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Como a falsa ciência vende bem-estar

Marketing de produtos usam termos que soam científicos para atrair consumidor

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Rina Raphael
The News York Times

Você não consegue percorrer um supermercado ou uma farmácia sem ser submetido a rótulos chamativos que anunciam benefícios à saúde. No corredor de bebidas, por exemplo, você pode encontrar refrigerantes prebióticos, que supostamente auxiliam na saúde intestinal. No departamento de beleza, verá séruns de "grau medicinal", cremes faciais probióticos e tratamentos de desintoxicação da pele. Vá à seção de suplementos para ver promessas de suporte à imunidade, equilíbrio hormonal e aumento da energia, entre outras coisas.

Os profissionais de marketing usam palavras-chave que soam científicas para vender produtos há séculos. Mas isso está ficando mais comum, segundo Timothy Caulfield, diretor de pesquisa em leis e políticas de saúde da Universidade de Alberta (Canadá). Caulfield cunhou o termo "scienceploitation" [exploração da ciência] para descrever como as marcas emprestam a linguagem de novas áreas da ciência para comercializar produtos sem comprovação.

Esses termos surgem em muito mais lugares hoje do que antes, inclusive em resultados de busca, em plataformas de rede social e pela boca de influenciadores, disse Caulfield. Os consumidores são frequentemente inundados com opções confusas à medida que mais empresas se posicionam como saudáveis.

Alguns produtos vendidos em farmácias prometem desintoxicar o organismo ou aumentar a energia, mas sem comprovação científica - Tyosya/Adobe Stock

Os compradores estão priorizando as evidências científicas, disse Sienna Piccioni, analista e chefe de beleza da empresa de previsão de tendências WSGN. Mas eles nem sempre podem separar o fato da ficção: um estudo de 2021 sugeriu que as pessoas que confiam na ciência eram mais propensas a compartilhar afirmações falsas que continham referências científicas do que afirmações que não as continham.

Em dezembro, a Comissão Federal de Comércio dos Estados Unidos (FTC) revisou suas diretrizes para produtos relacionados à saúde, enfatizando que as empresas deveriam apoiar as alegações de saúde "com ensaios clínicos humanos controlados, randomizados e de alta qualidade". Mas especialistas dizem que é improvável que a comissão consiga monitorar de perto como as empresas comercializam seus produtos, pelo menos não sem um grande aumento de verbas.

"Existem marcas demais", disse Kevin Klatt, pesquisador assistente do departamento de ciências da nutrição e toxicologia da Universidade da Califórnia em Berkeley.

Então, por enquanto, estamos por nossa conta. Mas você ainda pode se armar. Aqui estão algumas táticas de marketing que você deve conhecer:

LISTAS ENORMES DE INGREDIENTES

As empresas geralmente tentam lucrar com modismos como adaptógenos e carvão ativado, que você pode encontrar listados em itens como embalagens de biscoitos e tubos de pasta de dente. Mesmo ingredientes que são conhecidos por sua eficácia podem ser manipulados: marcas de beleza e cuidados com a pele, por exemplo, podem usar 0,2% de vitamina C em um hidratante, embora as evidências mostrem que a quantidade precisaria ser maior para ter algum efeito, disse Michelle Wong, química de cosméticos que dirige o blog Lab Muffin Beauty Science e ajudou a popularizar o termo "lavagem científica" nos círculos de beleza.

É por isso que não é necessariamente útil vasculhar uma lista de ingredientes de aparência científica, disse ela. A maioria não diz muito sobre a qualidade ou a quantidade de cada ingrediente, nem como ele interage com outros ingredientes ou sua estabilidade —tudo isso afeta a eficácia.

TERMOS VAGOS COMO 'REFORÇO' E 'SUPORTE'

Os fabricantes usam palavras sem definições claras e específicas, como "ajuda", "promove", "apoia", "estimula", "reforça" e "otimiza" para sugerir resultados positivos para a saúde. Não há uma maneira quantificável de medir uma palavra ambígua como "suporte", disse Jonathan Jarry, cientista e comunicador científico do Departamento de Ciência e Sociedade da Universidade McGill.

