas pneumáticos, segundo o piloto Henrique Hacklaender, presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas.

Informações meteorológicas do momento da tragédia e um acidente semelhante ocorrido há três décadas nos Estados Unidos levantam suspeitas sobre a formação de gelo nas asas da aeronave.

No ATR, o bordo de ataque –parte frontal da asa– utiliza "ar sangrado" para inflar e quebrar o gelo acumulado nas asas. O sistema é necessário porque o gelo altera a aerodinâmica e pode levar à perda de sustentação. Em aviões à jato, o gelo é derretido pelo aquecimento da asa. Mas nos dois casos o acionamento é pneumático, ou seja, utiliza ar pressurizado.

Apesar de obter ar da mesma fonte, sistemas de ar-condicionado e antigelo funcionam por meio de diferentes componentes. Uma eventual falha parcial na refrigeração do ar, algo que não é raro, não significa necessariamente um defeito em todo o sistema de sangria, diz Hacklaender. "Certamente muitas pessoas já voaram nessas condições", diz.

O ATR 72-500 é um avião preparado para voar na faixa dos 20 mil pés (cerca de 6.000 metros), onde há formação de nuvens e umidade, tornando o ambiente suscetível à formação de gelo, dizem os pilotos.

O avião que caiu em Vinhedo apresentou ao menos duas falhas importantes e ficou alguns períodos sem voar para manutenção nos meses que antecederam a tragédia. Especialistas ouvidos pela Folha dizem, no entanto, que eventos assim são frequentes na aviação e podem não ter qualquer relação com o acidente.

Em 11 de março, o modelo ATR 72-500 da Voepass apresentou mau funcionamento do sistema hidráulico. Na aviação, esse tipo de sistema é utilizado para transmitir força para acionamento de componentes, como freios, mas não é o único recurso utilizado para este fim.

O registro do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) mostra que após decolar no Aeroporto dos Guararapes, em Recife (PE), com destino a Salvador (BA), já durante a fase de voo de cruzeiro, o painel de controle apresentou uma "mensagem de baixo nível de óleo hidráulico". A tripulação fez os "procedimentos previstos em manual" para tratar o problema, diz o histórico do incidente.

No mesmo voo, ao pousar em Salvador, a aeronave teve um "contato anormal" com a pista. O relatório não entra em detalhes sobre como foi esse contato anormal nem se houve danos à aeronave. Passageiros e tripulantes não se feriram. A ocorrência foi registrada às 21h04 daquele dia.

Pessoas que trabalham no setor aeronáutico disseram à Folha que, na ocasião, houve um toque da cauda no solo e que o avião chegou a sair da pista.

Roberto Peterka, piloto aposentado da Força Aérea Brasileira e perito em investigações sobre acidentes aéreos, explica que um problema com óleo hidráulico não afeta componentes relacionados à principal hipótese para as causas do acidente da Voepass.

O Cenipa concluiu nesta segunda (12) a primeira etapa da investigação em campo e manteve a previsão de divulgar em 30 dias o relatório preliminar do caso. Isso não significa que uma resposta definitiva será apresentada neste prazo.

Procurada pela reportagem, a Voepassa disse que a aeronave foi autorizada a voltar a voar após ter sido reparada.

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