Descrição de chapéu
Magdalene J. Taylor

Façam mais sexo, por favor!

Uma epidemia de solidão nos assola, mas há soluções possíveis: todos deveriam transar mais e com o máximo de prazer

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Magdalene J. Taylor

Magdalene J. Taylor é jornalista que atua na cobertura de sexo e cultura

The New York Times

Sexo é bom. Sexo é saudável. Sexo é uma parte essencial de nosso tecido social. E é bem provável que você, especificamente, deveria estar fazendo mais.

Em meio a uma epidemia de solidão, os americanos não vêm fazendo sexo suficiente. Americanos de quase todos os grupos demográficos –adultos velhos e jovens, solteiros e casais, ricos e pobres— estão fazendo menos sexo do que foi o caso em qualquer momento das últimas três décadas, pelo menos.

O sexo não é a única forma de interação humana satisfatória e certamente não constitui uma solução para todas as formas de solidão. Mesmo assim, deveria ser encarado como parte fundamental de nosso bem-estar social, e não como um prazer desnecessário ou algo que fazemos apenas quando sobra tempo para isso.

A razão disso é em grande medida porque o aumento da solidão se dá em paralelo com a diminuição da atividade sexual. A pesquisa sociológica General Social Survey mais recente, de 2021, revelou que mais de um quarto dos americanos não havia feito sexo uma vez sequer nos 12 meses anteriores. Foi o mais alto nível de assexualidade na história da pesquisa.

Novas gerações fazem menos sexo que as anteriores - Adobe Stock

Essa cifra inclui quase 30% dos homens de até 30 anos, e ela triplicou desde 2008. Nos anos 1990, metade dos americanos fazia sexo uma vez por semana ou mais. Hoje essa porcentagem não chega a 40%. Para muitas pessoas que têm atividade sexual, a frequência caiu nitidamente. E não é apenas sexo: a porcentagem de pessoas que têm companheiros ou que vivem com um companheiro também diminuiu.

Menos tempo passado com amigos e parceiros sexuais: essas não são questões distintas, mas sim sintomas do mesmo mal-estar cultural, um isolamento que está demolindo a vida social, a vida amorosa e a felicidade dos americanos.

As estimativas variam, mas algo entre um terço e dois terços dos americanos relata sentir solidão. A solidão é um círculo que se retroalimenta continuamente: o laços culturais enfraquecidos, saúde física prejudicada e contato social reduzido ao mesmo tempo exacerbam a solidão e são exacerbados por ela, a ponto de a solidão reduzir a expectativa de vida.

A solidão é um fenômeno difícil de ser quantificado por pesquisadores, mas há indícios reveladores de sua presença –e esses indícios apontam para uma sociedade que está perdendo seu rumo. O número de americanos que afirma não ter nenhum amigo íntimo quadruplicou desde 1990, segundo um estudo do grupo de pesquisas Survey Center on American Life. O Burô do Censo constatou que os americanos em 2021 passaram 58% menos tempo com amigos do que em 2013.

A Covid-19 contribuiu para o aumento da solidão e o declínio do sexo, mas é apenas parcialmente responsável por isso. Entre 2014 e 2019, o tempo que as pessoas passam com amigos diminuiu mais que durante a pandemia. E durante a pandemia, muitos americanos passaram mais e mais tempo sozinhos, sem amigos nem parceiros românticos. Um fato que chama a atenção é que os americanos jovens têm menos probabilidade de fazer sexo que a geração de seus pais –e, quando fazem, o número de parceiros é menor.

Em meu trabalho como jornalista que escreve sobre sexo e cultura, já conversei com dezenas de homens para quem a falta de sexo é a característica que define seu cotidiano. Isso molda seus interesses, motivações e esperanças. Alguns deles são "incels" –"celibatários involuntários" que seguem uma ideologia misógina e tóxica–, mas uma parcela maior não é. Alguns pensam que a busca por sexo será totalmente infrutífera e já passaram a encarar sair com amigos e conhecer pessoas novas como algo inteiramente infrutífero, também.

Esse pensamento pode se tornar cíclico. Em pouco tempo essas pessoas não apenas receiam não encontrar um parceiro sexual, como passam a recear até mesmo as interações sociais platônicas. O sexo é apenas um componente de seu isolamento geral, mas em muitos casos é o fator determinante do problema maior.

