Descrição de chapéu Beleza

Minoxidil contra a calvície divide especialistas; entenda

Medicamento era inicialmente indicado para hipertensão, mas estudos comprovaram sua ação contra alopécia androgenética

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Patrícia Figueiredo
Agência Einstein

Desenvolvido nos anos 1970 para o tratamento de hipertensão arterial, o minoxidil é um medicamento que desde a década de 80 também é utilizado em forma de loção para tratar a alopecia androgenética, mais conhecida como calvície. Mas, recentemente, seu uso para crescimento capilar virou polêmica, motivada principalmente por uma reportagem publicada em agosto de 2022 no jornal "The New York Times" que destacou a prescrição de comprimidos de baixa dosagem por dermatologistas americanos. Atualmente, plataformas de monitoramento como o Google Trends também identificam aumento nas buscas sobre o medicamento.

A discussão envolve médicos que defendem o uso controlado do minoxidil via oral em baixa dosagem e, também, aqueles que o contraindicam por conta dos seus possíveis efeitos colaterais. A popularização do medicamento nas redes sociais, onde suas qualidades são propagandeadas sem critério médico e muitas vezes com dosagens inadequadas, aumentou a temperatura do debate.

A SBTri (Sociedade Brasileira de Tricologia), que reúne especialistas de diversas áreas da medicina, contraindicou todo tipo de uso do minoxidil oral para a calvície em comunicado oficial divulgado em setembro.

Uso de minoxidil contra a calvicie divide especialistas - Elena/Adobe Stock

Já a SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia) defendeu que o medicamento oral pode, sim, "ser indicado em pacientes selecionados com alopecia". A entidade disse ainda que "seu uso criterioso, isolado ou associado a outras abordagens, ocorre por indicação médica", em nota publicada em outubro.

As duas entidades, no entanto, concordam sobre os riscos da automedicação e a importância de acompanhamento médico para o tratamento, já que o minoxidil é um medicamento e, como tal, pode ter efeitos colaterais.

"Nós somos contra o uso indiscriminado do minoxidil, comprar na farmácia sem acompanhamento, comprar porque viu Instagram, sem orientação. Isso a gente é supercontra, porque existem efeitos colaterais e você precisa ter um médico ao lado", afirma a médica Fabiane Mulinari Brenner, coordenadora do departamento de cabelo da SBD.

O dermatologista Beni Grinblat, do Hospital Israelita Albert Einstein, aponta que o uso do minoxidil oral para tratamento de calvície é bastante difundido entre os dermatologistas brasileiros.

"De uns anos pra cá começaram a aparecer estudos sobre o uso do minoxidil via oral e aí vimos que, com dosagens baixas, ele não tinha o efeito de baixar a pressão, mas mantinha o efeito benéfico no tratamento da calvície. Eu prescrevo com frequência para os meus pacientes", conta Grimblat.

Pesquisador da Unesp (Universidade Estadual Paulista), o médico Paulo Müller Ramos estuda os efeitos do minoxidil oral no tratamento da calvície desde 2016. Ele afirma que a droga é prescrita especialmente para casos de alopecia androgenética. Mas o remédio também é usado como coadjuvante no tratamento da queda de cabelo motivada por outros fatores, como Covid-19 ou cirurgias invasivas.

"Um paciente com queda capilar causada por anemia ou alterações de tireoide, por exemplo, até poderia utilizar como coadjuvante. Mas, em alguns casos, como na queda capilar por conta da Covid-19, essa queda costuma se reverter sozinha, e não há necessidade de medicamentos", diz Müller.

No entanto, a prescrição encontra forte resistência de alguns profissionais, que destacam os possíveis efeitos colaterais da droga. É o caso do médico Luciano Barsanti, presidente da SBTri, que publicou uma nota alertando que o medicamento não tem aval da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) no tratamento de calvície.

