Descrição de chapéu The New York Times feminismo

Futebol dos EUA puxa fila de reivindicações femininas no esporte 

Seleção feminina impulsionou luta de mulheres de diferentes modalidades

Andrew Das
Nova Jersey | The New York Times

Dois anos depois que começaram a lutar em público pela igualdade de pagamento e um ano depois que assinaram um novo contrato coletivo de trabalho, as integrantes da seleção feminina de futebol dos Estados Unidos emergiram como um novo tipo de exemplo, e um recurso surpreendentemente valioso, para equipes esportivas femininas de todo o planeta.

A seleção feminina canadense pediu conselhos sobre como incluir licença-maternidade remunerada nos contratos das jogadoras. As atletas da WNBA, a liga feminina de basquete profissional dos Estados Unidos também pediram ajuda sobre como pressionar os proprietários das equipes pela adoção de padrões unificados para toda a organização quanto a questões como viagens, acomodações e preparação física. E no final do ano passado, uma jogadora da seleção de hóquei feminina de hóquei sobre o gelo dos Estados Unidos entrou em contato para pedir orientação.

Faltando poucos meses para a abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno de Pyeongchang, a federação da modalidade, USA Hockey, continuava a enrolar quanto ao cumprimento de promessas sobre marketing que haviam sido feitas quando as jogadores ameaçaram greve, em março de 2017, em busca de um grande aumento de salário. A equipe, que estava cotada para a medalha de ouro na olimpíada, não tinha nem mesmo contas oficiais de mídia social. O sindicato das jogadores de futebol teria algum consultor de marketing a recomendar, que fosse capaz de fazer aquilo que a federação aparentemente não queria fazer?

"Creio que estamos vivendo um momento de união das mulheres, e isso está acontecendo no esporte e fora dele", disse Christen Press, meio-campista da seleção americana de futebol. "E creio que as pessoas de todo o mundo estão percebendo o quanto é importante formar conexões com aqueles que estão na mesma jornada que elas".

Por isso, quando as jogadores da seleção de futebol dos Estados Unidos abraçaram as jogadoras da seleção de hóquei do país antes de entrar em campo para um empate por um a um com a França na Red Bull Arena, os abraços trocados entre as campeãs da Copa do Mundo de futebol e as atletas que recentemente conquistaram o ouro em Pyeongchang pareciam mais genuínos, emotivos e pessoais do que costuma ser o caso.

A busca de apoio por atletas e equipes de outras modalidades assume muitas formas. A ajuda pode ser solicitada em mensagens de texto enviadas por colegas de equipe ou amigas de diferentes países, ou em telefonemas ao sindicato. As jogadores de futebol expressam apoio à luta de outras equipes, ou alardeiam suas vitórias, recorrendo às suas contas de mídia social, que contam com muitos seguidores.

E aos poucos, outras atletas de todo o mundo parecem ter começado a encontrar voz.

A seleção feminina da Espanha se rebelou e exigiu a demissão de seu treinador, depois da última Copa do Mundo, e diversas jogadores importantes da seleção brasileira deixaram a equipe no ano passado em protesto contra a demissão de uma treinadora cujo trabalho elas apreciavam, e que foi substituída por um homem. As jogadores da Nigéria realizaram um protesto em seu hotel, para exigir o pagamento de salários e bonificações atrasados, depois de vencerem um torneio africano de seleções. A seleção feminina irlandesa ameaçou uma greve. A da Austrália fez uma greve. E em outubro as jogadoras norueguesas exigiram - com sucesso - que seu pagamento fosse equiparado ao dos jogadores da seleção masculina.

"Parece que estamos realmente vivendo uma virada", disse Julie Foudy, comentarista da ESPN e veterana de disputas semelhantes pela igualdade entre os sexos travadas uma geração atrás, quando ela fez parte de uma equipe que ganhou a Copa do Mundo feminina.
 

Foudy elogiou a nova diretora executiva do sindicato, Becca Roux, por permitir que as jogadores da seleção feminina norte-americana participassem da luta diretamente, tanto na negociação de um novo contrato coletivo de trabalho, com termos muito melhores, quanto nos meses que se seguiram à assinatura da nova convenção. A maioria das integrantes da seleção serve em um ou mais dos subcomitês do sindicato, e elegem representantes para ele. A organização realiza reuniões regulares com a U. S. Soccer, a federação norte-americana de futebol, para verificar que as promessas estejam sendo cumpridas.

