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Remédio para alcoolismo evita excesso por quem bebe moderadamente, diz estudo

Trabalho indica que a naltrexona elimina a sensação de prazer causada pelo álcool

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Barra Mansa (RJ)

Um estudo publicado em dezembro de 2022 mostra que a naltrexona, medicamento usado no tratamento do alcoolismo, também pode ser uma aliada na hora de evitar excessos por aqueles que consomem álcool moderadamente. Pesquisadores, entretanto, afirmam que a melhor forma de controlar a bebida é por meio da intervenção psicoterapêutica.

O trabalho revela que o remédio, um bloqueador dos receptores opióides localizados no sistema nervoso central, tem eficácia para reduzir o total de doses tomadas em uma mesma ocasião, pois elimina a sensação de prazer causada pela bebida.

No total, 120 pessoas com dependência leve ou moderada participaram do estudo divulgado pelo American Journal of Psychiatry. Para garantir a eficácia dos resultados, o modelo escolhido foi o duplo-cego – nem pesquisadores nem voluntários sabiam quem recebia o medicamento ou placebo.

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Medicamentos usados para dependência podem ajudar a reduzir consumo exagerado de álcool - Adobe Stock

Após o período de tratamento, constatou-se que o grupo que teve acesso à naltrexona reduziu de forma mais significativa o consumo de álcool. Os resultados perduraram por mais seis meses após o final do tratamento.

O medicamento também é utilizado no tratamento de sobrepeso e obesidade. Um estudo recente mostra que a associação do fármaco com a bupropriona é capaz de reduzir o consumo de alimentos e auxilia no controle de peso por até 4 anos. No país, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aprovou no final de 2021 a venda da combinação, que atua sobre o sistema de recompensas do cérebro.

A professora e pesquisadora da UFRS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Lisia von Diemen destaca a diferença entre os usuários ocasionais e recreacionais de bebidas alcóolicas e aqueles com consumo de risco ou dependência. Caso os primeiros queiram reduzir a quantidade de doses consumidas, devem buscar intervenção de um psicólogo, psiquiatra ou clínico geral. Nesses casos não é necessário o uso de medicações, diz.

Quando o consumo é excessivo e supera 14 doses semanais para homens ou 7 para mulheres, o paciente passa a ser considerado de risco. Nesse caso, pode ser recomendado tratamento medicamentoso para o controle da bebida.

"Na Inglaterra, o nalmefeno [de ação similar a naltrexona] está sendo indicado para pessoas que precisam moderar", afirma von Diemen.

Os cientistas avaliaram o chamado consumo excessivo que, segundo o Instituto Nacional sobre Abuso de Álcool e Alcoolismo dos Estados Unidos, é caracterizado pelo número de doses tomadas em um intervalo de duas horas. O valor de referência utilizado foi de quatro ou mais, para homens, e de três no caso de mulheres.

O consumo excessivo de álcool aumenta o nível da substância no sangue, o que gera riscos imediatos ou agudos, como acidentes de trânsito, comportamentos de risco ou violência. Por meio de questionários aplicados entre 2015 e 2016 a mais 7 mil adultos com mais de 50 anos, pesquisadores concluíram que 6,7% dos brasileiros nessa faixa etária bebem de forma excessiva.

Outro estudo realizado com mais de 2 mil jovens entre 15 e 17 anos aponta que 8,1% dos adolescentes brasileiros exageram na dose. Publicado em 2022, o trabalho feito por pesquisadores da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) mostra que a tendência a beber demais aumenta com o nível social e a idade.

A necessidade de encontrar maneiras de reverter esse cenário é o que leva pesquisadores a buscar soluções como a naltrexona para o controle do consumo excessivo de álcool. Mas, apesar dos resultados promissores, a professora von Diemen destaca que estudos como esses devem ser avaliados com cautela, uma vez que os voluntários têm mais motivação para controlar a bebida. Além disso, durante a pesquisa os participantes receberam acompanhamento psicológico.

"Só a medicação não faz automaticamente a pessoa diminuir ou parar de beber. Tem algum fator comportamental que exige intervenção psicoterápica", diz ela.

Através de uma meta-análise de mais de 9 mil estudos científicos publicados sobre o tema, cientistas tailandeses e canadenses concluíram que as redes de apoios são o tratamento com evidências mais robustas de eficácia para pessoas com transtornos por abuso de álcool. Dentre as drogas, o acamprosato é aquela que promove os melhores efeitos observados de forma experimental. O fármaco é usado como inibidor para crises de abstinência.

Nos resultados, os pesquisadores também afirmam que a combinação de intervenções farmacológicas e psicológicas é potencialmente benéfica, bem como o uso do nalmefeno e da quetiapina. Para crianças e adolescentes, os especialistas recomendam a orientação a longo prazo.

Nos casos de dependência mais grave, porém, pode ser necessário aplicar tratamentos vistos como radicais, como a abstinência. Quando há recaídas, pacientes com histórico de uso severo podem voltar aos níveis de elevado consumo. Carlos Alberto Tagliati, professor e pesquisador da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), afirma que, nessas intervenções, a primeira fase é a de desintoxicação ou hospitalização, e pode durar até duas semanas.

Depois o paciente é transferido para uma clínica, onde a abordagem psicológica e psiquiátrica tem preferência sobre a medicamentosa. "A droga não é o problema, é a consequência do problema", diz o especialista. "É preciso trabalhar a cabeça do paciente e entender o que levou ele ao uso do álcool."

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