O rei turco da Copa do Mundo se tornou motorista de Uber

Hakan Sukur tinha tudo, mas caiu em desgraça com o regime e fugiu para os EUA

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São Paulo

O apelido de "Touro do Bósforo" é uma homenagem dos tempos de glória. Há outra alcunha que não deixa dúvidas sobre a importância de Hakan Sukur, 51, na Turquia: o rei.

Ele é o maior artilheiro da história do país, 51 gols pela seleção. Era o astro da equipe que em 2002 chegou ao terceiro lugar da Copa do Mundo, batida na semifinal pelo chute de bico de Ronaldo. Na disputa pelo terceiro lugar, contra a Coreia do Sul, anotou o gol mais rápido da história dos Mundiais, aos 10,8 segundos.

Hakan Sukur finaliza para marcar o segunndo gol da Turquia sobre a Bélgica na Eurocopa de 2000
Hakan Sukur finaliza para marcar o segunndo gol da Turquia sobre a Bélgica na Eurocopa de 2000 - Kai Pfaffenbach-19.jun.00/Reuters

Sukur levou o Galatasaray ao título da Copa da Uefa de 2000. O goleiro era o brasileiro Taffarel. Nunca um clube da Turquia havia conquistado um título continental.

Ele era o rosto mais conhecido do país. Uma unanimidade como jogador e comentarista na TV. Tanta popularidade o fez ser eleito deputado pelo conservador Partido da Justiça e Desenvolvimento, em 2011.

O rei hoje vive exilado na Califórnia, nos Estados Unidos. Sabe que se voltar ao seu país natal, será preso, provavelmente condenado à prisão perpétua ou, quem sabe, à morte. Na última entrevista que concedeu, para um jornal alemão, em 2020, disse sobreviver como motorista de Uber.

Como centroavante, Sukur ainda é o nome mais importante da história do futebol nacional e teve passagens também pela Itália (Torino) e Inglaterra (Blackburn Rovers). Foi tão popular que era respeitado pelas torcidas de Fenerbahce e Besiktas (rivais do Galatasaray). Seu casamento foi um dos mais concorridos e luxuosos já vistos no país.

Em uma das fotos tiradas naquela noite, ele está ao lado do presidente da República, Recep Tayyip Erdogan, e do líder islâmico Fethullah Gulen, de quem é seguidor.

Esta seria a sua desgraça. Quando Erdogan decidiu fechar as escolas que ensinavam a doutrina de Gulen, Sukur renunciou à cadeira no parlamento, em protesto. Ao derrotar um golpe de Estado em 2016, o presidente lançou sua fúria contra os seguidores do religioso. Entre eles, o antigo ídolo.

Em novembro de 2017, o atacante fugiu para os Estados Unidos. À revelia, foi condenado por ofender Erdogan com uma postagem no Twitter. Também é acusado de ajudar financeiramente a tentativa de golpe –algo que Sukur sempre negou.

Seu pai está preso em Istambul sob a mesma acusação e o ex-atleta sabe que é pouco provável voltar a vê-lo.

Ao se mudar nos Estados Unidos, foi flagrado em um estilo de vida luxuoso. Alugou uma confortável casa em Palo Alto, cidade californiana, e dirigia automóveis caros. Também abriu um restaurante, o que ele dizia ser seu antigo sonho.

Isso não durou. O governo turco congelou seus bens e contas bancárias. Sukur teve de buscar alternativas para se manter e iniciou o trabalho como motorista.

Pelo Galatasaray, ele conquistou 14 títulos da liga nacional em um país fanático por futebol. Erdogan gosta de usar o esporte para fustigar outros países. Ficou amigo do alemão Metsul Özil, campeão do mundo de 2014, e meia com raízes turcas.

Quando o jogador reclamou, após ter deixado a seleção, ter sofrido preconceito, Erdogan postou mensagem de apoio a Özil que dizia "seu presidente está aqui."

Era uma homenagem que normalmente seria reservada a Hakan Sukur, o rei. Mas hoje em dia, não mais.

Não o ajudou ter dito, certa vez, considerar-se mais albanês do que turco. A declaração foi usada exaustivamente pelos defensores do regime.

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