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Che morreu na Bolívia doente e tendo potências como inimigas
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ANTONIO MARTÍNEZ
da Efe, em La Paz
Abandonado por Cuba e pelos comunistas bolivianos, o guerrilheiro argentino Ernesto Che Guevara foi capturado e assassinado em uma região agreste e despovoada da Bolívia, doente, sem provisões e tendo como adversários os Estados Unidos e a então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.
Dias antes de ser capturado, Che resumiu em duas linhas de seu diário o fracasso de sua odisséia boliviana: "O Exército está mostrando mais efetividade em sua ação e a massa camponesa não nos ajuda em nada, transformando-se em delatora".
No dia 8 de outubro de 1967, na Quebrada do Churo, próxima à aldeia de La Higuera (sudeste), soldados bolivianos guiados por agentes da CIA (agência de inteligência americana) armaram uma cilada contra o que restava de uma guerrilha com a qual Che pretendia dar início a "dois, três, muitos Vietnãs".
Após a morte de vários de seus companheiros, e de ter ficado ferido --com sua arma inutilizada por um disparo-- não teve outra opção que render-se, e gritou: "Sou Che. Não disparem".
No dia 9, quando o sargento Mario Terán --que atuava por ordem do presidente golpista René Barrientos-- entrou bêbado na escola da aldeia de La Higuera onde Che estava recluso, o guerrilheiro disse: "O senhor veio para me matar".
Depois perguntou por companheiros aprisionados e, com voz de comando, ordenou a seu carrasco: "Acalme-se e mire bem. O senhor vai matar um homem".
O relato foi feito pelo próprio Terán ao então ministro do Interior, Antonio Arguedas. O sargento acrescentou: "Fechei os olhos e disparei a primeira rajada. O Che, com as pernas destroçadas, caiu ao chão, se contorceu e começou a perder muito sangue".
"Recuperei ânimo e disparei a segunda rajada, que o atingiu em um braço, em um ombro e no coração. Já estava morto", concluiu Terán, que ajudou a transformar uma derrota patética em plataforma de lançamento de um mito mundial que desde então vendeu milhões de cartazes e camisetas.
Ernesto Guevara de la Serna, nascido em 1928 em uma família argentina ilustre, estava na mira das duas superpotências de sua época: os Estados Unidos e a então União Soviética.
Alguns historiadores desculpam o líder cubano, Fidel Castro, por tê-lo abandonado na Bolívia, e até por mandá-lo ao país andino com pleno conhecimento de que repetiria o fracasso do Congo, com o argumento de que Fidel foi obrigado por seus padrinhos soviéticos, a quem não convinha a nova aventura de Che.
O argentino Pacho O'Donnell, em sua biografia de Che Guevara, resume a situação: "Como compensação para Fidel, vale destacar que a pressão política dos soviéticos, de quem dependia a subsistência de seu governo [em Cuba], era muito grande".
Os partidos pró-soviéticos da América Latina criticaram e sabotaram o projeto de Che, que acabaria sem comunicações com La Paz e Havana, perdido em uma região onde os poucos habitantes eram proprietários de pequenas propriedades rurais e nada suscetíveis a sua retórica.
Seu grupo na ocasião, composto por 23 bolivianos, 16 cubanos, três peruanos e um argentino (ele) já havia sido reduzido a um terço da capacidade, devido a mortes em combate, capturas e deserções, segundo relatou o historiador boliviano Roberto Querejazu.
Também houve baixas por acidentes nos despenhadeiros e rios da região escolhida por Che, que pouco sabia sobre a Bolívia.
Os historiadores comentam que antes de se render o revolucionário já havia sido vencido por seus próprios erros, pelas traições de supostos amigos e pela selva infestada de insetos.
Entre os 17 sobreviventes que o acompanharam em seus últimos dias - alguns deles tão famintos e sedentos que chegaram a beber a própria urina - havia muitos feridos ou doentes.
Che sofria de asma, que foi agravada pelas caminhadas por locais remotos e sinuosos, e também pela retirada, por parte do Exército, dos remédios contra esse mal dos hospitais e farmácias de sua área de operações.
O pior, segundo seu diário, é que além dos comunistas bolivianos treinados em Cuba, não conseguiu recrutar índios e mestiços do local.
"Falta total de contato com Manila [Cuba, em código]... Ausência total de incorporação camponesa", escreveu em maio.
Na carta que enviou a Fidel em 1965, quando fracassou sua odisséia africana de sete meses, Che dizia: "Não podemos libertar sozinhos um país que não quer lutar".
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