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Após 40 anos, bebê de proveta ainda é para poucos no Brasil

Preço e difícil acesso em serviços públicos e em planos de saúde são barreiras

Cláudia Collucci
São Paulo

Quatro décadas após o nascimento do primeiro bebê de proveta, a inglesa Louise Brown, o principal entrave da fertilização in vitro (FIV) no Brasil ainda é o acesso ao tratamento.

Cada ciclo de FIV custa entre R$ 15 mil e R$ 20 mil. Em média, as chances de gravidez são de 36% em cada tentativa, segundo recente relatório de um estudo europeu.

Louise Brown com uma célula se dividindo ao fundo
Louise Brown, mulher que foi o primeiro bebê de proveta do mundo - Daniel Leal- Olivas/AFP

No SUS, a terapia está prevista desde 2005, mas poucos serviços públicos a disponibilizam. Em vários deles, os casais têm que bancar o custo dos remédios (que chegam a 50% do valor da FIV). Do contrário, amargam anos na fila de espera até serem dispensados ou desistirem.

A maioria dos países europeus subsidia parcial ou integralmente a reprodução assistida. A França, por exemplo, paga 100%. Na América Latina, Argentina e Uruguai tornaram o procedimento obrigatório na rede pública e no sistema privado de saúde.

A falta de acesso à FIV atinge também quem tem plano de saúde. Embora a infertilidade seja considerada doença pela CID (Classificação 

Internacional das Doenças), a lei que rege os planos de saúde, de 1998, desobriga as operadoras de oferecer a reprodução assistida.

É um contrassenso já que a mesma legislação garante cobertura a todas as doenças reconhecidas pela CID. Soma-se a isso uma outra norma (de 2009) que acrescentou à lei dos planos a obrigatoriedade da cobertura ao planejamento familiar.

Ocorre que uma resolução normativa da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), de 2010, excluiu a cobertura pelos planos de saúde de todas as técnicas de inseminação artificial.

É verdade que os planos arcam com outros tratamentos da infertilidade, como cirurgias de varicocele (varizes no escroto que prejudicam a quantidade e a qualidade dos espermatozoides) e de endometriose (crescimento anormal de tecido fora do útero), mas, em muitos casos, a FIV é a única esperança do casal.

Em tempos de judicialização da saúde, muitos planos estão sendo obrigados a fornecer tratamento por força de decisões judiciais. Em quase 80% das disputas, os casais têm ganho a causa.

Os juízes entendem que o planejamento familiar inclui tratamentos de fertilidade, como a inseminação e a FIV. 

Enquanto isso, para as operadoras de saúde, as decisões judiciais são equivocadas, já que o procedimento não consta no rol da ANS.

Mesmo com todas essas limitações, estima-se que mais de 500 mil crianças tenham nascido por meio dessa técnica no Brasil desde outubro de 1984, ano em que o país registrou o primeiro nascimento por FIV. No mundo, já são 8 milhões de bebês de proveta.

Além do preço, um outro desafio da técnica é conseguir aumentar a taxa de gravidez com a transferência de um único embrião, para evitar o nascimento de múltiplos bebês. 

Hoje, para aumentar a chance de gravidez, é frequente a transferência para o útero de dois ou mais embriões.

Aliás, o nascimento de múltiplos é apontado como o principal motivo da resistência dos planos em bancar o tratamento de FIV.

Nascimento de múltiplos é quase sinônimo de bebês prematuros, que correm mais riscos de morte e vão ficar dias ou meses em uma UTI neonatal —o que representaria altos custos.

A aposta da ciência está em testes genéticos e outros diagnósticos que permitam a transferência de embriões sem alterações (cromossômicas, por exemplo).

Isso aumentaria não só as chances de gravidez, mas, sobretudo, da gestação de um bebê saudável, que se desenvolva adequadamente e nasça no tempo certo, sem complicações. Para alívio dos pais e dos sistemas de saúde.

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