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Conheça professores que levaram escolas públicas a prêmio de melhores do mundo

Colégios brasileiros disputam com iniciativas lideradas por docentes que usam da criatividade para promover atividades esportivas e culturais

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Rio de Janeiro

Com uma experiência de 11 anos na docência, o professor de história Francisco Celso, 44, sabia que sua abordagem de ensino iria mudar quando começou a dar aulas para os estudantes do Núcleo de Ensino da Unidade de Internação de Santa Maria, instituição no Distrito Federal que acolhe adolescentes em conflito com a lei.

Manter o engajamento dos garotos é mais difícil por lá, segundo o professor, já que as turmas mudam frequentemente –alunos saem depois de passar pela medida socioeducativa e são transferidos de turma se entrarem em conflito com colegas. Foi quando ele notou o interesse dos estudantes pelo rap e decidiu ensinar história por meio de músicas do gênero.

O projeto criado por Francisco Celso levou a instituição a ser indicada no prêmio de melhores escolas do mundo, da plataforma britânica de educação T4 Education.

Quatro pessoas em um abraço coletivo, transmitindo apoio. Elas estão vestidas de preto e parecem estar compartilhando um momento emocional
Professores de escola pública paulista celebram indicação ao prêmio Melhor do Mundo, por projeto de xadrez e atletismo - Argel do Valle/Seduc SP/Divulgação

Outros três colégios públicos brasileiros estão na competição, em iniciativas idealizadas por professores que usam da criatividade e da solidariedade da comunidade escolar para promover cultura, esporte e educação ambiental para os alunos.

As instituições de ensino do Pará, do Amazonas, de São Paulo e do Distrito Federal concorrem em diferentes categorias, cada uma com dez colégios de vários países. Todas as escolas brasileiras selecionadas para o prêmio são públicas.

"Aqui, 90% dos alunos se autodeclaram negros e negras e todos são de regiões periféricas do Distrito Federal. A cultura hip hop já é muito presente na vida deles. O que eu fiz foi pegar essa potência que eles já carregavam e dar oportunidade", diz Francisco.

Na aula, depois de mostrar as músicas, o professor incentivava os estudantes a produzirem os próprios trabalhos artísticos com base no conteúdo. Eles criavam desde outros raps até desenhos e textos.

O sucesso da iniciativa levou à criação de um sarau. No início, o evento foi viabilizado com equipamentos de som emprestados por uma organização.

Segundo o professor, todo o projeto foi acompanhado de um apoio à carreira de alunos que tivessem interesse em se tornar músicos. Francisco, que também é produtor cultural, ajudou os estudantes a se apresentarem em shows, batalhas de rima e campanhas publicitárias.

O projeto concorre ao prêmio na categoria "Superando Adversidades".

"Tentamos tirá-los do ciclo vicioso e colocá-los no ciclo de virtudes por meio da cultura. Não acredito na ressocialização sem promoção de renda, porque o que levou esses jovens à vida infracional foi justamente a condição de vulnerabilidade."

Na Escola Estadual Deputado Pedro Costa, na capital paulista, dois professores levaram atividades de xadrez e atletismo aos alunos do 1º ao 5º ano para promover desenvolvimento pessoal e interação entre as crianças.

Eles também não tinham recursos no início, e improvisavam materiais para serem usados nas atividades.

O professor Luiz Fernando Junqueira, 49, pegou desde rolos de papel higiênico até meias de areia para criar obstáculos, pesos de arremesso e outros equipamentos para as aulas de atletismo.

Já Leonardo Alcântara, 66, levou seus próprios jogos de xadrez para ensinar o esporte na escola, que antes tinha apenas dois tabuleiros. Hoje, ele empresta seus jogos para que alunos continuem desenvolvendo a habilidade em casa, com a família, e ensinem para amigos.

"Essa fase do 1º ao 5º ano é do direito de brincar, em que relações na unidade escolar são muito intensas. Como professor, tenho que criar aulas atrativas e trabalhar a socialização do aluno para que ele aprenda melhor e se sinta acolhido", diz Leonardo.

Para os mais novos, as atividades são mais lúdicas, enquanto os mais velhos são mais competitivos e devem se atentar às regras.

As iniciativas foram reconhecidas pelo concurso na categoria "Colaboração em Comunidade", já que os docentes expandem as atividades para além dos muros da escola.

Luiz e Leonardo levam as equipes para conhecer instituições dedicadas às atividades, como clubes de xadrez e a federação de atletismo, e engajam até os responsáveis das crianças nos esportes.

"Alunos aprendem autonomia, autoconfiança, podem até bater um recorde no esporte. Tudo isso agrega na comunidade porque, incentivando os estudantes, eles levam isso da escola para casa, o que é uma grande satisfação para nós, professores", diz Luiz Fernando, de atletismo.

O envolvimento da comunidade escolar também foi uma etapa importante no projeto da Escola Estadual Professora Maria das Graças Escócio Cerqueira, em Itaituba, no Pará, concorrendo ao prêmio na categoria "Ação Ambiental".

A responsável pela iniciativa é Eliude Ramos, 37, professora de Atendimento Educacional Especializado (AEE), para alunos com deficiência. Na escola, a turma inclui jovens autistas, surdos e com algum comprometimento intelectual.

Ela percebeu a curiosidade dos estudantes pelo ipê, árvores que cercavam a escola cujas sementes caem no chão. A partir desse interesse, Eliude inscreveu alunos em uma olimpíada estudantil voltada à educação ambiental, em que começaram a produzir "bolas de semente", que, além dos grãos, eram feitas de argila e terra.

A participação na olimpíada gerou interesse de alunos de outras turmas. A professora e os estudantes colocaram as sementes em berçários, feitos com caixas de ovo, de papelão e de isopor, para germinarem. Os grãos usados são de árvores nativas da amazônia, como açaí e buriti.

Quando as mudas estavam maiores, Eliude e os alunos tiraram do berçário e plantaram em quatro pontos da cidade, já que a escola não conta com um viveiro próprio para plantas.

Com o projeto, a professora também incentiva os estudantes a compartilharem o que aprenderam sobre plantação. Ela levou a turma de atendimento especializado a liderar uma oficina no Instituto Federal do Pará, em que ensinaram alunos de curso técnico e ensino superior a montar bolas de sementes.

"Eles ficaram mexendo na terra, com argila, conversando, sorrindo. É um momento bem descontraído", conta ela. "Os estudantes adoram atividades práticas, assim como eu. Gostam de sair e fazer acontecer."

A quarta escola participando no concurso é o Colégio Militar de Manaus, que concorre na categoria de inovação por expandir o ensino a distância para os alunos. Procurada, a instituição não respondeu até a publicação desta reportagem.

O ganhador em cada categoria receberá um prêmio de US$ 10 mil (R$ 54,5 mil). As vencedoras são escolhidas por votação popular até dia 28 de junho. A enquete pode ser acessada no site da premiação.

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