Descrição de chapéu Tóquio 2020

Mulheres foram de 0% a quase metade das Olimpíadas; conheça dez atletas de destaque

Tenista Naomi Osaka e trio de skatistas brasileiras são algumas das esportistas no páreo

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Skatista brasileira Rayssa Leal durante treino nos Jogos Olímpicos Tóquio 2020
Skatista brasileira Rayssa Leal durante treino nos Jogos Olímpicos Tóquio 2020 - Gaspar Nobrega 20.jul.2021/COB
São Paulo

Os primeiros Jogos Olímpicos da modernidade, na Atenas de 1896, eram testosterona pura. Atribui-se a seu idealizador, o barão francês Pierre de Coubertin, a sentença furada: "Uma Olimpíada com mulheres seria impraticável, desinteressante, sem estética e imprópria".

Na primeira edição em que puderam participar, em 1900, as mulheres eram 2% dos competidores e mesmo assim só podiam disputar poucos e "gentis" esportes, como tênis e golfe. Cento e vinte e um anos depois, elas ficam próximas da igualdade e são 48,8% dos aspirantes a medalhista. Conheça dez esportistas que, independentemente de conseguir subir ao pódio, já entram vitoriosas em Tóquio.

Naomi Osaka (Japão)
Antes de acender a pira olímpica na abertura dos Jogos, a tenista de 23 anos já havia ateado fogo na imagem do atleta alienado. Filha de pai haitiano e mãe japonesa, Osaka é o que japoneses chamam de “hafu”, ou birracial, não sem algum carga de discriminação.

A número dois no ranking mundial, ganhadora de quatro Grand Slams, é aguerrida também fora das quadras. Usou sete máscaras no U.S. Open, cada uma com o nome de uma vítima negra do racismo no país-sede do torneio, “para fazer as pessoas começarem a falar” sobre as bandeiras do Black Lives Matter.

Também obrigou a Nissin a pedir desculpas após a fabricante do miojo clarear sua pele numa publicidade feita com ilustrações: “Sou bronzeada, é bastante óbvio”. Dois meses antes das Olimpíadas, ela não quis dar entrevistas em Roland Garros, dizendo que a pressão não fazia bem para sua saúde mental.

Foi multada e desistiu do campeonato. Diante de um estádio esvaziado pela pandemia, a escolha de Osaka para carregar a chama olímpica falou para multidões.

Simone Biles (EUA)
Simone está de bode. Ela ganhou no Twitter um emoji próprio, a imagem desse animal —quando alguém escreve seu nome com hashtag, ele aparece. Goat (bode ou cabra, em inglês) é também a abreviação para "greatest of all times", ou melhor de todos os tempos.

Com quatro ouros olímpicos no Rio-2016 e 25 medalhas em campeonatos mundiais, ela inspira outras mulheres, não só no esporte. Em 2018, a jovem revelou ser uma das esportistas abusadas por Larry Nassar, ex-médico da seleção feminina de ginástica dos EUA.

Contou ainda que, com uma mãe viciada em drogas e álcool, passou fome na infância. “Lembro que havia um gato pela casa, e eu estava com tanta fome. Eles alimentavam esse gato, e eu ficava tipo, 'Onde diabos está minha comida?'.” Adotada, treinou muito e hoje é considerada a “melhor de todos os tempos”.

Em maio, fez história com o Yurchenko Double Pike, série de salto extremamente difícil batizada com o nome de Natalia Yurchenko. A ex-ginasta soviética disse que a melhora dada pela americana ao movimento, nunca antes tentado por uma mulher numa competição, lhe trouxe “lágrimas de alegria”.

Rayssa Leal, Leticia Bufoni e Pâmela Rosa (Brasil)
Rayssa tinha sete anos de idade quando foi filmada fazendo manobras de skate com uma fantasia de fada costurada pela avó, um vestido azul com asinhas. Aos 13, a maranhense é uma das mais jovens competidoras dos Jogos e uma das esperanças de pódio do Brasil.

Entre as maiores concorrentes estão as paulistas Pâmela Rosa, 22, campeã mundial de skate na categoria street em 2019, e Leticia Bufoni, 28, recordista de medalhas no X Games, as Olimpíadas dos esportes radicais. Na sexta (23), Leticia publicou uma carta ao pai no site The Players’ Tribune, em que revive o dia em que ele quebrou seu skate após chegar do trabalho e ver sua caçula se equilibrando no portão.

