O que 635 epidemiologistas planejaram fazer neste Dia de Ação de Graças nos EUA

Apenas 21% dos entrevistados disseram que fariam a refeição com pessoas de fora de sua família

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Claire Cain Miller Margot Sanger-Katz Quoctrung Buithe
The New York Times

A família de um epidemiologista pretendia festejar este Dia de Ação de Graças numa garagem, com mesas posicionadas a três metros uma da outra e a porta aberta. A família de outro epidemiologista abriria mão da refeição tradicional, optando em vez disso por brindar com vizinhos ao ar livre com sidra quente. Um terceiro epidemiologista planejava jantar numa tenda ao ar livre, com aquecedor, umidificador e purificador de ar ligados.

E, segundo pesquisa informal realizada pelo New York Times com 635 epidemiologistas, a grande maioria deles não vai festejar este dia com pessoas com quem não vive. Especialistas em saúde pública de diversas especialidades responderam ao nosso questionário. Nem todos estudam a Covid-19, mas todos têm formação profissional que lhes permite avaliar a disseminação e o risco de doenças.

Entre os entrevistados, 79% disseram que dividiriam seu almoço ou jantar de Dia de Ação de Graças com as pessoas com quem dividem sua casa, ou com ninguém. Apenas 21% disseram que fariam a refeição com pessoas de fora de sua família, e, na maioria desses casos, eles descreveram cuidados especiais que tomariam para fazê-lo em segurança. As respostas são semelhantes às que eles deram em relação a outros feriados do inverno no hemisfério norte, como o Natal e o Hanukah.

Cerca de 8.000 epidemiologistas foram convidados a participar da pesquisa, que foi circulada por email entre os membros da Sociedade de Pesquisas Epidemiológicas e cientistas individuais.

A temporada de festas de fim de ano está chegando enquanto o coronavírus se alastra pelos Estados Unidos com força renovada; nos últimos 14 dias o número de casos subiu 77% e o de mortes, 52%. Na quinta-feira (19) o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) aconselhou os americanos a evitar viagens e festejar o feriado apenas com as pessoas com quem vivem na mesma casa. Epidemiologistas estão tomando essas mesmas decisões pessoais, mas munidos de conhecimentos especializados adicionais.

Homem usa visor protetor contra a Covid-19 enquanto caminha pelas ruas fechadas para o desfile de Thanksgiving da Macy's em Nova York - Reuters

“Por mais difícil seja não estar com a família e amigos em ocasiões como essas, respeitamos o vírus e sabemos que nenhum sistema ou nível de proteção pessoal é perfeito”, disse Bruce Copley, epidemiologista que trabalha como consultor particular e não pretendia festejar o Dia de Ação de Graças com ninguém fora de sua família imediata.

Outra epidemiologista, Kendra Sims, doutoranda da Oregon State University, resolveu abrir mão de qualquer jantar especial de Dia de Ação de Graças este ano. “Nada tem sabor tão bom quanto a sensação de estar em segurança”, ela disse.

Algumas pessoas se organizaram com familiares ou amigos para cozinhar pratos diferentes, as pessoas trocarem seus pratos e então voltarem para casa para comer sozinhas. Outras estão se isolando, sem contato algum com outras pessoas, por 14 dias ou mais antes do feriado, além de fazer vários testes de coronavírus. Outros ainda estão convidando apenas as pessoas com quem dividem sua “bolha” de isolamento. Uma epidemiologista disse que redigiu uma “Constituição de atividades permissíveis”, para garantir que todos sigam as mesmas regras. Muitos vão festejar o Dia de Ação de Graças pelo Zoom.

“Moro sozinho”, disse Bill Strohsnitter, professor associado da Escola Médica da Universidade do Massachusetts. “Geralmente tenho onde ir para o Dia de Ação de Graças, mas neste ano pretendo ficar em casa e apenas falar com familiares e amigos pelo Skype ou o Zoom. Deve ser para isso que a NFL nos deu todos os jogos do ‘Dia do Peru’.”

Os epidemiologistas destacaram que suas decisões dependem de diversos fatores, incluindo o nível do vírus na área onde vivem, o grau de isolamento das pessoas com quem poderiam se reunir e a possibilidade de fazerem a refeição da maneira mais segura, por exemplo ao ar livre.

“Vamos festejar o Dia de Ação de Graças ao ar livre, usando mesinhas e aquecedores portáteis”, contou Erin C. Dunn, professora adjunta da Escola Médica de Harvard.

Os epidemiologistas também estão levando circunstâncias pessoais em conta. Vários deles disseram que iam convidar pessoas solteiras para dividir o jantar com eles, ou então estudantes universitários que voltaram para casa ou parentes que enviuvaram recentemente. Alguns disseram que estavam buscando uma maneira segura de se reunirem no Dia de Ação de Graças pelo bem de sua própria saúde mental.

“Os doutorandos são pessoas solitárias”, explicou Nina Masters, doutoranda da Universidade do Michigan, que pretende viajar de Ann Arbor a Nova York para encontrar seus pais. “Vou me isolar preventivamente antes por três semanas, um tempo acima do normal, por via das dúvidas.”

Outros disseram que sua decisão foi baseada em suas próprias preocupações de saúde ou na idade ou problemas de saúde de seus familiares.

“Rever a família é algo que nos reenergiza e traz alegria”, disse Danielle Gartner, pesquisadora da Michigan State University. Mas ela está grávida, e disse que está levando em conta os riscos à sua própria saúde e à do bebê. “Em vista do aumento dos casos no Michigan, decidimos que seria melhor cancelar nossos planos de nos reunirmos cara a cara. Isso vai valer também para o Natal.”

Outros disseram que, como especialistas em saúde pública, com conhecimento profundo de como as ações de um indivíduo podem colocar a comunidade maior em risco, acharam que era seu dever cancelar planos para o Dia de Ação de Graças ou que não haviam feito planos, para começo de conversa.

“Cada pessoa precisa fazer sua própria parte pelo bem maior e a saúde pública de nossa família, vizinhos, desconhecidos e sobretudo dos profissionais de saúde e outros que têm que continuar a prestar atendimento ao público”, disse Anna Gorczyca, professora e pesquisadora assistente do Centro Médico da Universidade do Kansas.

Vários epidemiologistas estão ressaltando que é um sacrifício de curto prazo, porque as notícias recentes sobre vacinas altamente eficazes sugerem que na próxima temporada de festas do fim do ano, ou mesmo antes, vai ser possível se reunir com outros em segurança.

Mollie Wood, professora de epidemiologia na Universidade do Cincinnati, pensou na possibilidade de fazer uma viagem de carro de nove horas para ver sua mãe, mas optou por esperar.

“Sinto tanta saudade dela, mas não consegui me convencer que haveria uma maneira de ir em segurança”, ela disse. “Então este ano vamos conversar por vídeo no Dia de Ação de Graças e fazer planos para uma festa grande no ano que vem.”

Tradução de Clara Allain

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