As empresas de suplementos, que não precisam provar eficácia para a Administração de Alimentos e Drogas dos EUA (FDA), frequentemente se baseiam nos termos listados acima. Mas muitas vezes há um pequeno aviso no frasco que diz que o produto "não se destina a diagnosticar, tratar, curar ou prevenir qualquer doença".

"Eles estão insinuando que o produto funciona e, no mesmo rótulo, muito menos visível, está o fato de que não há evidências de que ele funcione", disse Josh Bloom, diretor de ciência química e farmacêutica do Conselho Americano de Ciência e Saúde. Ainda assim, disse ele, as pessoas veem uma palavra como "apoio" e podem presumir que o produto tratará seus sintomas.

Outras frases, como "clinicamente testado", "baseado em pesquisa", "recomendado por médicos" e "baseado em evidências", aparecem no corredor de beleza ou cuidados pessoais —e muitas vezes não têm o contexto de que precisariam para ser verificados, disse a doutora Wong. Ao ver esses termos, você deve se perguntar: Quais foram os resultados dos testes? Qual foi a qualidade da pesquisa e quem a conduziu? O pesquisador ou endossante era uma autoridade legítima nesse campo?

ESTUDOS QUESTIONÁVEIS

As marcas de bem-estar podem encher seus sites com links para estudos. Mas alguns são simplesmente resumos de dados emergentes sem qualquer menção ao produto em questão. Muitas empresas incluem pesquisas que não estão relacionadas à sua afirmação. As evidências citadas por uma empresa "podem ser um estudo mal projetado", disse Nick Tiller, pesquisador sênior em fisiologia do exercício no Centro Médico Harbor-UCLA. "Pode ser escolhido ao acaso."

"O que você quer ver são os resultados de estudos rigorosos reais do próprio produto, mostrando que ele funciona", disse Jarry. "Mas isso quase nunca acontece", acrescentou.

O QUE VOCÊ PODE FAZER PARA AVALIAR AFIRMAÇÕES

Se você está tentando ter uma ideia da legitimidade de um produto, a Comissão Federal de Comércio recomenda fazer uma pesquisa online pelo nome do produto, além das palavras "revisão", "reclamação" ou "fraude".

Você também pode verificar o que as associações profissionais respeitadas e as principais organizações de saúde pública, como os Institutos Nacionais de Saúde ou os Centros de Controle e Prevenção de Doenças, dizem sobre um produto, protocolo ou ingrediente específico, aconselham os especialistas.

Se um suplemento de ervas afirma tratar a pressão alta, por exemplo, você pode pesquisar nos sites da Associação Americana do Coração ou do Colégio Americano de Cardiologia, pois essas organizações costumam ter artigos, declarações de posição e meta-análises sobre eles, disse a doutora Danielle Belardo, cardiologista que apresenta o podcast "Wellness: Fact vs. Fiction" (Bem-estar: fato x ficção).

Ao avaliar um ingrediente ou produto chamativo, lembre-se de que "um estudo empolgante" não significa muita coisa, disse Caulfield. Os recipientes de kombucha costumam dizer que contêm benefícios "amigos do microbioma", embora a pesquisa do microbioma ainda esteja engatinhando. Portanto, antes de desembolsar seu dinheiro, dê mais crédito a fontes que incluam um corpo maior de evidências sobre um assunto, disse ele.

E lembre-se de que nenhum ingrediente isolado pode mudar sua saúde da noite para o dia. Se um produto fosse realmente uma cura para tudo, todas as organizações médicas estariam correndo para endossá-lo, disse o doutor Klatt. "Qualquer coisa que pareça boa demais para ser verdade provavelmente é boa demais para ser verdade", acrescentou.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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