Descrição de chapéu Educação a distância

Mais de 60% dos alunos de EaD saem de escolas públicas

Mensalidades menores e flexibilidade de horários de estudo atraem estudantes que também trabalham

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São Paulo

​ O aluno brasileiro da educação a distância é mais velho do que seus pares do ensino presencial e divide seu tempo entre os estudos e o trabalho, na maioria.

De acordo com o censo da Abed (Associação Brasileira de Educação a Distância), 77,8% dos alunos de cursos EaD regulamentados têm entre 26 e 40 anos. Apenas 3,9% estão abaixo dos 20 anos. 

Já no censo do ensino superior do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), que leva em conta tanto o ensino presencial quanto a distância, 51,5% dos estudantes começam a graduação até os 24 anos. Apenas 31,8% se matriculam entre os 25 e os 40 anos.

"O sonho do jovem é fazer o curso presencial, porque ele quer a vivência universitária", diz João Vianney, sócio da consultoria educacional Hoper e especialista em educação remota. 

"Mas depois ele encontra a realidade, casa, tem filho, precisa trabalhar, aí vai ver o que consegue fazer, e a educação a distância vai ao encontro disso", completa. 

 

Segundo dados do grupo educacional Laureate, dono das faculdades Anhembi Morumbi e FMU, entre outras, 69% dos estudantes da modalidade trabalham e 79% pagam suas próprias mensalidades. 

A idade do aluno da educação remota, porém, está caindo. Segundo Vianney, há duas décadas a média do estudante em graduação digital era de 42 anos. Hoje, 47,7% dos alunos têm entre 26 e 30 anos. 

Para ele, a crise econômica é uma das causas dessa transferência entre modalidades.

De acordo com o censo da Abed, 34,5% dos alunos de cursos virtuais têm renda familiar entre dois e quatro salários mínimos, enquanto outros 30,1% têm renda ainda menor, de até dois salários mínimos, ou R$ 1.874.

Estudante do terceiro semestre de pedagogia EaD da Uninove, Carolina Ferreira, 31, chegou a fazer aulas presenciais em 2014, mas, por problemas pessoais, precisou abandonar o curso. 

Com uma filha de 3 anos e renda de dois salários mínimos, ela encontrou na graduação remota uma forma de voltar a estudar.

"No meu caso, tem sido válido, mas, se eu pudesse, terminaria a faculdade de forma presencial, porque na EaD você fica longe dos professores e dos seus colegas, tem que correr atrás de tudo sozinha", diz.

Também de acordo com a pesquisa, 63,5% dos alunos de cursos a distância concluíram o ensino médio em escolas públicas, o que deve influenciar o conteúdo apresentado, afirma Stavros Xanthopoylos, diretor da Abed. 

"A instituição deve ter em mente que, na maioria dos casos, as escolas públicas preparam os alunos de uma forma menos adequada para a faculdade, então é interessante que haja disciplinas que os qualifiquem", afirma.

Depois de concluir o ensino fundamental e médio em cursos supletivos, o vendedor de tapioca Gerson Lopes de Araújo, 56, sonhava em fazer uma faculdade que ensinasse sobre agricultura e preservação da natureza, para levar o conhecimento ao quilombo onde cresceu, na Chapada Diamantina (BA).

 
Ele está no terceiro semestre de gestão ambiental na Anhembi Morumbi, a distância, e conta com o apoio do polo em Santana de Parnaíba (SP), onde vive. 
 
"Quando tive dificuldade, eles me ensinaram a ver as aulas, a recuperar o conteúdo, aí eu fui aprendendo. Depois do primeiro semestre foi ficando mais fácil", afirma. Ele vai todos os dias ao polo.

Com problemas para pagar a mensalidade, Gerson pensou em abandonar a graduação, mas um funcionário da instituição o ajudou a conseguir um estágio remunerado na prefeitura da cidade. 

"Eu venho da dificuldade, meus pais são analfabetos, meus avós eram analfabetos, eu não queria ser o próximo. Quando você estuda, as possibilidades se abrem", diz.

O censo da Abed mostra que 55,7% dos estudantes da graduação EaD são mulheres, e levantamentos dos grupos educacionais Laureate e Kroton apontam uma porcentagem ainda maior de alunas: 61% e 69%, respectivamente.

Para Stavros Xanthopoylos, diretor da Abed, a sobrecarga de atividades leva mais mulheres à EaD —estudar em casa é uma saída atraente para quem acumula trabalho e tarefas domésticas. 

Outra razão, segundo João Vianney, da consultoria Hoper, é que a graduação remota com mais alunos é pedagogia, majoritariamente cursada por mulheres.

Aluna de pedagogia na Universidade Presbiteriana Mackenzie, a professora Juliana Gregolin, 28, que é formada em Letras pela USP, optou por fazer o curso a distância para investir na docência sem precisar passar pela experiência universitária outra vez.

"Meu percurso na USP foi muito penoso, levei sete anos para me formar, sempre morei longe do campus e trabalhei ao mesmo tempo", diz. 

A estudante está no quarto semestre e gosta da graduação, mas vê diferenças entre as modalidades de ensino. "Em sala, quando o professor passa um conteúdo, o aluno reflete, rebate e um diálogo é criado. Às vezes, esse é o momento mais significativo da aula, e isso se perde no curso a distância", afirma.

A também professora Ana Luisa Felipe, 31, que é recém-formada em pedagogia pela Unip, é outra que não queria reviver o dia a dia de aulas presenciais —ela já tinha graduações em Engenharia Ambiental e Tecnologia em Saneamento Ambiental. 

Além disso, estava desempregada quando começou o curso, e a mensalidade mais baixa pesou na escolha. Ana Luisa recomenda o ensino remoto, com ressalvas. "Fica mais difícil para o professor fazer a ponte entre o conhecimento e a realidade do aluno".

Como o público da EaD está rejuvenescendo, as formações precisam acompanhar as mudanças de comportamento dos alunos, bem habituados ao ambiente digital.

Vianney explica que, por isso, há universidades se desfazendo de aulas antigas, com 50 minutos, e refazendo o material de forma segmentada. "Hoje, esse conteúdo precisa ser dividido em vídeos de sete ou oito minutos, intercalados com textos e exercícios."

O ensino segmentado já é adotado por cursos livres a distância. O administrador Moisés Lemes da Silveira, 63, faz esse tipo de aula há dez anos, para se reciclar. A última que concluiu foi sobre feedbacks, da LEO Learning Brasil. 

"Processos seletivos de empresas valorizam a experiência acadêmica, não faz diferença se o curso é a distância", afirma.

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