"Essas notícias recentes, como a reportagem do New York Times, minimizam as reações adversas graves e comuns desse medicamento via oral, porque ele é um hipotensor extremamente potente. Esse medicamento tem efeitos adversos com muita frequência, porque cada indivíduo tem uma sensibilidade diferente a um fármaco", pontua Barsanti.

O Loniten, o minoxidil da Pfizer, comercializado no Brasil até 2010 e usado no tratamento de hipertensão, era vendido em comprimidos de 10 mg e, segundo a Anvisa, não é indicado para tratamento de alopecia. Já as doses indicadas por dermatologistas para o tratamento de calvície atualmente são feitas em farmácias de manipulação e variam de 0,25mg a 5mg diárias.

Evidências científicas e riscos

Efeitos colaterais do minoxidil também se refletem no coração, uma vez que o medicamento promove a dilatação dos vasos sanguíneos. Os mais graves são a taquicardia, que é o aumento da frequência cardíaca, e a pericardite, uma inflamação da membrana que envolve o órgão.

A reação mais comum, no entanto, é a hipertricose, nome científico para o crescimento exagerado de pelos por todo o corpo: cerca de 10% a 15% dos pacientes que fazem uso do minoxidil via oral relatam esse sintoma. Outra reação frequente é o inchaço nas pernas ou no rosto.

Luciano Barsanti, da SBTri, relata que a maioria dos pacientes que chegam em seu consultório apresentam efeitos colaterais.

"Nos pacientes que eu atendo, 90% dos que vêm tomando minoxidil têm efeitos adversos. Os outros 10% não relatam efeitos colaterais, mas muitos não necessariamente relacionam [o que estão sentindo] com o medicamento", diz.

Em nota, a SBTri aconselha usuários com alopecia a procurarem "médicos e tricologistas que utilizem métodos não-invasivos para o tratamento", e cita terapias como eletroestimulação e laser de baixo comprimento.

Já a médica Fabiane Brenner, da SBD, destaca que as terapias feitas em consultório não possuem evidências científicas tão robustas, e lembra que a calvície genética é uma doença crônica que depende de tratamento contínuo.

"O guia de tratamento da calvície é baseado principalmente no minoxidil, especialmente de uso tópico, no transplante capilar e tratamento hormonal. É o que tem medicina baseada em evidências. Nos últimos 10 anos surgiram alguns tratamentos que a gente faz no consultório, mas esses deveriam ser tratamentos de exclusão, deveriam ser a última alternativa", explica.

O dermatologista Beni Grinblat também avalia que, mesmo com os possíveis efeitos colaterais, o remédio é seguro e pode ser uma boa alternativa para pacientes com calvície.

"A gente tem que orientar a população que ele [minoxidil] é uma opção no tratamento, mas claro que sempre com um diagnóstico correto, com acompanhamento médico, e aí uma avaliação do uso tópico ou oral. A gente nunca pode estimular a automedicação", completa Grimblat.

Como o minoxidil age

Apesar de estudos analisarem a ação do minoxidil no tratamento de calvície desde os anos 1980, ainda não está claro como o medicamento promove o crescimento capilar.

Inicialmente, as pesquisas científicas apontavam a vasodilatação promovida pelo remédio como seu principal mecanismo de ação. Com o aumento da circulação nos vasos sanguíneos do couro cabeludo, os folículos capilares, que são as estruturas onde o cabelo nasce, receberiam mais nutrientes, o que propiciaria seu crescimento.

No entanto, estudos recentes sugerem que o minoxidil tem uma ação direta no folículo, e que a vasodilatação não é o mais importante recurso do medicamento no tratamento de calvície.

"Hoje em dia, não acreditamos que esse seja o principal mecanismo. O que observamos é que há uma modificação bioquímica no folículo que faz com que o cabelo cresça por mais tempo e fique mais grosso com o uso do medicamento", afirma Brenner, da SBD.

Outro efeito da droga no couro cabeludo é o prolongamento da fase ativa do folículo capilar. Com a idade, a fase de crescimento do cabelo fica mais curta. O uso do minoxidil prolonga o período no qual o folículo está ativo.

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