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amar
09/05/2005
Mães demonstram sua força ao lidar com dificuldades de seus filhos

Quando, em 1998, Conceição Paganele, hoje presidente da Associação de Mães e Amigos da Criança e do Adolescente em Risco (AMAR), soube que seu filho havia se tornado dependente químico, cometido um roubo e por isso seria internado na Febem, seu mundo caiu. "É difícil assumir que o filho da gente roubou. Você cria um filho para ser bem-sucedido na vida, para ser doutor, trabalhador. Quando tem que assumir que o filho é drogado, que é ladrão, a dor não tem limite", confessa.

Naquele momento, ela queria um "colo", alguém a quem pudesse recorrer para chorar, para pedir apoio. Viúva, Conceição não tinha o marido para compartilhar as angústias. Procurou organizações governamentais, tentou recorrer aos Conselhos Tutelares, mas não encontrou o que precisava.

Sozinha, ela não podia ficar. "Se eu tivesse que enfrentar isso sozinha, morreria. Porque a depressão é o fim", diz. Por isso, resolveu se juntar a outras mulheres, também mães de adolescentes que cometeram ato infracional, e criou a AMAR.

"Aqui, as mães recebem um apoio de colo. O acolhimento é de igualdade, de olho no olho. A mãe que tem um filho na Febem vai sentir que existem outras mulheres com o mesmo problema, o mesmo sofrimento e acaba se fortalecendo. Ela percebe que seu filho não é o primeiro nem vai ser o último a passar por uma situação dessas", explica Conceição. Além de atendimento psicológico e jurídico aos pais, a AMAR atualmente recebe denúncias sobre os casos de tortura e maus tratos na Febem e torna esses casos públicos. Paralelamente, desenvolve projetos de prevenção junto a adolescentes (como oficinas de karatê, capoeira e reforço escolar em seu espaço em Cidade Tiradentes, zona Leste de São Paulo) e de apoio familiar para que o adolescente que sai da Febem seja aceito pela família e se reinsera na sociedade.

Omissão do Estado
Se Conceição Paganele teve coragem de criar uma organização de apoio, frente à omissão do Estado, essa não é a sorte da maioria das mulheres qu passam por situações similares.

De acordo Irene Rizzini, professora da PUC-Rio de Janeiro e presidente do Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância (CIESPI), ainda se discute muito pouco a necessidade de o Estado criar políticas públicas de suporte às mulheres - sobretudo para as que estão em idade reprodutiva e pertencem às classes populares. Mas para ela, uma rede de apoio sócio-familiar seria fundamental, pois as mulheres que vivem essa realidade não têm orientação para fazer corretamente suas escolhas. Ela explica que, enquanto as mulheres das classes altas e médias recebem orientação de sua família e de profissionais mesmo antes de ficarem grávidas, as jovens e adolescentes das classes populares ficam desamparadas. Não sabem como cuidar de seus filhos, quantas crianças são capazes de ter e educar dignamente, ou como evitar que esses meninos sigam a trajetória das ruas.

Nos grande centros urbanos, uma situação cada vez mais presente é que essas jovens perdem o contato com seus parentes e passam a constituir famílias isoladas. E, sem o suporte adequado, as histórias de mães que perdem um ou vários filhos para o tráfico, e para as a rua acumulam-se.

Muitas vezes, o que se vê são gerações e gerações de mulheres vivendo em situação de vulnerabilidade nos centros urbanos. Irene afirma que é comum encontrar uma adolescente grávida, que tem uma mãe vivendo nas rua e uma avó que enfrentou as mesmas dificuldades. No entanto, essas mulheres não podem ser culpabilizadas por não dar a correta atenção a seus filhos, pois elas são também vítimas de décadas de omissão Estado e não aprenderam a viver de outra forma.

Para evitar esse tipo de situação, a professora considera essencial elaborar um conjunto de políticas públicas que dê sustentação a essas mulheres. Mas alerta que as respostas deveriam ser construídas conforme as demandas específicas de cada mulher - sejam físicas, materiais, psicológicas. "No caso da violência doméstica, por exemplo, os municípios precisam criar propostas diferentes de apoio a para cada membro da família, de tal forma que cada um desenvolva suas potencialidades da melhor forma", afirma. Isso evitaria o sentimento de solidão e de culpa, enfrentado por Conceição Paganele e outras mulheres brasileiras.

