Descrição de chapéu The New York Times

Ex-técnico do Brasil no hipismo é banido por suspeita de abuso

George Morris foi medalhista olímpico e treinou seleções americana e brasileira

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Sarah Maslin Nir
Nova York | The New York Times

Ex-treinador das equipes olímpicas de hipismo do Estados Unidos e do Brasil, George Morris, foi excluído permanentemente do esporte depois de uma investigação sobre “delitos de conduta sexual envolvendo menores de idade”.

A Federação Equestre dos Estados Unidos havia excluído Morris provisoriamente em agosto. O Centro para o Esporte Seguro do Estados Unidos, a organização encarregada de investigar incidentes de conduta nos esportes olímpicos, tornou a exclusão permanente, na segunda (18). Não cabe mais recurso de acordo com as normas da entidade.

“Não importa o quanto uma figura seja grande em seu esporte, ou há quanto tempo tenha acontecido o caso que gera acusações, ninguém está acima de prestar contas”, afirmou Ju’Riese Colón, a diretora-executiva do Centro para o Esporte Seguro, em comunicado. “Os atletas e demais participantes do esporte precisam se sentir empoderados para defender o que é certo e se pronunciar contra aquilo que sabem que está errado”.

Morris foi o técnico da seleção brasileira de hipismo na Olimpíada do Rio, em 2016. 

George Morris, ex-treinador das equipes de hipismo do Brasil e dos EUA
George Morris, ex-treinador das equipes de hipismo do Brasil e dos EUA - Reprodução

A exclusão de Morris surgiu depois que pelo menos duas pessoas se apresentaram para denunciar que haviam sido vítimas de Morris quando menores de idade, ao longo da carreira dele como treinador. As acusações, referentes primordialmente a casos acontecidos nas décadas de 1960 e 1970, resultaram em uma investigação que se estendeu por meses, pelo Centro para o Esporte Seguro.

As constatações dessa investigação, cujos detalhes o centro mantém em segredo para proteger as vítimas, justificavam uma exclusão permanente, disse Colón. Essa é a punição mais forte que o centro impõe e uma medida “que não é tomada de modo leviano”, ela disse.

“O processo é rigoroso e inclui muitas cláusulas para garantir justiça tanto aos queixosos quando às partes acusadas, que têm amplas oportunidade de falar em sua defesa, oferecer provas, buscar assistência legal e ser ouvidas diante de outro órgão independente”, completou.

A decisão de confirmar a exclusão de Morris surgiu depois de diversos dias de procedimentos acalorados nos quais Morris, seus acusadores e seus defensores depuseram diante de uma comissão independente de arbitragem em Manhattan.

A exclusão provisória inicial causou furor no mundo do hipismo, onde bonecos de Morris são itens de coleção e seus livros sobre equitação são como o evangelho do esporte. Muitos cavaleiros, entre os quais alguns dos maiores astros do esporte, saíram em defesa do treinador, denegrindo os acusadores anônimos online ou descrevendo experiências positivas de treinamento sob a tutela de Morris, em fóruns online ou nos vastos grupos de simpatizantes de sua causa surgidos no Facebook.

“As vítimas nesses casos não só sofreram o abuso que denunciaram como em muitos casos sobreviveram a ataques incontáveis, mesmo em seu esporte, por terem a coragem de falar”, disse Colón. “Uma resposta como essa é errada em muitos níveis, incluindo o fato de que volta a tornar vítimas aqueles que já sofreram mais do que qualquer pessoa deveria”.

Morris, 81, conquistou uma medalha de prata no hipismo na Olimpíada de Roma, em 1960, antes de se tornar treinador das equipes olímpicas dos Estados Unidos e do Brasil.

Ele não respondeu a um pedido de comentário.

“A decisão de hoje é resultado do processo do centro, e respeitamos sua decisão”, disse Bill Moroney, diretor-executivo da federação equestre, em comunicado.

No cenário desafiador da investigação de acusações de abuso sexual, especialmente de casos ocorridos décadas atrás, o caso de Morris se destacou por suas profundas complicações.

Só um dos acusadores de Morris revelou sua identidade publicamente: Jonathan Soresi, ex-aluno e ex-treinador assistente de Morris, e ele mesmo criminoso sexual registrado. Em 2007, Soresi se declarou culpado por uma acusação criminal de posse de pornografia infantil. Ele também foi excluído do esporte pelo mesmo centro, mas teve sua licença restaurada na semana passada.

“As transgressões do meu passado não invalidam a realidade do que me aconteceu”, disse. “Existe uma certa simplicidade na verdade, e a verdade foi contada, nesse caso. Minha esperança é que a verdade resulte em cura”, completou

A exclusão abalou um mundo insular e rarefeito que já havia sofrido abalo com revelações de abusos sexuais por parte de outros luminares. Em junho, Robert Gage, um treinador radicado na Califórnia, se matou, em meio a um processo no qual combatia a suspensão imposta pelo Centro para o Esporte Seguro por delitos de conduta sexual com diversos menores de idade.

Uma investigação do The New York Times em 2018 revelou que Jimmy Williams, um dos mais famosos treinadores de hipismo americano, que morreu em 1993, havia abusado de muitas das crianças que treinou em seus 50 anos de carreira.

“Com certeza foi difícil acompanhar o que estava acontecendo, em diversos momentos. Eu precisei me desconectar de tudo. A parte mais triste é o ataque às vítimas, a descrença”, disse Anne Kursinski, que participou de cinco olimpíadas e revelou no ano passado ter sofrido abusos da parte de Morris, quando era menor de idade.

Como adulta, ela foi treinada por ele em diversas olimpíadas e lhe atribui o crédito por “me colocar no mapa”. Ela disse que jamais testemunhou abusos cometidos por Morris contra outras pessoas.

“Tudo que ele realizou em sua carreira não pode ser tirado dele, as medalhas que conquistou, as pessoas que treinou”, disse Kursinski, ao ser informada da exclusão. “Mas se as outras coisas são verdade, elas também são verdade”, ela acrescentou.

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