Descrição de chapéu São Paulo

Professor foi deixado de lado no processo educacional, diz especialista sobre uso do ChatGPT em SP

Gestão Tarcísio de Freitas vai usar inteligência artificial para produzir aulas digitais

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

A decisão do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) de usar inteligência artificial para produzir aulas digitais no lugar de professores foi criticada por especialistas em educação e denunciada por políticos de oposição para o Ministério Público.

Eles afirmam que o uso da ferramenta ChatGPT para produzir material didático afronta a autonomia pedagógica dos professores e coloca em risco a qualidade do ensino paulista, já que não há regulamentação ou comprovação da eficácia da utilização de inteligência artificial para esse fim.

A Folha mostrou que a Secretaria de Educação, comandada por Renato Feder, decidiu que as aulas não serão mais feitas por professores curriculistas, especialistas na elaboração desse tipo de conteúdo. Esses docentes terão agora a função de avaliar as aulas geradas por inteligência artificial e realizar os ajustes necessários.

"Não é uma questão de preconceito com as ferramentas de inteligência artificial, mas de entender qual é a sua finalidade. Elas podem auxiliar em trabalhos mais objetivos. Mas não são adequadas para produções que exigem pesquisa, experiência, curadoria, conhecimento, como é o caso de uma aula", diz Bernardo Soares, pesquisador em educação e tecnologia pela Universidade de Lisboa.

Alunos do ensino médio de escola em São Paulo fazem atividade de redação em plataforma que corrige textos por inteligência artificial - Divulgação - 12.dez.23/Sergio Barzaghi/EducaçãoSP

Nesta quarta-feira (17), o governador defendeu o uso do ChatGPT e disse que "não pode deixar de usar a tecnologia por preconceito". E afirmou que nada vai substituir o papel do professor em sala de aula.

Para Soares, a medida pode até não substituir o docente pela inteligência artificial, mas retira do professor a função de elaborar o que vai ensinar.

"Os professores elaboram a aula não só porque sabem determinado conteúdo, mas porque sabem a melhor forma de ensinar, de conduzir, e conhecem as necessidades dos estudantes. Uma ferramenta de inteligência artificial não tem esse domínio porque elas não foram feitas para isso", diz o pesquisador.

Desde que Tarcísio assumiu o governo de São Paulo, uma série de medidas de digitalização do ensino foram adotadas. Além das aulas digitais, as escolas passaram a ter que usar aplicativos para correção de redação e lição de casa e até para a chamada de presença.

"É aplicativo para tudo, como se isso fosse a solução para os problemas educacionais. O professor cada vez mais está sendo deixado de lado no processo educativo. E cada vez mais as tecnologias avançam para as funções que eles exerciam como se esse fosse o caminho para melhorar a educação", diz Soares.

Em nota, a Secretaria de Educação disse que o processo de fluxo editorial com o uso do ChatGPT "ainda será testado e passará por todas as etapas de validação para que seja avaliada a possível implementação".

Embora a pasta afirme que o processo ainda está em teste, os professores curriculistas já receberam as orientações sobre como devem trabalhar nas próximas semanas.

Segundo a secretaria, a ferramenta vai aprimorar as aulas produzidas anteriormente pelos docentes. "Com a inserção de novas propostas de atividades, exemplos de aplicação prática do conhecimento e informações adicionais que enriqueçam as explicações de conceitos-chave de cada aula."

"Na sequência, esse conteúdo será avaliado e editado por professores curriculistas em duas etapas diferentes, além de passar por revisão de direitos autorais e intervenções de design. Por fim, se essa aula estiver de acordo com os padrões pedagógicos, será disponibilizada como versão atualizada das aulas feitas em 2023", diz a nota.

Ainda de acordo com a secretaria, a equipe de produção dos materiais conta com 90 professores curriculistas.

Para Márcia Jacomini, professora da Unifesp, a medida retira do professor o direito constitucional da liberdade de ensino. "O uso das aulas digitais já estava reduzindo a função do professor porque ele não tem autonomia para ensinar da forma e no ritmo que julga necessários. Agora, ele ainda vai ficar subordinado a algo feito por uma ferramenta digital."

Os especialistas destacam ainda que ferramentas de inteligência artificial utilizam informações que são encontradas na internet, o que não garante que elas sejam verdadeiras ou estejam contextualizadas.

"O ChatGPT usa as informações que são registradas com mais frequência na internet, que não necessariamente são verídicas. Como a secretaria pode confiar na ferramenta para fazer o material didático de 3,5 milhões de alunos? Como pode achar que ela é mais adequada do que um professor que se graduou para ensinar aquele conteúdo?", questiona.

Eles também destacam que o uso de ferramentas de inteligência artificial tem incorrido em diversas denúncias de plágio, o que pode gerar problemas judiciais ao governo do estado e custos ao erário com eventuais processos por direitos autorais.

Nesta quarta-feira, um grupo de políticos do PSOL entrou representações para que o Ministério Público investigue o caso.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.