“Pouco importa, pai, se vão chamar sua filha mais nova de maloqueira, de Maria-Homem”, escreve. “Você vai ter de deixar eu fazer umas manobras mais ousadas, como aquela de quando eu tinha nove anos: montar um skate novo no dia seguinte a você ter partido o meu anterior ao meio.”

Leticia diz que ainda hoje “é natural que o skate masculino tenha muito mais apoio que o feminino”. Avisa que não vai parar até superar esse obstáculo.

Katie Ledecky (EUA)
Quando Katie entra na piscina, a dúvida não costuma ser se ela vai ganhar, mas o quão ampla será sua vitória. Ao garantir nos 800 metros livre o quinto ouro olímpico de sua carreira, no Rio-2016, ela chegou 11,38 segundos à frente da medalha de prata. Para a natação, é uma eternidade.

“Tempo o bastante para ficar entediado”, disse o New York Times à época. No pandêmico 2020, a nadadora de 24 anos intercalou treinos com uma graduação remota em psicologia em Stanford. Chega a Tóquio com favoritismo só ofuscado pela australiana Ariarne Titmus. Chega de tédio.

Letesenbet Gidey (Etiópia)
“Eu realmente não gostava”, disse uma das maiores corredoras destas Olimpíadas quando, em 2015, aos 17 anos, explicou por que foi expulsa do colégio: recusava-se a correr nas aulas de educação física.

O diretor concordou em readmiti-la com a condição de que Letesenbet corresse pela escola em campeonatos. Como era apaixonada por estudar, topou. Tomou gosto e fôlego: hoje, a atleta de 23 anos detém simultaneamente os recordes mundiais dos 5.000 e dos 10 mil metros. O da distância mais longa ela quebrou em junho, dois dias após Sifan Hassan, holandesa de ascendência etíope, fazê-lo.

E ela realmente não gostava de correr.

Ramla Ali (Grã-Bretanha)
A vida tentou nocautear Ramla, 31. Quando ela tinha por volta de um ano de idade, um irmão de 12 anos morreu enquanto brincava, atingido por um morteiro na guerra civil somali.

A família foi para o Quênia numa travessia marítima na qual parte dos passageiros morreu de fome e depois para Londres, onde foi criada. Boxeadora, modelo, autora e ativista pela igualdade racial, Ramla tem na mãe, que ficava horas em filas para conseguir comida para os filhos, sua maior inspiração.

“Ela é uma lutadora melhor do que eu, isso com certeza”, disse num campo de refugiados da ONU. Em 2016, quando se tornou a primeira muçulmana a ganhar campeonatos nacionais na Inglaterra, chegou a esconder um tempo a carreira dos pais, que queriam vê-la advogada. A família é toda de guerreiros.

Em janeiro, tuitou fotos do irmão médico e das irmãs enfermeiras, todos na linha de frente contra a Covid.

Laurel Hubbard (Nova Zelândia)
Primeira transgênero em Olimpíadas, a halterofilista de 43 anos competia na categoria masculina até fazer a transição. O Comitê Olímpico exigiu que por 12 meses ela fizesse tratamento para abaixar os níveis de testosterona, para estreitar a vantagem do sexo biológico no qual nasceu sobre as concorrentes —uma delas, a belga Anna Van Bellinghen, definiu a inclusão de Hubbard nos Jogos como “uma piada ruim”.

Em 2017, a neozelandesa disse a uma rádio de seu país que não é seu papel tutelar ninguém sobre o que significa ser uma atleta trans. “Esperava que me apoiassem, mas não cabe a mim obrigá-los a fazê-lo.”

Silvana Lima (Brasil)
Duas vezes vice-campeã mundial, a surfista de 36 anos comemorou quando apareceu no "Jornal Nacional" em 2015, após fazer uma manobra chamada aéreo, uma espécie de voo sobre a água em que a prancha não encosta a água. Era preciso, dizia, mostrar a força do surfe feminino.

Voou longe, até o Japão, após lesões a tirarem do páreo algumas vezes. Com vaga garantida nas oitavas de final, a cearense que cresceu dividindo uma barraca de madeira na praia com a mãe e quatro irmãos tem uma meta: casar com a namorada levando a medalha de ouro no peito.

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