Um sertão líquido, luxuriante e globalizado como metáfora viva da reconstrução do afeto entre mãe e filho.
É com água jorrando pelos canais ainda inacabados da transposição do rio São Francisco que o diretor Lírio Ferreira percorre um semiárido camaleônico para construir a narrativa de "Acqua Movie".
O sexto longa do cineasta, que pode ser entendido como uma continuação antagônica de "Árido Movie" (2005), acaba de ser filmado em cinco semanas em Pernambuco.
A ser lançado em 2019, o road movie tem Alessandra Negrini e Antonio Haddad Aguerre como protagonistas.
Ela interpreta Duda, documentarista que trabalha com a questão indígena e é mãe de Cícero (Antonio), menino de 12 anos que a convence a viajar com ele de São Paulo ao sertão para jogar as cinzas do pai no São Francisco.
A Folha esteve no set em Cabrobó, a 579 km do Recife. "Podemos dizer que é uma extensão kardecista; tem o espírito do 'Árido Movie', que falava sobre a falta de água e o excesso de informação", explica Lírio Ferreira.
Mas o diretor mudou os nomes dos personagens e os atores. Apenas Guilherme Weber, que interpreta Jonas, está nas duas películas.
O elenco inclui ainda Aury Porto e Edgar Navarro. O cineasta Cláudio Assis faz uma ponta, no papel do governador de Pernambuco.
Mesmo com o sol forte e as insistentes formigas que não paravam de picar seus pés, Negrini parecia extasiada com a beleza da região.
"O sertão é o filme. É metáfora para tudo, diria Guimarães Rosa. Uma beleza pungente, o Brasil profundo."
Lírio revela que, em 2012, teve um alumbramento quando passou pela primeira vez pelas obras de transposição.
Foi o alerta para desenvolver o roteiro de "Acqua Movie" com Paulo Caldas e Marcelo Gomes. A fotografia é de Gustavo Hadba.
"A grande droga aqui não é a maconha, não é o crack. É a informação. A moeda mais cara do sertão. E a água, quando chega, tem impacto absurdo", diz o cineasta.
Diante de uma atmosfera que já lhe é bastante íntima, Lírio tenta captar a velocidade absurda da transformação da paisagem e os decorrentes impactos socioeconômicos. O diretor brinca que o tempo deveria ser multado por excesso de velocidade.
"O sertão é todo hoje em dia trabalhado no porcelanato, as pessoas têm acesso a casas de Miami. Tem a coisa da parabólica, do celular."
Com equipe reduzida, o diretor dos premiados "Baile Perfumado" e "Sangue Azul" filmou enquanto se deslocava para as cidades de Salgueiro, Santa Maria da Boa Vista, Cabrobó e Petrolândia.
"Há sempre a coisa da morte, do eterno retorno, de a geografia interferir nos personagens, diz. Acrescente a isso umas incompreensõezinhas que tento colocar."
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