Mendy superou desemprego e abandono de empresário para virar herói senegalês

Goleiro do Chelsea foi eleito melhor do mundo após redenção no futebol

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Goleiro Édouard Mendy celebra conquista de Senegal na Copa Africana de Nações

Goleiro Édouard Mendy celebra conquista de Senegal na Copa Africana de Nações Charly Triballeau - 6.fev.22/AFP

São Paulo

O meio-campista francês Ted Lavie, 36, costuma citar três momentos que mudaram definitivamente sua vida. Em primeiro lugar estão os nascimentos de seus filhos. Depois, vem a assinatura do primeiro contrato como profissional. Ainda no pódio, ele lista uma ligação que fez para ajudar o amigo Édouard Mendy.

Sete anos antes de ser eleito o melhor goleiro do mundo pela Fifa, no início deste ano, o franco-senegalês que defende atualmente o Chelsea —e que levou Senegal ao inédito titulo da Copa Africana de Nações, em fevereiro— esteve perto de abandonar o futebol até ser ajudado por Lavie.

Mendy estava desempregado, havia acabado de ser abandonado por um empresário que sumiu após promessas de lhe arranjar um clube e precisou se inscrever no "pôle emploi", o serviço público francês de assistência a desempregados que ajuda cidadãos a encontrar trabalho, além de oferecer auxílio financeiro.

Então com 22 anos, ele e a mulher estavam à espera do primeiro filho.

"Eu disse a mim mesmo uma dúzia de vezes que, para mim, o futebol tinha acabado. É um período em que você quer parar tudo", lembra o goleiro. "Às vezes penso nisso e não desejo isso a ninguém."

Édouard Mendy foi de quase desempregado a melhor do mundo - Paul Ellis - 21.ago.22/AFP

Em 2014, ele ficou sem contrato com o Cherbourg após a queda do clube para a quinta divisão francesa —quando ele chegara, dois anos antes, o time estava no terceiro escalão.

O goleiro acreditava que não ficaria sem jogar por muito tempo. À época, um empresário afirmou que tinha propostas de clubes de divisões superiores. Mas, sem justificativa, segundo o atleta, desapareceu. "Não ouvi nada dele, a não ser uma mensagem de texto me desejando boa sorte no futuro."

Sem perspectiva, o atleta retornou à sua cidade natal, Le Havre. Enquanto esperava por uma oportunidade, cogitou aceitar a oferta de um amigo para trabalhar como vendedor em uma loja de roupas. Mas preferiu insistir no futebol.

"Naquela época, quando recebi a mensagem do meu agente, voltei imediatamente ao clube onde treinava quando era jovem, em Le Havre, e treinava com os reservas todas as manhãs", disse Mendy à BBC Sports. "À tarde eu ia para a academia ou para o campo com meu irmão, para treinar o arremesso."

Foram quase nove meses apenas treinando para manter a forma até Ted Lavie conseguir ajudá-lo. Os dois foram companheiros no Cherbourg, onde construíram uma grande amizade. Tentando ajudar como podia, o meio-campista resolveu telefonar para Dominique Bernatowicz, à época o responsável pela academia de goleiros do Olympique de Marseille.

"Dominique é meu amigo, liguei e soube que ele procurava por um goleiro para preencher o quarto posto do time. Eu lhe disse que havia jogado com um cara muito bom, grande, inteligente e com muita margem de progressão. Acrescentei que ele buscava qualquer chance", contou à BBC Sport Africa.

Mendy se reuniu com Bernatowicz, causou uma boa impressão e conseguiu um contrato de um ano para jogar como amador, o que ao menos lhe garantia um salário mínimo.

Apesar de ter jogado pouco pelo time B do Marseille, conseguiu atrair atenção de outros clubes franceses e, no verão europeu de 2016, foi contratado pelo Stade Reims, da segunda divisão.

Depois de três boas temporadas na equipe, pela qual conseguiu o acesso à elite francesa com o triunfo na edição 2017/18 da Ligue 2, teve em seguida uma rápida passagem pelo Rennes até despertar o interesse do Chelsea.

Ele chegou ao time inglês dois anos após a equipe ter investido 71 milhões de libras (R$ 345 milhões à época) na contratação do espanhol Kepa Arrizabalaga. Em pouco tempo, Mendy tomou seu lugar.

"Édouard é o nosso número um, e merece ser o número um. Não dá para esconder a opinião. As coisas têm que ser claras, e não podemos ter medo disso", disse o técnico do Chelsea no ano passado, Thomas Tuchel.

Foi com o arqueiro sob as traves que a equipe conquistou a Champions League em 2020/21. As exibições no torneio o ajudaram a superar Gigi Donnarumma, campeão da Euro com a Itália, na eleição do prêmio The Best, da Fifa, anunciado em janeiro.

Apontado como melhor da posição no mundo, Mendy chegara ao auge de sua carreira. E ainda conquistaria no mês seguinte o Mundial de Clubes, em final na qual o Chelsea derrotou o Palmeiras.

Filho de um pai nascido na Guiné-Bissau e de uma mãe senegalesa que migraram para a França, o goleiro já era motivo de orgulho para as nações de seus pais, sobretudo Senegal, que ele decidiu representar, mas ainda lhe faltava um título pela seleção. E ele foi buscar.

Ao lado de Sadio Mané, foi um dos grandes nomes da última edição da Copa Africana de Nações. Na final com o Egito, a disputa se arrastou até os pênaltis, quando o goleiro defendeu uma das cobranças e o atacante fechou o placar.

Na festa do título, a dupla desfilou em cima de um ônibus pelas ruas de Dakar, seguida por milhares de senegaleses que tomaram as principais vias da capital de Senegal.

"Não tem sensação igual a isso. Acho que só terá algo igual se a gente ganhar uma Copa do Mundo", ele descreveu.

A partir de novembro, no Mundial do Qatar, Mendy tenta alcançar esse objetivo, ainda distante, e surpreender mais uma vez na carreira, aos 30 anos.

Raio-X

Édouard Mendy, 22

  • Nascimento

    1º de março de 1992, em Montivilliers, na França

  • Altura

    1,96 m

  • Posição

    Goleiro

  • Pé preferencial

    Destro

  • Clube

    Chelsea (desde 2020)

  • Pela seleção

    24 jogos

  • Títulos

    Francês segunda divisão (2017/18), Champions League (2020/21), Supercopa Europeia (2021), Mundial de Clubes (2021) e Copa Africana de Nações (2022)

Este é o terceiro de uma série de dez textos sobre jogadores que podem surpreender na Copa do Mundo de 2022. Eles são publicados às terças-feiras.

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