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Vanessa S. Nakasato, de Brasília
especial para o GD
Alguém sabia que Brasília,
além de capital do país, é também
a capital dos podólatras? De todas as peculiaridades
do lugar – para não dizer estranhezas, nada deixa
um “estrangeiro” mais indignado do que o hábito
que as pessoas têm de olhar para os pés alheios
(os seus) antes mesmo de lhes dizer bom dia.
Duas semanas atrás, homens
e mulheres da redação de um site falavam calorosamente
sobre as dezenas de pares de sapatos de uma das jornalistas
que lá trabalha. A princípio, pode não
parecer estranho, afinal, todos falam de sapatos (falam?).
O estranho é que, pelo menos nessa redação,
este assunto entra em pauta pelo menos a cada dois dias. Um
discreto monitoramento dos olhares de uma jornalista recém-chegada
à capital federal demonstra que todos olham para os
pés de quem cumprimentam em algum momento.
O pior é que sapatos não
são nada baratos em Brasília. Aliás,
nada é barato. Em uma mega liquidação,
em uma das lojas consideradas barateiras da cidade, um tamanco
não sai por menos de R$ 80. “Está quase
de graça”, ainda diz o vendedor.
De posse de três novos pares
de sapatos, a tal jornalista voltou ao trabalho no dia seguinte.
Tese comprovada. Ao dizer bom dia, recebeu como resposta de
um colega: “Que sapato bonito! É novo?”.
A pessoa não sabia se agradecia ou xingava.
Barato em Brasília também
é algo bem relativo. A mesma jornalista quis saber
onde poderia comprar roupas a preços mais acessíveis.
“Em Goiânia”, responderam três colegas.
“Ah! Na C&A tem roupas em promoção.
Tem calça e blusa entre 60 e 90 reais. Está
super baratinho!”, lembra alguém.
Outra coisa engraçada são
os termos usados e os hábitos cotidianos. Aqui, diferentemente
de São Paulo, por exemplo, os motoristas param assim
que o pedestre chega à faixa. Só tem um detalhe:
enquanto os veículos se aproximam, os pedestres, já
no meio fio, fazem a famosa saudação de Juscelino
Kubistchek, como quem diz em código “pára
que eu quero passar”. E todos param. Brasilienses também
adoram comer pescoço de peru, carne de codorna e são
viciados em uma bebida chamada suquinho gumy, uma mistura
de vodka com suco ou chá em pó.
Em Brasília ponto de ônibus
é parada, trevo é tesourinha, peão é
“orelha seca”. Aparentemente, as quadras e os
botecos são todos iguais, não há esquina
e nem transporte coletivo que passe perto dos bairros nobres.
E por falar em bairro nobre, Brasília
é a única cidade do país dividida por
setores: setor hospitalar, setor comercial, setor hoteleiro,
setor de clubes, setor de mansões. Isso mesmo. Com
tanta gente passando fome neste Brasil, a nossa capital federal
tem a arrogância de ter um setor de mansões,
uma área onde as casas custam mais de 1 milhão
de reais e podem ser alugadas pela bagatela de 30 mil. Pior.
Há placas por toda a cidade indicando onde moram os
ricos. Tudo bem ter pessoas com a vida financeira muito bem
resolvida, obrigada, mas precisa de todo esse alarde? O que
pretendem com isso? Mostrar aos chefes de estado de outros
países que nem todos são miseráveis no
Brasil?
Definitivamente, Brasília
é um lugar surreal. Mas embora a cidade se pareça
com uma maquete gigante e tenha todas essas esquisitices,
é difícil encontrar alguém que queira
sair daqui. Talvez, essas singularidades sejam a graça
e o encanto do Planalto Central. Com tanta coisa bizarra,
é impossível não se divertir aqui. Isso
sem entrar no mérito da política e dos políticos...
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