Descrição de chapéu 4º Fórum Inovação Educativa

Tecnologia e protagonismo juvenil mudam escola na Rocinha

Sem salas por idade, alunos participam da gestão das redes sociais e do conselho da escola

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Rio de Janeiro

“Vocês estão ouvindo? É a hora do recreio”, diz Aline Cypreste. Ela aponta uma janela na sala da diretoria do colégio. Dali é possível ver um pátio com jovens.

Eles conversam, leem, jogam futebol, desenham e usam o celular. “Não tem zoeira”, diz a coordenadora pedagógica.

A Escola Municipal André Urani fica na Rocinha, maior favela do continente. Atende 240 estudantes do 7º ao 9º ano. É a única no Rio e uma das seis no Brasil a integrar o programa Inova Escola, da Fundação Telefônica Vivo.

Inaugurada em 2011, a André Urani ingressou no programa e virou “Gente” em 2013. É a sigla de Ginásio Experimental de Novas Tecnologias Educacionais, cuja meta é juntar tecnologias de informação e comunicação com a sala de aula.

Daí vieram o uso rotineiro da ferramenta Google Classroom e de software com plano de estudo personalizado e o desenvolvimento de projetos como a Árvore de Livros, um acervo digital de publicações.

“O projeto integra professores, aulas, disciplinas. Se alguém tem dificuldade, ajudo com o que temos no espaço físico e na árvore digital”, diz Fernanda Monteiro, que coordena a sala de leitura.

Quem explica como tecnologia e inovação funcionam na escola são os alunos, que apresentam o prédio ao repórter.

No terceiro andar estão o salão verde, com laboratórios para português, história, ciências e matemática, e o amarelo, destinado à mentoria.

Sem a divisão clássica de turmas, os alunos se reúnem em times ou famílias, depende da atividade. Os grupos misturam colegas do 7º, 8º e 9º ano.

“Nos reunimos para fazer os deveres. Em vez de levar para casa, a gente faz aqui, com auxílio dos professores”, diz Lóren Basílio, 14, do no nono ano. Ela guia o tour pela escola junto com Matheus Barros, 14, de uma turma abaixol. 

“Nas famílias, as pessoas se ajudam, e esse é mais um momento de convivência”, diz o estudante. Segundo ele, a adoção do modelo inibe formação de panelinhas e bullying.

Maria Leonarda da Silva, 15, se junta aos amigos. Ela, também do último ano, faz uma disciplina eletiva de audiovisual. Edita vídeos, postados quase diariamente na página do Gente no Facebook. 

É na rede, também, que estão os produtos de um estudo desenvolvido ao longo do ano, intitulado Africanidades. Distribuídos em times, os adolescentes fizeram trabalhos para diferentes mídias sobre cultura e história negra.

No ano que vem, junto com Lóren e outras cinco colegas, Maria vai cursar o ensino médio com bolsa integral em uma escola particular, depois de um extenso processo seletivo. 

Sua aprovação é uma evidência apontada pela coordenadora para atestar o sucesso desse formato entre os meios tradicionais de verificação da qualidade do ensino.

O protagonismo do aluno e a liberdade podem confundir os novatos. Por isso, uma semana antes do início das aulas acontece o acolhimento. O nono ano, o grêmio estudantil e o CEC - Conselho Escola Comunidade ajudam os calouros a se familiarizar com os professores e o sistema, explica Matheus. 

O Conselho Escola Comunidade é uma instância de deliberação que reúne alunos, responsáveis e instituição para aperfeiçoar as atividades de ensino e resolver problemas.

Problemas não faltam. Em setembro de 2017, a disputa pelo comando do tráfico na Rocinha afetou a rotina. Com os tiroteios, as aulas foram suspensas. A escola utilizou redes sociais para se comunicar com seus alunos e com outras unidades de ensino da comunidade, mantendo o monitoramento e seguindo protocolos de segurança.

A escola está entre as 10% com melhor rendimento na rede municipal do Rio, apesar de não ter batido as metas para 2015 e 2017 nas medições do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica).

“Em 2017, conseguimos aumentar o Ideb, mesmo estando em área conflagrada num período difícil”, diz a diretora, Marcela de Oliveira.

O Gente tem uma preocupação específica com o futuro dos alunos, que necessariamente deixam a escola ao fim do ensino fundamental.

No projeto intitulado Vida, os garotos discutem temas que eles mesmos propõem e os preocupam, como política, sociedade, sistemas econômicos, sexualidade, religião. “Aqui a gente é livre para debater, não tem tabu”, diz Lóren. 

Nas reuniões do Conselho Escola Comunidade, os alunos não são apenas ouvidos. Já entenderam que tanto na escola como fora têm um papel ativo. “A gente não tem vida fácil. Quando há algum problema, a coordenadora, a vice-diretora ou a diretora chega e fala: ‘e aí, o que vocês vão fazer?’”, diz Matheus.

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