"Acho que essa é provavelmente a parte mais gratificante do processo", disse Foudy sobre o crescimento da força da seleção feminina norte-americana em assuntos extracampo. "Elas começaram a perceber e a prestar atenção ao que está acontecendo, e a decidir em que direção querem que as coisas caminhem, em que direção querem que a liga avance. É um exercício imensamente saudável."

O progresso conquistado pelo futebol feminino norte-americano não passou despercebido por outras atletas, que usam a organização criada nesse esporte como modelo para sua luta. No segundo trimestre do ano passado, as jogadores de hóquei foram um dos grupos mais proeminentes a buscar ajuda —antes, durante e depois de sua disputa com a USA Hockey por salários e condições de trabalho melhores. As jogadoras de hóquei sobre o gelo foram além de suas colegas do futebol —ameaçaram boicotar o campeonato mundial se suas demandas não fossem atendidas—, e por fim saíram vitoriosas.

"É sempre ótimo quando mulheres apoiam mulheres", disse Gigi Marvin, que defendeu a seleção feminina de hóquei sobre o gelo dos Estados Unidos em três olimpíadas de inverno. "Mas acho que esse é um apoio ao que é certo, ao que é justo e correto, de uma pessoa a outra".

"Não vou desfrutar dos benefícios do que conseguimos realizar", ela disse, "mas minha sobrinha vai. Minhas primas que jogam torneios infantis vão".

Para todas as seleções, porém, as carreiras das atletas e as ambições de títulos continuam a ser prioridade. O jogo de futebol do domingo representou uma nova oportunidade para que o grupo de aspirantes a vagas na seleção norte-americana conquistasse a confiança da treinadora Jill Ellis, que está começando a montar seu time para a Copa do Mundo de 2019 na França.

Ellis já convocou 58 jogadoras para treinar com a seleção, desde o final da Olimpíada do Rio, em 2017, 27 das quais pela primeira vez. A equipe titular do domingo incluía não só titulares prestigiadas como Megan Rapinoe, Alex Morgan e Mallory Pugh, mas também Tierna Davidson, 19, zagueira da Universidade Stanford, e Andi Sullivan, 22, meio campista selecionada em primeiro lugar no draft da National Women's Soccer League americana este ano.

As grandes jogadas continuam a vir principalmente de rostos conhecidos —o gol dos Estados Unidos nasceu de uma falta sofrida por Kelley O'Hara, batida por Rapinoe; Pugh aproveitou o rebote—, mas amistosos como os realizados contra a França no domingo e, contra a Alemanha na semana passada, e como o que acontece nesta quarta-feira em Orlando na Flórida, contra a Inglaterra, são bons para todos.

"Somos testadas, somos desafiadas, aprendemos a lidar com os altos e baixos do jogo", disse Ellis. "É por isso que realizamos esses amistosos, para dar esse tipo de experiência às jogadoras".

Fora de campo, o trabalho também continua. A seleção feminina recentemente selecionou O'Hara para se unir a Press e Becky Sauerbrunn como parte de seu comitê executivo de três integrantes, e Rapinoe e Meghan Klingenberg assumiram papéis de liderança na busca de novas fontes de receita de licenciamento da imagem da equipe, independentemente da U. S. Soccer, com a ajuda de uma empresa de marketing que o sindicato criou em parceria com os sindicatos que representam os jogadores de futebol americano da NFL e as jogadoras da WNBA.

Mas todas elas sabem que as mensagens e telefonemas de outras atletas, de outras seleções nacionais e até de outras modalidades continuarão. E sabem também que muitas dessas organizações ainda têm um longo caminho a percorrer.

A seleção feminina de futebol da Irlanda ameaçou deixar de jogar algumas partidas no ano passado porque, entre outras coisas, as jogadoras estavam cansadas de dividir agasalhos com as equipes das categorias de base. E em setembro, uma jogadora da seleção argentina revelou que ela e suas companheiras de equipe recebem pagamento base de apenas 150 pesos (US$ 8,50) por sessão de treino.

"Boa parte do trabalho que fazemos para o sindicato é em nosso benefício", disse Press. "Mas há sempre o lado contextual, a esperança de que aquilo que fazemos em nossa defesa sirva como bom exemplo".

"É agradável pensar que elas se inspiram em nós, nós nos inspiramos nelas, e isso torna todas nós mais poderosas", ela disse.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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