Descrição de chapéu
Maradona (1960-2020)

O dia em que usei o Corinthians para tietar Maradona

Argentino, perfeito no campo e imperfeito fora dele, foi certamente o maior personagem do esporte

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Brasília

Dia 27 de novembro de 1988, estádio San Paolo, Série A do Campeonato Italiano. O Napoli, de Maradona, encara o Milan, de Van Basten, Rijkaard, Baresi, Costacurta, Maldini.

A partida já passava dos 40 do primeiro tempo. Crippa encontra espaço na zaga milanesa e lança para Diego. A cena é uma pintura em câmera lenta. A bola quica uma vez. Só uma.

O goleiro Galli vai para cima de Maradona. E para. Um jogador humano ali, com a camisa do Napoli, chutaria a bola por cima, a dominaria com o pé, ou mataria no peito.

De cabeça (!), de fora da grande área (!), Maradona encobre Galli. A bola bate uma, duas, três vezes no campo até encostar na rede. O Napoli humilhou o poderoso Milan naquele dia: 4 a 1.

Maradona fez o gol mais bonito de uma Copa do Mundo —e o mais roubado. Em 1985, pelo Napoli contra a Lazio, talvez tenha sido o seu mais belo na quesito "encobrindo um goleiro’ (OK, aceita-se também o contra o Verona naquele mesmo ano).

Em duelo com River, em 1981, pelo Boca, driblou o goleiro, o zagueiro e só rolou para as redes.

Maradona foi amado por uma pequena parte da Itália –odiado por outra maior. Chorou como uma criança a perda da final da Copa de 1990 para a Alemanha (beneficiada por um pênalti inexistente).

Toda criança sonha, tem ídolos. Na infância dos anos 1980, eu sonhava em jogar futebol no Napoli de Diego, Careca, Alemão, Zola e Ferrara, que brilhava nas manhãs de domingos da TV Bandeirantes.

Diego Armando Maradona, no Napoli, em álbum de figurinhas da Panini
Diego Armando Maradona, no Napoli, em álbum de figurinhas da Panini - AFP

E não entendia direito por que Maradona não poderia jogar no Corinthians.

Quando o encontrei no camarote da Sapucaí, no carnaval de 2006, tietei, fui chato, o interrompi no meio do desfile da Beija-Flor.

Falei que era corintiano (uma forma de puxar assunto já que, na ocasião, Tevez era a maior estrela alvinegra).

Maradona, embriagado pelo chope do camarote, parecia animado com o papo (juro), me deu um cumprimento efusivo (juro). Topou uma foto e, na saída do desfile, autografou minha camiseta, que jamais lavei desde então.

Maradona exibiu a perfeição dentro de campo –e esbanjou a imperfeição fora dele.

Envolveu-se lamentavelmente com a máfia italiana, como retrata bem o documentário de Asif Kapadia, dando início à sua derrocada. Viveu e enfrentou com coragem o drama do vício.

Frustrou e decepcionou gerações de apaixonados por futebol que acreditavam (na verdade, torciam por) na sua redenção em campo, como na Copa de 1994.

Se Maradona foi o melhor ou não de todos os tempos, pouco importa agora. Certamente, o maior personagem do esporte.

E ele fez aquele gol de cabeça, de fora da área, contra o Milan.

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