É fácil descartar esses homens, encará-los como anomalias ou caracterizar sua situação como fruto de falhas pessoais ou mesmo consequência da masculinidade moderna. Mas, embora boa parte das pesquisas sobre o declínio do sexo enfoquem os homens jovens, a ausência de sexo atinge quase todos os grupos de americanos. E suas consequências são profundas. Se uma falta de sexo afeta a participação cultural e social desses homens jovens, é provável que afete o resto de nós também. Uma ausência de sexo pode facilmente se traduzir em menos socialização, menos famílias e uma população ainda mais doente. Afinal, o sexo amortece a dor, alivia o estresse, melhora o sono, abaixa a pressão sanguínea e fortalece a saúde do coração.

Jornalistas como eu converteram a ausência de atividade sexual masculina num problema amplamente conhecido, mas as mulheres estão na mesma situação. Dados da General Social Survey sugerem que as mulheres podem estar fazendo ainda menos sexo que os homens.

Em 2021, cerca de um quarto das mulheres com até 35 anos informou não ter feito sexo nos 12 meses anteriores. No caso dos homens, foram 19%. E as mulheres que estão fazendo sexo têm menos propensão a estar satisfeitas com o sexo que estão fazendo. Tanto homens quanto mulheres relatam sentir remorso e infelicidade após sexo casual, mas isso é mais comum entre mulheres, provavelmente em parte devido às percepções culturais de autonomia sexual. O sexo pode aproximar as pessoas, mas isso só funciona quando é sexo bom.

Homens e mulheres estão juntos na ausência de sexo e estão percorrendo o mesmo caminho para a solidão. Mulheres jovens se mostraram mais propensas que homens a perder contato com amigas durante a pandemia, e um estudo britânico constatou que as mulheres tendem mais que os homens a informar que sentem solidão "frequentemente" ou "sempre".

As reportagens geralmente enfocam a ausência de sexo na população masculina jovem e destacam a ideologia dos incels, mas o declínio na atividade sexual e o aumento da solidão e do isolamento social não são problemas masculinos. Na América do século 21, a solidão é onipresente, e o medo que é o chavão dos estudantes secundaristas, "todo o mundo menos eu anda transando", nunca correspondeu menos à verdade.

Não existe uma solução única. A epidemia de solidão foi provocada por fatores diversos que vêm sendo exacerbados ao longo de décadas. A culpa cabe em parte às redes sociais, e outra é a guerra de atrito travada no século 20 contra comunidades onde é possível andar a pé. Mas à medida que a solidão se acelerou, passou a se autoperpetuar. Nossa solidão e ausência de vida sexual atuais, como sociedade, são frutos de transformações sociais e culturais, e sua continuação perpetua essas transformações e as leva adiante.

A epidemia de solidão pode ser um problema social, mas pode ser resolvida, pelo menos em parte, ao nível dos quartos individuais. Aqueles de nós que temos condições de fazer mais sexo deveríamos fazê-lo. É uma oportunidade rara de fazer algo para melhorar o mundo que nos cerca, algo que envolve nada mais do que curtir um dos prazeres mais essenciais da humanidade.

Fazer mais sexo é tanto uma recomendação pessoal –com a qual é bem possível que seu médico concorde— quanto uma declaração política. A sociedade americana está menos interligada, sendo composta por indivíduos que parecem cada vez mais dispostos a isolarem-se. Fazer mais sexo pode ser um ato de solidariedade social.

Nem todos que gostariam de fazer mais sexo estão em condições de fazê-lo facilmente. Problemas físicos, objeções religiosas, assexualidade e qualquer conjunto de restrições e responsabilidades cotidianas podem inviabilizar ou limitar o sexo para muitas pessoas. Pode haver algumas pessoas que não querem fazer mais sexo ou não querem fazer sexo, simplesmente. Mas mesmo aqueles que não querem mais sexo deveriam evitar a apatia. O sexo é intrínseco a uma sociedade erguida sobre vínculos sociais –e neste momento nossos vínculos e nossa vida sexual estão desmoronando lado a lado.

Muitas pessoas –como alguns dos homens jovens com quem tenho conversado em meu trabalho— já se conformaram em deslocar seus desejos sexuais, recorrendo unicamente à pornografia ou outros estímulos online, algo que espelha muitos tipos de relacionamentos que acabaram sendo sugados pelo mundo digital. Como um remédio para a solidão, o sexo digital pode não ser muito melhor que a amizade digital: uma fonte de inveja, ressentimento e rancor, algo que alimenta a solidão em vez de amenizá-la. Não se compara de modo algum à experiência real.

Logo, qualquer pessoa que esteja em condições para isso deveria fazer sexo –o máximo que puder, com o maior prazer possível, com a maior frequência possível.

Tradução de Clara Allain

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.