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Enem vai acontecer mesmo com crise no Inep, mas futuro da prova é incógnita

Avaliação não termina na aplicação do exame, e instituto responsável por ele está em frangalhos

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Sabine Righetti
Sabine Righetti

É jornalista, doutora em política científica e pesquisadora no Labjor-Unicamp. Fundou a Agência Bori

São Paulo

Diante de dezenas de pedidos de demissão no Inep, órgão responsável pelo Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), o ministro da Educação, Milton Ribeiro, disse em suas redes sociais que a prova está mantida.

O problema é que a avaliação não termina na aplicação do exame —e o Inep está em frangalhos.

O Enem acontece em todo o país nos dias 21 e 28 deste mês. Mais de três milhões de estudantes se inscreveram para participar do exame. É um número bem menor do que os quase dez milhões de inscritos em provas passadas, mas, ainda assim, é muita gente.

Alunos chegam para prova do Enem 2020, realizada em janeiro deste ano
Alunos chegam para prova do Enem 2020, realizada em janeiro deste ano - Marlene Bergamo - 17.jan.21/Folhapress

De acordo com Ribeiro, "as provas já se encontram com a empresa aplicadora". Ele tem razão. A expectativa internamente no Inep, de fato, como diz o ministro, é que o Enem ocorra normalmente porque está tudo pronto para o exame. Mas e depois?

Nos últimos dias, dezenas de servidores da instituição responsável pela prova pediram demissão. Caso do coordenador-geral de Logística da Aplicação (do Enem e de outros exames), Hélio Júnio Rocha Morais, e do coordenador-geral de Exames para Certificação, Eduardo Carvalho Sousa. São nomes diretamente ligados ao Enem e a outras avaliações realizadas pelo Inep.

Os pedidos de exoneração de parte significativa do corpo técnico do órgão vieram acompanhados de uma série de denúncias. Os servidores alegam falta de qualificação da gestão do Inep e relatam práticas recorrentes de assédio moral.

Estamos falando, por exemplo, de entrevistas individuais intimidadoras com servidores e de tentativa de censura e de interferência no conteúdo das provas do Enem —claro, sem base em critérios técnicos.

Na prática, os servidores do órgão relatam que têm sido constrangidos a participar de ações das quais discordam. Isso levou à situação atual que a Assinep (Associação de Servidores do Inep) chamou, em nota, de "dramática".

Parte das denúncias vieram à tona em uma assembleia online realizada pela associação há duas semanas. Os pedidos de exoneração em massa tiveram início na sequência.

As acusações recaem sobre o presidente do Inep, o economista Danilo Dupas Ribeiro, apontado pelos servidores como responsável pelo desmonte no órgão. Ele foi levado ao cargo pelo atual ministro da Educação. A expectativa, agora, é que Dupas deixe o posto.

E com tudo isso tudo acontecendo dá para confiar na qualidade do Enem? Há dúvidas. Fato é que não haveria exoneração em massa se não houvesse um escândalo em todo o órgão. Mas o ministro tem razão: o exame vai acontecer.

Há anos, os resultados do Enem têm sido usados como uma espécie de "vestibular nacional". É a porta de entrada das universidades federais pelo Sisu (Sistema de Seleção Unificada), também do MEC, e integra a seleção para ingresso em universidades estaduais e privadas de todo o país.

Por causa de sua importância indiscutível, o conteúdo cobrado no Enem acaba balizando o que é ensinado nas escolas.

Originalmente, no entanto, o Exame Nacional do Ensino Médio surgiu no final da década de 1990 —no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB)— com objetivo apenas de avaliar a educação básica em sua última etapa. A proposta era fazer um raio-x inédito do ensino médio e, assim, orientar políticas públicas na área.

Isso porque o ensino médio é o pior gargalo da educação brasileira. Há décadas, entra governo, sai governo, ninguém consegue resolver. Nessa etapa da educação, os alunos perdem desempenho escolar e têm mais chance de abandonar a escola.

Já no início da gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o Enem cresceu. As notas do exame passaram a ser critério para seleção de bolsas em universidades privadas pelo programa ProUni e de financiamento estudantil pelo FIES (além, claro, da seleção na porta de ingresso do ensino superior nacional).

O Enem tem sido símbolo de fracasso da gestão atual do Ministério da Educação. No último exame, em meio à pandemia, mais da metade dos mais de cinco milhões de inscritos não compareceu à prova. O governo não se preocupou muito com isso. Ao contrário: tentou barrar, neste ano, a isenção na inscrição ao exame dos estudantes que por algum motivo faltaram na última avaliação.

Mesmo com tantos percalços, está tudo pronto para que o Enem aconteça —e o exame vai acontecer. O maior risco, agora, é a simples continuidade da administração atual do Inep.

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