Descrição de chapéu Coronavírus

Com menos de 50% de isolamento, não haverá leitos suficientes em SP, diz infectologista

Julio Croda, que atua contra coronavírus no estado, diz que países mais organizados viveram caos

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São Paulo

O infectologista Júlio Croda, membro do centro de contingência contra coronavírus de SP, afirmou que o estado caiu do patamar mínimo aceitável para o isolamento social.

Se continuar a atual tendência de redução de isolamento, o estado não terá mais leitos de UTI suficientes para a população, diz Croda. Nesta semana, o estado passou a ter metade dos 12,5 mil leitos de UTI ocupados.

Croda atua na equipe que acompanha dados do isolamento social, feito por meio de telefones celulares. Ele afirma que um algorítimo consegue definir onde é a casa de determinada pessoa e se ela se afastar a determinada distância, passa a contar como alguém que rompeu o isolamento.

Nesta quinta-feira (9), o percentual foi de 48,1%, o mesmo das últimas semanas.

Pesquisador da Fiocruz, Croda se afastou do Ministério da Saúde por divergências internas e se incorporou à equipe do governo de São Paulo no combate ao coronavírus.

Infectologista Julio Croda, que atua no centro de contingência contra coronavírus de SP
Infectologista Julio Croda, que atua no centro de contingência contra coronavírus de SP - Marcelo Camargo/Agência Brasil

Por que o governo de SP estabeleceu a meta de isolamento de 70%?

A gente modelou o cenário A, B e C. A gente utilizou o cenário C, que seria o cenário da Itália, de quarentena. Isso dá uma redução de mobilidade de 70%. Houve uma redução da mobilidade e o número de casos começou a estabilizar, com tendência de queda. A gente fez três cenários A, se não fizesse nada, cenário B, em torno de 50% de redução de mobilidade, e o cenário C, que seria acima de 70%. Quanto maior o nível de isolamento, mais essa curva vai desacelerar.

Como é feito o cálculo do percentual de isolamento?

O aplicativo dos celulares trabalha com as antenas das operadoras. Quando você vai dormir, você deixa o celular parado, teoricamente. Eles trabalham com algorítimos que conseguem identificar onde é a casa baseado na informação que seu celular está parado e não está se movendo. A partir do momento que você saia a mais de 100 metros da sua casa, ele consegue identificar que você saiu de casa. Então, basicamente, o índice de mobilidade é uma média das pessoas que saíram de casa ou não naquele dia específico.

O governo divulgou que estamos com índice abaixo de vários países. Pode citar alguns?

A Itália, a Espanha, o próprio Estados Unidos está com um índice de isolamento um pouco maior que o nosso.

Como funciona esse núcleo do governo que faz essa medição?

Eu faço mais a parte da sáude, da modelagem e existe o número da Secretaria de Governo junto com a Patrícia [Ellen, secretária de Desenvolvimento Econômico] que estão vendo os locais que estão registrando aglomeração. E aí tentando enviar SMS para pessoas que estão naqueles locais para dissipar aquelas aglomerações.

Algumas pessoas começaram a criticar o monitoramento dos celulares, como se fosse uma espécie de espionagem. O senhor viu essa repercussão?

O dado que eu trabalho é o dado agregado por cidade. Esse dado de aglomeração é um dado agregado, que está mostrando que tem mais de 20, 30, 40 pessoas próximas. A gente não tem acesso ao dado individual. A gente não consegue dizer assim: essa pessoa está dentro de casa. O máximo que ele chega é bairro: por exemplo, nesse bairro há muitas pessoas estão fora de casa.

A diminuição do isolamento acendeu um alerta?

O que a gente está tentando avisar para a população é que vai ter aumento do número de casos. A gente aqui no Brasil não é diferente de outros países. Se não houver essa compreensão, lá na frente vai faltar leitos de UTI, de enfermaria e é importante todos terem consciência que o não isolamento vai levar a isso. Vai ser muito difícil o poder público suprir os leitos porque eles não existem, não vai ter como criar esse número de leitos se toda a população voltar a sua vida habitual em termos de mobilidade.

Não adianta responsabilizar só o poder público, porque nem mesmo em países mais organizados como Estados Unidos, como Itália, Espanha, o poder público deu conta do número de pessoas que precisam de unidade de terapia e respiradores. Se não tiver apoio da população, viveremos esse mesmo caos e não vai ter ninguém para responsabilizar. A população será responsabilizada como sociedade por não adesão às medidas.

O Brasil não começou a se isolar antes que os países que o senhor citou?

Foi antes, a gente isolou antes. Mas agora a gente está perdendo todo esse isolamento. Então não adianta ter isolado antes, se agora está todo mundo indo para a rua. Todo ganho de ter começado antes vai se perder muito rapidamente se todo mundo voltar às atividades habituais.

Em quanto tempo saberemos as consequências?

De duas a três semanas. Você pode pegar Manaus, que teve um isolamento social que não teve adesão importante da população, está vivendo um caos que não terá solução nos próximos dias.

Esse isolamento chegou a 49%. Passamos do patamar aceitável?

Acho que pelo menos acima de 50% é importante que a gente mantenha. O governador fala 70%, mas entre 50% e 70% a gente teria condições de dar conta da necessidade de leitos. Abaixo de 50% provavelmente não. Ontem o estado marcou 48,1%, o índice mais baixo nas últimas duas semanas e meia. Tem uma tendência de queda. Isso é preocupante.

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