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Crise política fecha trilogia sobre Getúlio
Último livro da série biográfica de Lira Neto sobre ex-presidente aborda tempos conturbados entre 1945 e 1954
Jornalista diz que encontra paralelos entre as turbulências daquela época e a situação atual do Brasil
Há 60 anos o Brasil vivia uma crise política. Getúlio Vargas tinha aumentado em 100% o salário mínimo e provocara a ira de empresários e comandantes militares. Os EUA estavam incomodados com a limitação de remessas de lucros de companhias estrangeiras no país e o estabelecimento do monopólio estatal da exploração do petróleo.
No Congresso, barulhentos conservadores falavam em mar de lama no governo.
Na madrugada de 5 de agosto de 1954, um atentado contra Carlos Lacerda, com a morte do major Rubens Vaz, acelerou a turbulência, que culminou no suicídio de Getúlio, no dia 24. A comoção que tomou conta do país adiou os planos da oposição, que só conseguiu se rearticular na trama do golpe de 1964.
A narrativa desses tempos conturbados é o ápice do último livro da trilogia "Getúlio", do jornalista Lira Neto, que chega às livrarias, abarcando o período de 1945 a 1954. No conjunto, o autor trabalhou cinco anos na biografia. Os primeiros volumes venderam 79 mil exemplares; este sai com tiragem de 40 mil.
À Folha o autor diz que a história ainda contém aspectos nebulosos, como o assassinato do major Vaz.
"O que aconteceu de fato naquela noite nunca vamos saber. Lacerda contou a história de duas formas diferentes e nunca entregou a sua arma para perícia", diz Lira, 50.
"Os interrogatórios da investigação do caso foram conduzidos de forma pouco polida. Pessoas interrogadas relataram, se não a tortura física, a psicológica. Sofreram ameaças. Todas as perguntas desse caso estão em aberto."
"Não acredito em biografias definitivas. Getúlio é ainda um território vasto a ser explorado. Ele é o personagem mais importante da história brasileira, para o bem e para o mal", declara.
Para ele, Getúlio deixou um amplo legado, que extrapola a política. "Ele modernizou o Brasil, tirou o país de uma situação agrária e o conduziu para um projeto de desenvolvimento, com uma legislação trabalhista que era moderníssima para aquele momento. A pergunta que faço é quanto disso poderia ter sido conquistado com mais democracia", avalia.
Lira vê paralelos entre as turbulências daquela época e a situação atual. "Sessenta anos depois estamos discutindo as mesmas coisas de quando ele estava no poder: mais ou menos Estado, o quanto é possível falar em mão invisível do mercado num país com tantas contradições. Isso é um sintoma até grave."