Amor de mãe
Durante os sete anos de atuação da AMAR, Conceição conta que sempre recebeu mães. Raramente os pais se responsabilizam pelo filho que cometeu um ato infracional. Já as mães - ainda que solteiras, viúvas, desquitadas, que precisem trabalhar fora de casa ou cuidar dos outros filhos - nunca deixam de acompanhar os processos de internação de seus filhos.

De certa forma, o mesmo acontece na AACD, organização que atende crianças com deficiência, além de oferecer orientação psicológica às mães. Conforme conta a psicóloga Iracema Maceira Pires Madaleno, normalmente são as mães que levam as crianças para serem tratadas na organização.

"A sociedade em geral espera da mãe que ela assuma as tarefas da casa, dos filhos, do marido, que trabalhe fora e que, em último lugar cuide de si mesma. No caso das mulheres que têm filhos com algum tipo de deficiência, as mães ainda são 'super-cuidadoras'. São elas que trazem os filhos de ônibus, dão continuidade ao tratamento em casa, dão banho nas crianças, acompanham os avanços e ajudam a criança a desenvolver seu potencial. O pai fica mais ausente", explica Iracema. "Até existem homens que vão à AACD, mas é muito mais difícil", completa.

A psicóloga diz que isso acontece por fatores culturais e pelo tipo de relacionamento que a mãe cria com o filho. "É um sentimento de amor incondicional. O filho pode fazer qualquer coisa, que a mãe acaba aceitando. O pai não tem tanto esse sentimento", diz.

Conceição Paganele concorda. Ela acredita que o que faz a mãe estar tão presente é "um amor sublime, que só o de Deus se aproxima.". Intuitivamente, a presidente da AMAR constata que a mãe é a principal responsável pela estrutura familar.

"A figura masculina é fundamental para a criança. Mas sem a mãe, a família fica completamente desestruturada. Não vejo a famíla sem essa figura de fortaleza, sem essa parceira dos filhos e do marido que é a mãe. Tanto que normalmente, quando a mulher não está presente na família, o homem encontra uma nova companheira, mas quando a mulher fica sozinha, ela assume os papéis de pai e mãe", pondera.

De fato, é a mãe que dá sustentação para a família, explica Irene Rizzini. Os laços afetivos estabelecidos entre a criança e sua mãe (ou qualquer outra pessoa que assuma esse papel, como uma mãe adotiva, uma avó, uma tia etc) são fundamentais para que todo o potencial da criança seja desenvolvido.

"Mãe é aquela pessoa que passa a mensagem: 'eu me importo com você e o que você fizer estarei observando'. É aí que está o segredo", define a pesquisadora. Quando ninguém desempenha esse papel na família, o desenvolvimento da criança fica prejudicado. Tanto que a maioria das crianças que estão nas ruas ou em abrigos apresentam elos afetivos muito frágeis.

Mas por que esse é um papel assumido pela mãe e não pelo pai? Para Irene, isso é um reflexo das raízes do mundo ocidental, no qual a mulher, principalmente a partir do século XIX, foi encarada como a principal responsável da família, "a rainha do lar". Ela lembra que, no mundo oriental, ao contrário, onde não existe o divórcio, há uma pressão maior para que o pai não seja tão omisso, que esteja mais presente na educação dos filhos.

Apesar de a discussão sobre o papel da mulher e do homem na sociedade contemporânea ter se aprofundado nos últimos anos, e das mulheres terem saído de casa para trabalhar, na prática, o que se observa é que não houve uma troca de papéis entre homens e mulheres, sobretudo nas classes médias e populares do Brasil.

As mulheres apenas acumularam funções em cima das que já desempenhavam. A pesquisa "Desenhos de Família", realizada pela professora Sônia Gomes Sousa, da PUC-Goiânia e por Irene Rizzini, em 2002 comprova. Entre as 5 mil famílias entrevistadas, 90% ainda admitiam que os deveres da casa, a responsabilidade pela saúde e educação das crianças ficava por conta de quem assumia o papel parental feminino. O pai era associado apenas aos casos em que se falava de esportes, videogames e computadores.

LAURA GIANNECCHINI
do site setor3

 
 
 

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