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'Me sentia uma aberração por não querer ser mãe': as mulheres que se uniram contra preconceito com quem não quer ter filhos

Mulheres que não querem ser mães relatam que a 'expectativa cultural' de ter filhos muitas vezes as fez se sentir excluída

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BBC News

O número de mulheres que escolhem não ter filhos está crescendo e a taxa de natalidade global está caindo. Segundo o Banco Mundial, o número de nascimentos por 1000 pessoas mundialmente caiu de 36 em 1963 para 17 em 2021.

Embora as razões para essa escolha variem desde preocupações climáticas a questões financeiras e complicações de saúde, as mulheres que tomam a decisão de não ter filhos dizem que nem sempre são aceitas socialmente e sentem que são relegadas ao ostracismo.

A BBC conversou com membros do movimento Bristol Childfree Women, um grupo com mais de 500 integrantes criado por mulheres e para mulheres que decidiram não ter filhos.

Mulher branca de cabelo moreno e óculos escuros sentada em um banco de parque. Atrás estão várias plantas.
Caroline Mitchell, 46, sempre soube que não queria ter filhos - Caroline Mitchell

Caroline Mitchell, 46, mora com o marido em Bristol. Embora sempre soubesse que não queria ter filhos, ela não previa a enxurrada de perguntas pessoais que enfrentaria quando amigos e conhecidos atingissem a "idade fértil". "Eu me sentia uma aberração por causa disso", disse ela.

Aos olhos de Caroline, a sociedade sempre espera a maternidade das mulheres. "Sinto que minha perspectiva e minha experiência simplesmente não são aceitáveis", afirmou.

Muitas mulheres em seu círculo de amigos têm filhos e, embora nunca tenham feito nada intencional para fazê-la se sentir diferente, Caroline conta que o fato de "todas estarem fazendo uma coisa" e ela fazer outra tem sido "muito difícil".

"Você percebe como é excluída de grande parte da vida", disse ela. "É muito difícil para mim conhecer pessoas, porque tudo gira em torno das mulheres que você conhece nos portões da escola ou nos grupos para mães."

Embora Caroline esteja "100% certa" e "muito confortável" com sua escolha, ela admite que por vezes já "sofreu" com sua decisão.

Para ela, isso se deve à "expectativa cultural" do que é normal na sociedade e ao conceito de que, se você é mulher, ter um filho é "o caminho natural" a seguir.

Ela afirma ser difícil não se enquadrar nas normas da sociedade e que às vezes deseja que ela fosse "diferente".

"Minha vida teria sido mais fácil em alguns aspectos", desabafa.

No entanto, para muitas mulheres, quaisquer que sejam as escolhas que façam, elas parecem culpar-se por isso, aponta Caroline.

'O corpo é meu'

Os números oficiais da Inglaterra e do País de Gales divulgados em 2022 mostram que um número recorde de mulheres está chegando aos 30 anos sem filhos.

50,1% das mulheres nascidas em 1990 não tinham filhos quando completaram 30 anos em 2020 - a primeira geração em que isso acontece, de acordo com o Gabinete de Estatísticas Nacionais

Mulher branca com cabelos escuros posa para selfie sorrindo.
Megan Stanley diz que "anseia pela menopausa" - Megan Stanley

Megan Stanley, é da região de Oxfordshire e hoje mora em Bristol. Desde os 19 anos ela tenta conseguir a esterilização. Mas a inglesa de 31 anos conta que enfrenta obstáculo após obstáculo, até hoje sem sucesso.

"Os médicos diziam 'você ainda é um pouco jovem' ou 'você pode mudar de ideia'", disse ela. O mais perto que Megan chegou da esterilização foi quando ela tinha 29 anos e marcou uma consulta com um cirurgião.

"Eu preparei tudo - meu histórico médico, preparei toda a minha linha de raciocínio. Cheguei ao ponto de obter um depoimento do terapeuta com quem estava me consultando."

No entanto, a permissão não foi concedida quando o ginecologista perguntou sobre seu relacionamento. Ela disse ao médico que seu companheiro, com quem se relacionava há apenas 3 meses, definitivamente não queria filhos e já havia feito vasectomia.

Mulher branca de cabelos escuros abraçada com homem branco, com barba, gorro cinza e blusa vermelha. Ambos sorriem.
Megan e seu parceiro Ashley concordam que não querem filhos - Megan Stanley

Diante dessa informação, o médico respondeu que, se o parceiro já tinha feito vasectomia, então ela não precisava fazer um novo procedimento. "Por que o que acontece com meu corpo deveria ser ligado a o que ele fez com o dele?", questiona.

Ela também diz que algumas pessoas a pintaram como "uma pessoa que odeia crianças ou uma pessoa má". "Acho que não querer filhos é apenas uma coisa inerente a quem eu sou", disse ela.

Megan reclama de menstruações dolorosas e diz ser "cruel" passar pelo "sofrimento todos os meses por uma função corporal" que ela sente que não precisa.

"Cheguei ao ponto em que anseio pela menopausa. É o que eu mais quero hoje", afirma.

'Egoísmo'

Fiona Powley conta que sabia que não queria ser mãe desde os 12 anos, depois de ver sua própria mãe tendo problemas com a maternidade. "Achava que a maternidade não parecia algo muito divertido", lembra.

Agora com 49 anos, Fiona dirige o grupo Bristol Childfree Women e, embora esteja tendo sintomas da menopausa, ela "não tem uma sensação de pânico" por não ter tido filhos: "É muito confortável", disse.

Mulher branca de cabelos escuros sorri para a câmera. Ela veste um casaco escuro e um cachecol roxo.
Fiona Powley assumiu a direção do grupo Bristol Childfree Women há 12 anos - Fiona Powley

Ironicamente, Fiona agora olha para sua vida e pensa que poderia ter feito "um bom trabalho como mãe", mas que "nunca quis isso o suficiente".

No entanto, assim como Caroline e Megan, ela conta que, às vezes, quando diz que escolheu não ter filhos, novas pessoas que conhece reagem negativamente a isso.

"Já me disseram que vou me arrepender. Qual o seu sentido de existir? Se você não tem filhos, você não é válida como mulher", diz Fiona. Ela já foi até chamada de "egoísta", e alguns questionaram quem cuidará dela quando ela envelhecer.

"É quase como se as pessoas se sentissem desconfortáveis", disse ela. "Provavelmente é porque nunca lhes ocorreu que elas também tinham escolha."

Fiona destaca que há muitos motivos pelos quais as pessoas decidem não ter filhos.

Olhando para trás, ela acha que seus próprios motivos eram "provavelmente pouco saudáveis", mas ela sabe que não vai "acordar de repente como uma velha senhora e sentir amargura e arrependimento".

'É uma questão de escolha'

Caroline avalia que, caso tivesse tido filhos, seria uma "mãe ressentida".

Para ela, há "várias vantagens" em não se ter filhos, como concentrar seu tempo no relacionamento com o marido e em seus hobbies.

Megan concorda: "Há muita alegria em não ter filhos. Não se trata apenas de liberdade e dinheiro. É uma questão de escolha", afirma.

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