Veja 12 mitos e verdades sobre pessoas com autismo

Cada vez mais pessoas recebem o diagnóstico, mas ainda há muitas dúvidas sobre o transtorno

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São Paulo

O aumento de diagnósticos de TEA (transtorno do espectro autista) ampliou o interesse sobre autismo. Se em 1992 o CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças) americano estimava a prevalência do transtorno em 1 a cada 150 crianças, em 2018 a proporção chegou a 1 em 44. E esse número continua a subir.

Para especialistas, a alta está relacionada a aspectos como mudanças nos critérios de diagnóstico e a profissionais capacitados. Vincula-se ainda a famílias mais bem informadas, embora ainda existam muitas dúvidas sobre o transtorno, caracterizado por déficits persistentes na comunicação e na interação social bem como em padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades.

Para responder a 12 questões acerca de mitos e verdades sobre o autismo, a Folha conversou com Carlos Takeuchi, neurologista pediátrico do Hospital Sabará e do Instituto Pensi (Pesquisa e Ensino em Saúde Infantil), Daniela Bordini, psiquiatra e coordenadora do TEAMM, centro especializado em TEA da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e Karla Maria Nunes Ribeiro, psiquiatra e professora da UFS (Universidade Federal de Sergipe).

Carrinhos de brinquedo enfileirados
É comum crianças com autismo organizarem objetos e brinquedos - Zanone Fraissat/Folhapress

TEA é uma doença?

Resposta: Mito

Entende-se que pessoas com TEA têm um funcionamento cerebral diferente e, na psiquiatria, ele é considerado um transtorno do neurodesenvolvimento. "Quando falamos em doença, estamos tratando de algo com causa reconhecida e específica. No TEA, a causa é multifatorial, vai desde aspectos genéticos até questões neurológicas e ambientais", afirma Karla Ribeiro.

O diagnóstico de TEA deve ser dado por um médico?

Resposta: Verdade

Profissionais como psicólogos e fonoaudiólogos podem suspeitar do transtorno e encaminhar para um neurologista ou psiquiatra, que fecha o diagnóstico.

Mais crianças vêm sendo diagnosticadas com o transtorno?

Resposta: Verdade

"O DSM-5 [Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Americana de Psiquiatria] trouxe critérios de diagnóstico diferentes. Além disso, os médicos estão sendo mais bem treinados, e as famílias têm mais acesso a informação. Não é uma moda. É um problema de saúde pública, e um problema de saúde grave porque é um paciente para o resto da vida", diz Carlos Takeuchi.

Segundo Daniela Bordini, nunca se falou tanto sobre autismo, inclusive por meio de produções audiovisuais, e profissionais de saúde modificaram seu olhar. "Antes, pensávamos nos quadros clássicos e hoje temos uma noção do espectro mais ampliada. Temos diagnosticado pessoas com sintomatologia mais sutil que antes não eram englobadas."

Se a criança não olha nos olhos, é autista?

Resposta: Depende

Embora essa característica possa suscitar a suspeita do transtorno, ela não está presente em todos os casos. "Precisamos de um conjunto de sintomas para fechar o diagnóstico", ressalta Bordini.

"Quando uma pessoa chega perto de um bebê de três, quatro meses, ele costuma olhar e retribuir com um sorriso. Por volta dos seis, sete meses, a depender de quem se aproxima, ele chora ou olha para os pais em busca de segurança. Alguns pacientes com autismo já não fazem isso desde muito novos, enquanto muitos perdem esse comportamento por volta de 1 ano. Eles vão interagindo cada vez menos até que deixam de olhar ou até olham, mas não fixam no interlocutor", exemplifica Takeuchi.

Crianças que andam nas pontas dos pés são autistas?

Resposta: Depende

É muito comum a criança com TEA andar nas pontas dos pés, mas não é porque uma criança faz isso que é autista. Ela pode ter esse comportamento por outro problema de saúde ou mesmo por uma questão de fase do desenvolvimento típico.

Crianças que organizam brinquedos ou outros objetos são autistas?

Resposta: Depende

Ordenar objetos por tamanho, cor, forma geométrica ou textura é comum, mas não significa necessariamente estar no espectro. "Crianças com características obsessivas e mais perfeccionistas também podem ter esse comportamento. O que vemos no paciente com TEA é um comprometimento na capacidade de brincar de maneira imaginativa, criativa, e alguns têm essa característica de enfileirar", conta Ribeiro.

Muitas crianças com TEA não toleram substâncias pegajosas?

Resposta: Verdade

"Gelecas e slime são absolutamente insuportáveis para muitas das crianças com autismo. Às vezes, elas também não gostam de areia de praia, alimentos pegajosos ou com muito molho. Tudo que é mais úmido gera certa intolerância", diz Takeuchi. A sensibilidade no tato também pode dificultar o uso de algumas roupas e o manuseio de determinados objetos.

Pessoas com espectro autista não gostam de barulho?

Resposta: Depende

É muito comum haver intolerância a ruídos, mas por outro lado há crianças com o transtorno que ficam próximas à caixa de som em eventos ou mesmo que têm fixação pelo barulho do ventilador ou do liquidificador, por exemplo.

É comum crianças autistas gostarem de girar objetos e de se locomover pelo ambiente sem objetivo definido?

Resposta: Verdade

Elas podem pegar um carrinho ou velocípede, virar de ponta-cabeça e ficar girando as rodas. Também é frequente a presença de movimentos repetitivos, como andar de um lado para o outro sem propósito, girar no próprio eixo e pular no mesmo lugar.

Todas as pessoas com TEA têm inteligência acima da média?

Resposta: Mito

Alguns pacientes podem apresentar inteligência superior, enquanto outros estão na média ou mesmo têm deficiência intelectual. "Cerca de metade das pessoas com autismo têm inteligência preservada, mas na outra metade temos deficiência intelectual leve, moderada e mesmo grave. Às vezes, a mídia passa a imagem de gênios com altas habilidades que se destacam em uma área de interesse, mas há uma grande parcela com deficiência intelectual associada, dificuldade acadêmica e maior sofrimento", afirma Bordini.

"É muito complicado avaliar isso. Imagine, por exemplo, um professor universitário bem-sucedido academicamente que não entende quando você pede para ele pegar um prato de comida na geladeira porque, para ele, lugar de prato é no armário. Ele é inteligente? O conceito de inteligência nessa situação é mais difícil", coloca Takeuchi.

A medicação é necessária em todos os casos?

Resposta: Mito

O TEA é um quadro cujo tratamento é a estimulação precoce com acompanhamento multidisciplinar com profissionais como fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional e assistente terapêutico. Não há remédio para o transtorno. A medicação serve apenas para tratar sintomas como agressividade e dificuldade para dormir.

Existe remédio para curar o transtorno?

Resposta: Mito

Os especialistas são taxativos: não há cura. "Se falam que um paciente 'saiu do espectro' é porque o diagnóstico foi feito de maneira equivocada. Não existe 'sair do espectro'. A criança pode evoluir significativamente e o grau de autonomia dela pode chamar atenção, mas o autismo não tem cura. Temos de tomar cuidado com tratamentos milagrosos", alerta Ribeiro.

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