Candidatos a professor têm notas abaixo da média do país

Alunos de pedagogia têm desempenho pior no Enem e no Enade, diz estudo

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São Paulo

Nenhum estado brasileiro escapa de um diagnóstico negativo que ajuda a explicar a baixa qualidade da educação no país: estudantes que almejam se tornar professores têm desempenho acadêmico pior do que a média dos demais futuros profissionais.

É o que revela um novo estudo liderado por Ricardo Paes de Barros, economista-chefe do Instituto Ayrton Senna (IAS) e professor do Insper.

O trabalho busca identificar oportunidades para melhorar a educação nas 27 unidades da federação, na esteira da mudança demográfica que levará a uma brutal queda no número de alunos em idade escolar no Brasil. 

A pesquisa aponta características do sistema educacional particulares de cada estado do país, que podem variar significativamente.

Candidatos do Enem deixam local de prova na Barra Funda, zona oeste de São Paulo, após a prova; estudantes de pedagogia e licenciatura têm notas piores
Candidatos do Enem deixam local de prova na Barra Funda, zona oeste de São Paulo, após a prova; estudantes de pedagogia e licenciatura têm notas piores - 03.nov.2019 - Rubens Cavallari/Folhapress

Alguns têm problemas marcantes de infraestrutura; outros lidam com salas de aulas lotadas. Mas a deficiência educacional dos candidatos a professores é um ponto comum a todas as unidades da federação.

A conclusão de Barros e de sua equipe é embasada pelos resultados de duas provas: o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e o Enade (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes).

O primeiro é feito por aqueles que pretendem ingressar no ensino superior. Os dados revelam que, em todos os estados brasileiros, a nota de corte para ingressar em cursos de licenciaturas —que preparam para a atividade docente em áreas como português, matemática e história— é inferior à média registrada por todos os cursos universitários.

No Pará, estado onde os aspirantes ao magistério tiveram o melhor desempenho, a pontuação mínima para a entrada nas licenciaturas foi 649,3, na média, entre 2014 e 2018.

No mesmo período, a nota de corte para o conjunto dos cursos superiores foi 661,1. A distância de 11,8 pontos no estado do Norte foi a menor verificada no país.

Já a maior discrepância ocorreu em Santa Catarina, onde o ingresso nas licenciaturas exigiu um mínimo de 606,3 pontos, enquanto a entrada na média de todas as carreiras teve 674,4 de nota de corte. A diferença neste caso foi de 68,1 pontos.

No Brasil como um todo, as notas mínimas de acesso à faculdade são, respectivamente, 613,1 para licenciaturas e 662,1 para o conjunto de todos os cursos universitários. 

“Esses dados mostram que o perfil dos alunos que atraímos para o magistério se tornou um problema sério”, diz Laura Machado, especialista em educação na cátedra do Instituto Ayrton Senna no Insper.

Segundo a pesquisadora, que participou do estudo, essa realidade é preocupante porque as evidências empíricas indicam que a qualidade do professor é o fator que mais afeta a aprendizagem do aluno. “Quanto melhor for o professor, mais o aluno vai aprender.”

A pesquisa mostra que a mesma realidade do Enem tem se repetido no Enade, exame feito pelos concluintes do ensino superior. Isso indica que os anos de formação universitária não eliminam os déficits educacionais que os futuros docentes brasileiros trazem da escola básica.

As notas dos concluintes de pedagogia e das licenciaturas em 2017 foram menores do que os resultados da média dos graduandos das 44 áreas testadas naquele ano em todos os estados brasileiros.

No caso do Enade, a menor diferença ocorreu em Roraima, onde, no entanto, ambas as notas —respectivamente, 44 e 44,9— são baixas em relação à média nacional de 48,4 e 51,4.

Já a maior distância entre futuros professores e os concluintes do conjunto das áreas examinadas foi registrada em Minas Gerais, no Sudeste, onde a nota dos alunos de pedagogia e das licenciaturas foi 50,6 e a pontuação média de todos os cursos foi 55.

Segundo especialistas, o perfil de alunos que buscam o magistério é explicado pela baixa atratividade da profissão docente no país. 

A análise dos pesquisadores do IAS e do Insper indica que as causas para isso podem variar.

Há unidades da federação que lidam com problemas mais severos de ambiente hostil dentro das escolas, caso de São Paulo, onde os percentuais de professores que relatam ameaças e agressões por parte dos alunos são altos em comparação à média nacional.

Em alguns, a remuneração desponta como problema mais grave que no país como um todo. Em estados como São Paulo, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, os docentes da rede pública —que concentram os maiores percentuais de matrículas da educação básica— ganham menos que os professores de escolas particulares. 

Essa realidade difere do ocorrido na maior parte das unidades da federação, onde a relação de salários das redes pública e privada é o inverso.

O objetivo do estudo, que será apresentado nesta quinta (5) em São Paulo para representantes das secretarias de Educação estaduais, é apontar um diagnóstico detalhado para cada uma das 27 redes do Brasil.

A partir disso, a pesquisa aponta sete tópicos que podem ser alvo de decisões dos formuladores de políticas públicas em prol da melhoria da qualidade da educação.

O pano de fundo do trabalho é a chamada transição demográfica que vive o Brasil, processo em que as taxas de natalidade e mortalidade caem, resultando em uma população mais envelhecida.

Outra consequência é a queda no número de crianças e jovens e, portanto, de alunos do ensino básico, que, por sua vez levará a queda no número de professores necessários.

Segundo projeções do IAS, a quantidade de docentes no ensino básico deverá cair de 2,1 milhões em 2018 para 1,9 milhão em 2050.

 
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